Quando ouvimos a palavra "paz", o que vem à nossa mente? Imediatamente, pensamos em seu oposto: guerra. Paz, em nossa compreensão comum, é a ausência de conflito. Imaginamos uma vida tranquila, sem perturbações, um estado de repouso externo e interno.
Se lemos Romanos 5:1, "Justificados, pois, pela fé, temos paz com Deus", é provável que interpretemos isso principalmente como uma paz interior da alma, uma tranquilidade de espírito. Embora esses elementos de quietude externa e interna façam parte do conceito bíblico, eles não capturam a essência mais profunda e rica do que a Bíblia realmente quer dizer com "paz".
Para descobrirmos seu verdadeiro significado, precisamos voltar ao Antigo Testamento e à palavra hebraica que está na raiz de tudo: shalom. Muitos de nós já ouvimos essa palavra, usada como saudação e despedida.
Quando os judeus se desejavam shalom, eles estavam desejando algo muito maior do que apenas uma vida sem problemas.
O que é, então, essa paz que a Bíblia promete, que vai além da nossa compreensão superficial? Como podemos experimentar essa paz que o mundo não pode dar, mesmo em meio às tempestades da vida?
Este estudo nos convida a mergulhar no significado bíblico da paz, revelando-a não como uma mera ausência de conflito, mas como a presença ativa da bênção, da plenitude e da salvação de Deus.
1. A paz bíblica é plenitude e bem-estar em todos os sentidos
O teólogo A. Noordtzij explica que, no Antigo Testamento, paz não tem o conteúdo negativo que damos a ela — o de "não estar em guerra". Paz, ou shalom, é o estado de estar "shalem", ou seja, "completo", de modo que nada falte.
Paz fala de harmonia, felicidade, plenitude, uma vida livre e alegre. Ela contém tudo o que um indivíduo ou uma comunidade necessita para seu bem-estar e prosperidade. Portanto, shalom não se opõe à guerra, mas ao mal. Quando o Senhor dá paz ao seu povo, Ele faz com que tudo lhes vá bem, que a vida floresça em todos os sentidos.
É por isso que, na bênção sacerdotal de Números 6:26, lemos: "O SENHOR sobre ti levante o seu rosto e te dê a paz".
Quando Deus se volta com amor para seu povo, o resultado é shalom — a totalidade de Sua bênção e favor. Essa paz é tão abrangente que Davi, em 2 Samuel 11:7, ao perguntar sobre a guerra, usa a mesma palavra. Literalmente, ele perguntou pela "paz da guerra", ou seja, se a guerra estava indo bem.
No Antigo Testamento, paz não é primariamente um sentimento interior, mas uma condição objetiva: ser abençoado e ajudado por Deus em todas as circunstâncias da vida. É claro que a consequência disso é uma tranquilidade interna que os ímpios não conhecem.
Enquanto os falsos profetas gritavam "Paz, paz!", quando não havia paz (Jeremias 6:14), Isaías declarava: "Mas os ímpios não têm paz, diz o meu Deus" (Isaías 57:21). No final, a vida deles não prosperará.
Aplicação
Essa compreensão mais rica da paz nos liberta da busca por uma vida sem problemas e nos convida a buscar a presença abençoadora de Deus em todas as áreas da nossa vida.
- Busque o favor de Deus, não apenas a ausência de problemas. Em suas orações, em vez de pedir apenas "Senhor, tira este problema", comece a orar "Senhor, manifesta a Tua bênção e o Teu favor nesta situação". Isso muda o foco da circunstância para a presença de Deus, que é a verdadeira fonte da paz.
- Cultive a paz em todas as suas relações. Shalom é harmonia e completude. Onde em sua vida falta harmonia? Em seu casamento, em sua família, em seu trabalho? Seja um agente da paz de Deus, buscando a reconciliação e o bem-estar dos outros, refletindo a paz que Deus lhe deu.
- Reconheça que a verdadeira paz se opõe ao mal, não ao conflito. Às vezes, para alcançar a paz verdadeira, é preciso confrontar o mal, a injustiça ou o pecado. Ser um pacificador não significa evitar todo conflito, mas engajar-se de maneira redentora para restaurar a harmonia que o mal quebrou.
2. Jesus é o Príncipe da Paz que nos traz a salvação completa
O Novo Testamento continua e aprofunda esse rico conceito de paz. Isaías havia profetizado que o Messias seria chamado de "Príncipe da Paz" e que "do incremento deste principado e da paz, não haverá fim" (Isaías 9:6-7). Ele viria para estabelecer um governo de bênção e prosperidade eternas para o Seu povo.
Nos relatos do nascimento de Jesus, essa promessa se cumpre. Zacarias profetiza que o Messias guiará nossos pés "pelo caminho da paz" (Lucas 1:79), que não é um caminho fácil, mas o caminho que leva à situação de paz total sob o governo de Cristo. Os anjos anunciam em Belém "paz na terra aos homens de boa vontade", indicando que, por meio de Jesus, um povo seria reunido para viver em uma relação correta com Deus e com os outros.
Aqui, a paz se torna sinônimo de salvação. É o ato de Deus nos resgatar do pecado, da morte e do diabo, e nos rodear com Sua bondade e misericórdia. Quando Jesus diz aos seus discípulos, "Deixo-vos a paz, a minha paz vos dou" (João 14:27), Ele não está falando apenas de um sentimento de calma. Ele está lhes dando o Seu Reino, a Sua salvação, a Sua vitória — a vida em seu sentido mais pleno.
Essa paz é radicalmente diferente da que o mundo oferece. O mundo promete uma vida de prazeres e riquezas passageiras. Jesus nos dá o bem-estar do corpo e da alma em comunhão com nosso Pai celestial. Por isso, essa paz coexiste com a aflição.
João 16:33
Tenho-vos dito isto, para que em mim tenhais paz; no mundo tereis aflições, mas tende bom ânimo, eu venci o mundo.
A paz está em Cristo, não no mundo. A comunhão com Ele é o que nos dá acesso à Sua salvação e felicidade, mesmo quando o mundo nos odeia e nos persegue. O evangelho é chamado de "evangelho da paz" (Efésios 6:15), não porque ele elimina os problemas, mas porque ele nos conecta ao Príncipe da Paz, que já venceu a batalha final.
Aplicação
A paz de Cristo não é um sentimento a ser buscado, mas uma realidade a ser desfrutada pela fé Nele. Viver nessa paz, mesmo em meio às aflições, é um dos maiores testemunhos do cristão.
- Encontre sua paz "em Cristo", não nas circunstâncias. Quando as aflições vierem, lembre-se de que sua paz não está na ausência de problemas, mas na sua união com o Cristo vitorioso. Sua paz é uma pessoa, não um sentimento. Corra para Ele em oração.
- Não se surpreenda com a hostilidade do mundo. Jesus foi claro: a paz que Ele nos dá muitas vezes nos coloca em conflito com os valores do mundo. Se você é odiado por sua fé ou por defender a justiça, não pense que perdeu a paz de Deus. Pelo contrário, você está experimentando a realidade do Reino.
- Tenha bom ânimo. A ordem de Jesus para ter bom ânimo não é um otimismo vazio. É uma declaração baseada na realidade de Sua vitória. Em meio à sua luta, declare pela fé: "O mundo pode estar em caos, mas meu Rei venceu o mundo, e Nele, eu também sou mais que vencedor".
3. A paz com Deus é o fundamento de toda paz
Um dos textos mais conhecidos sobre a paz é Romanos 5:1: "Justificados, pois, pela fé, temos paz com Deus, por nosso Senhor Jesus Cristo". Como já vimos, nossa tendência é interpretar isso como uma paz interior. No entanto, o teólogo S. Greijdanus aponta que, antes de ser um sentimento, essa paz é um estado de relacionamento.
Ter paz com Deus significa que a hostilidade terminou. Deus não está mais irado contra nós. Sua maldição não pesa mais sobre nós. Ele está reconciliado conosco em Cristo. Ele não está mais contra nós, mas por nós. A paz aqui significa ter a salvação de Deus, estar sob Sua proteção e favor. A guerra entre nós e Deus acabou por causa do sacrifício de Cristo.
Essa paz objetiva, essa nova realidade em nosso relacionamento com Deus, é o que então produz a paz subjetiva em nossos corações. É porque fomos reconciliados com Deus que podemos experimentar a tranquilidade de espírito. Essa é a "paz de Deus, que excede todo o entendimento", que "guardará os vossos corações e os vossos sentimentos em Cristo Jesus" (Filipenses 4:7).
Essa paz que guarda nossos corações é descrita como uma sentinela, uma força protetora. É a salvação de Deus, Sua bênção, que nos rodeia como um escudo. Porque estamos em paz com o Comandante do universo, uma paz que Ele mesmo providenciou, nossos corações podem estar seguros, mesmo em meio à batalha.
Aplicação
Fundamentar nossa busca pela paz na realidade da nossa justificação em Cristo nos livra da montanha-russa emocional de tentar "sentir" paz o tempo todo.
- Pregue o evangelho para si mesmo. Quando sua paz interior for abalada pela ansiedade ou pela culpa, volte ao fundamento. Lembre-se: "Em Cristo, a guerra entre mim e Deus acabou. Estou justificado, perdoado e aceito. Esta é a minha verdadeira paz, e ela não depende dos meus sentimentos".
- Deixe a paz de Deus guardar seu coração. Quando pensamentos ansiosos invadirem sua mente, visualize a "paz de Deus" como um guarda em frente ao seu coração, impedindo a entrada de medos e preocupações. Entregue essas ansiedades a Ele em oração, conforme o contexto de Filipenses 4, e confie que Sua paz o protegerá.
- Compreenda que a paz interior é um fruto, não a raiz. Pare de lutar para "sentir-se em paz". Em vez disso, concentre-se em cultivar seu relacionamento com Deus, meditando em Sua Palavra e confiando em Suas promessas. A tranquilidade de espírito será a consequência natural de se abrigar na paz objetiva que você tem com Deus.
Conclusão
A paz que a Bíblia nos oferece é infinitamente mais rica e robusta do que a simples ausência de guerra. É uma palavra positiva que significa salvação, prosperidade, bem-estar e vida em seu sentido mais verdadeiro.
Não se refere, em primeiro lugar, a uma tranquilidade interna, mas à condição abençoada de pertencer ao Reino de Deus e estar sob o governo da Sua graça. Todos os que, pela fé, participam desta paz, também obtêm um coração tranquilo. Mas este sentimento é a consequência da paz de Deus, e não a paz em si mesma.
Que possamos parar de buscar uma paz frágil nas circunstâncias do mundo e, em vez disso, mergulhar na paz inabalável que encontramos somente em Cristo. Pois Ele é a nossa paz, a plenitude de tudo o que precisamos para uma vida completa, harmoniosa e eternamente segura em Deus.