Quando nos aproximamos do tema da fé, entramos no coração da experiência cristã. É impossível esgotar um assunto sobre o qual bibliotecas inteiras foram escritas.
No entanto, nosso objetivo aqui não é acadêmico, mas pastoral: resgatar o significado bíblico da fé, livrando-o das distorções populares e eclesiásticas, para que possamos vencer as objeções que nos impedem de crer verdadeiramente.
Na linguagem popular, "crer" tornou-se sinônimo de "não saber com certeza". Se alguém diz "creio que são dez horas", está admitindo que não tem certeza. Infelizmente, essa noção de incerteza invadiu até mesmo a igreja.
Muitas vezes, falamos mais sobre "novo nascimento, experiências e conversão" do que sobre a fé, esquecendo que nada disso pode existir sem ela.
A fé não é uma opção, mas uma exigência do evangelho. A salvação depende dela. Quando o carcereiro de Filipos perguntou "o que devo fazer para ser salvo?", a resposta foi direta: "Crê no Senhor Jesus Cristo e serás salvo" (Atos 16:31).
A ordem final de Jesus foi clara: "quem crer... será salvo; mas quem não crer será condenado" (Marcos 16:16). A fé é, portanto, uma questão de vida ou morte eterna.
1. O objeto da fé é a promessa de Deus
A fé não existe no vácuo. Ela não é um sentimento vago ou uma força interior que geramos por conta própria. A fé precisa de um objeto. E o objeto da fé, segundo as Escrituras, é a promessa de Deus, revelada em Sua Palavra e personificada em Cristo Jesus.
Promessa e fé são como elos de uma corrente, inseparáveis. A promessa pode existir sem que ninguém creia nela, mas a fé não pode existir sem a promessa. A fé não é algo que examinamos em nós mesmos, isoladamente.
Ela é uma resposta àquilo que Deus falou. É por isso que, quando falamos de "crer em Deus", estamos falando de crer no Deus que se revelou em Sua Palavra.
O exemplo supremo disso é Abraão, o pai dos crentes. Sua fé não surgiu do nada. Ela foi uma resposta a uma palavra específica de Deus. Gênesis 15 nos diz: "Veio a palavra do Senhor a Abrão, em visão, dizendo: Não temas, Abrão, eu sou o teu escudo, o teu grandíssimo galardão." E depois: "Assim será a tua descendência." A Bíblia então conclui: "E creu ele no Senhor, e imputou-lhe isto por justiça" (Gênesis 15:6). Abraão creu na promessa de Deus.
E que promessa milagrosa! Abraão e Sara eram idosos, seus corpos, para a procriação, estavam "como mortos". A esperança humana era nula. No entanto, a promessa de Deus era que teriam um filho e que sua descendência seria como as estrelas do céu.
A fé de Abraão foi "em esperança, contra a esperança", ou seja, ele creu na promessa de Deus mesmo quando todas as evidências humanas apontavam para o contrário.
Aplicação
Esta verdade — que a fé se agarra à promessa de Deus — tem implicações profundas para nossa vida espiritual.
- Direcione sua fé para fora, não para dentro. Em vez de se perguntar "será que eu tenho fé suficiente?", pergunte-se: "estou realmente acreditando na promessa de Deus?". O foco não deve ser a qualidade da sua fé, mas a qualidade do Objeto da sua fé: Deus e Suas promessas infalíveis. Uma fé pequena em um Deus grande é infinitamente mais poderosa do que uma "grande fé" em si mesmo.
- Alimente sua fé com a Palavra. Se a fé vem em resposta à promessa, então a maneira de fortalecer a fé é mergulhar na Palavra, onde as promessas de Deus são encontradas. A fé não é algo que você tenta fabricar; ela é gerada em seu coração à medida que você ouve o evangelho.
- Identifique as promessas de Deus para suas lutas. Você está lutando com ansiedade? Encontre e se apegue às promessas de Deus sobre Sua paz e cuidado. Está lutando com a culpa? Medite nas promessas de perdão e purificação. A fé personalizada se apega a promessas específicas para necessidades específicas.
2. A natureza da fé é a certeza
Isso pode soar chocante para muitos, mas na Bíblia, a fé não é incerteza; é certeza e confiança firme. A palavra hebraica para "crer" está relacionada à palavra "amém", que significa "isto é certo e verdadeiro". Ter fé é dizer "amém" às promessas de Deus.
A fé de Abraão é descrita por Paulo como uma convicção inabalável. Ele "não duvidou da promessa de Deus por incredulidade, mas foi fortificado na fé, dando glória a Deus; E estando certíssimo de que o que ele tinha prometido também era poderoso para o fazer." (Romanos 4:20-21).
Abraão encontrou segurança não em si mesmo ou nas circunstâncias, mas unicamente na promessa de um Deus que "dá vida aos mortos, e chama as coisas que não são como se já fossem" (Romanos 4:17).
Isso significa que um crente nunca duvida? De forma alguma. A vida cristã é uma luta constante contra a incredulidade. Quem nunca duvidou, provavelmente nunca creu de verdade. No entanto, a luta não muda a natureza da fé. Uma fé que duvida é como fogo frio ou água seca — uma contradição. A essência da fé é a certeza, mesmo que tenhamos que lutar para mantê-la.
A dúvida não é uma virtude a ser cultivada; é um pecado a ser combatido. Jesus repreendeu seus discípulos por sua pequena fé e por duvidarem (Mateus 14:31, Lucas 8:25). A dúvida não glorifica a Deus; ela O desonra, pois, em essência, o trata como mentiroso. Portanto, devemos combater a dúvida em nós e nos outros com a arma poderosa do evangelho de Cristo.
Aplicação
Lutar pela certeza da fé é uma das batalhas mais importantes da vida cristã. Aqui estão algumas formas práticas de fazer isso.
- Distinga entre dúvida e incredulidade. Dúvida é ter perguntas e lutar com incertezas enquanto se agarra a Deus. Incredulidade é a decisão de virar as costas para Deus. A Bíblia condena a incredulidade, mas mostra compaixão pela dúvida honesta (como no caso do pai que clamou: "Eu creio, Senhor! ajuda a minha incredulidade", Marcos 9:24).
- Pregue o evangelho para si mesmo todos os dias. Lembre-se do caráter de Deus: Ele é fiel e todo-poderoso. Lembre-se da obra de Cristo: Ele morreu por nossas transgressões e ressuscitou para nossa justificação. Reafirmar essas verdades fundamentais fortalece a convicção.
- Rejeite a falsa humildade que se gloria na dúvida. Em alguns círculos, a dúvida é vista como um sinal de profundidade espiritual. A Bíblia a vê como uma fraqueza a ser superada. Não se acomode na incerteza. Lute pela alegria e pela paz que vêm de uma fé segura nas promessas de Deus.
3. O crente de hoje crê no mesmo Deus de Abraão
A história da fé de Abraão não foi registrada para que o aplaudíssemos, mas "por nossa causa... a nós, que cremos naquele que dentre os mortos ressuscitou a Jesus nosso Senhor" (Romanos 4:24). A nossa fé tem o mesmo objeto da fé de Abraão: um Deus que dá vida aos mortos.
Abraão creu que Deus poderia dar vida a seu corpo e ao de Sara, que estavam "mortos" para a procriação. Nós cremos que esse mesmo Deus realizou o milagre supremo de dar vida aos mortos ao ressuscitar Jesus, nosso Senhor.
Ele foi entregue por nossas transgressões, e ressuscitou para nossa justificação. Nossa fé se ancora neste evento histórico, a prova máxima de que as promessas de Deus são verdadeiras e Seu poder é ilimitado.
Nunca devemos crer em nós mesmos, ou até mesmo em nossa própria fé. Como Lutero disse, isso é corromper a fé, direcioná-la para o objeto errado. Nossa fé deve sempre ser direcionada para Jesus Cristo, que nos é anunciado pelo evangelho.
Aplicação
O túmulo vazio é a âncora da nossa fé e a fonte da nossa certeza.
- Baseie sua fé em fatos, não em sentimentos. Seus sentimentos mudam, mas a ressurreição de Cristo é um fato histórico. Quando a dúvida atacar, volte para a evidência da ressurreição. Se Cristo ressuscitou, então tudo o que o evangelho diz é verdade.
- Examine-se corretamente. Ao examinar sua fé, a pergunta não é "quão forte eu sinto minha fé hoje?", mas "estou realmente confiando em Jesus Cristo e em Sua obra consumada?". O foco está no objeto, não na sua experiência subjetiva.
- Veja o paralelo entre Abraão e você. Abraão não tinha evidências, apenas uma promessa. Nós temos uma promessa e a prova máxima de seu cumprimento: a ressurreição. Se a fé de Abraão foi considerada justiça, quanto mais a nossa, que se apoia em uma revelação tão mais clara!
Conclusão
A fé bíblica não é um salto no escuro, mas um passo firme sobre a rocha sólida da Palavra de Deus. Seu objeto não é vago, mas específico: a promessa de salvação em Jesus Cristo. Sua natureza não é a incerteza, mas a convicção, uma certeza pela qual lutamos diariamente.
Somos chamados a crer no mesmo Deus que deu vida ao corpo morto de Abraão e, de forma ainda mais gloriosa, que ressuscitou nosso Senhor Jesus da morte. Que possamos rejeitar a noção popular de "crença" como mera opinião e abraçar a fé bíblica como uma confiança robusta e transformadora, dizendo "Amém" a tudo o que Deus prometeu e cumpriu em Cristo.