Se eu lhe perguntasse o que é "graça", é provável que você me desse uma resposta rápida. É uma das primeiras palavras que aprendemos na jornada da fé.
Mas, como acontece com muitas palavras familiares, corremos o risco de pensar que a conhecemos profundamente, quando na verdade mal arranhamos sua superfície.
Alguém poderia pensar: "Posso pular este estudo, já sei o que é graça desde criança". A esse pensamento, respondo com um convite pastoral: vamos redescobrir juntos a profundidade, a beleza e o poder transformador desta palavra que é o coração do evangelho.
A palavra grega para graça, charis, tem sua raiz em uma palavra que significa "alegria". Graça, portanto, é algo que agrada e alegra.
Imagine um súdito acusado diante de um poderoso rei oriental. A ira do rei significa morte; seu favor significa vida. Que alívio, que alegria imensa sentiria esse homem se o rei se inclinasse em sua direção com um olhar benevolente!
Essa é a imagem da graça. É o favor imerecido de alguém superior. Foi o que aconteceu com Ester, que se aproximou do rei Assuero sem ser convidada, arriscando a própria vida. Mas lemos que "ela alcançou graça aos seus olhos" (Ester 5:2). O rei inclinou-se com favor, e ela viveu.
Se a graça de um rei terreno traz tanta alegria, quanto mais a graça do Deus Todo-Poderoso, que não apenas concede vida física, mas a vida eterna?
Sua graça é como o sol que aquece e ilumina, como a bênção de Números 6:25 diz: "O Senhor faça resplandecer o seu rosto sobre ti e tenha misericórdia de ti". A pergunta que nos guiará é: como essa graça redefine completamente a maneira como nos relacionamos com Deus e com o mundo?
1. A graça é o oposto do mérito
O primeiro e mais fundamental aspecto da graça é que não temos nenhum direito a ela. A graça se opõe diretamente ao conceito de mérito, salário ou recompensa. O apóstolo Paulo deixa isso meridianamente claro em Romanos 4:4:
Romanos 4:4
Ora, àquele que faz qualquer obra, não lhe é imputado o galardão segundo a graça, mas segundo a dívida.
Fora do cristianismo bíblico, quase todas as religiões e filosofias de vida operam com base no mérito.
A relação com o divino é vista como um contrato: se eu fizer minha parte, se eu cumprir as regras, então posso estender a mão e exigir minha recompensa. Essa era a mentalidade dos fariseus.
Jesus ilustrou perfeitamente essa mentalidade na parábola do fariseu e do publicano. O fariseu, em pé, orava "agradecendo" a Deus por não ser como os outros homens, listando suas virtudes: jejuava, dava o dízimo, era moralmente superior. Em essência, ele estava apresentando a Deus seu currículo, convencido de que havia merecido um lugar no céu.
O erro fundamental do paganismo, do legalismo judaico — e, sejamos honestos, de muito do nosso próprio coração — é a recusa em viver de graça. Queremos ter algo a oferecer, algum mérito para apresentar.
Em contraste, o publicano, de longe, nem ousava levantar os olhos, mas batia no peito dizendo: "Ó Deus, tem misericórdia de mim, pecador!". Ele não tinha nada a oferecer. Se Deus o tratasse segundo a justiça, ele pereceria. Ele só podia apelar para a graça.
Isso nos ensina que nunca devemos nos apoiar em nosso próprio valor. Devemos chegar a Deus de mãos vazias, confessando com Paulo: "...pois todos pecaram e estão destituídos da glória de Deus" (Romanos 3:23). A contraposição é absoluta: "E, se é pela graça, já não é pelas obras; de outra maneira, a graça já não é graça" (Romanos 11:6).
Ser salvo pela graça significa que não podemos nos gloriar em absolutamente nada. Nem mesmo Martinho Lutero estava imune a essa tentação, ao dizer: "Se vocês abrissem meu coração, encontrariam um Papa dentro dele", reconhecendo que o pecado do orgulho e da autojustificação vive em todos nós. Toda glória própria desaparece diante da cruz de Cristo.
Aplicação
- Identifique o "fariseu interior". Em que áreas da sua vida você se sente secretamente superior aos outros? Pode ser sua moralidade, seu conhecimento bíblico, seu serviço na igreja ou sua disciplina. Confesse esse orgulho como o pecado que é e peça a Deus um coração como o do publicano.
- Abandone a "contabilidade espiritual". Pare de tentar somar pontos com Deus através de suas boas obras (leitura bíblica, oração, serviço). Essas são respostas de amor à graça, não formas de ganhá-la. Sua aceitação por Deus não aumenta nos dias em que você "acerta" nem diminui nos dias em que você "erra". Ela está firmada em Cristo.
- Aprenda a descansar. A vida baseada no mérito é exaustiva. A vida baseada na graça é um descanso. Você não precisa mais performar para ser amado. Medite em Efésios 2:8-9: "Porque pela graça sois salvos, por meio da fé; e isto não vem de vós, é dom de Deus; não vem das obras, para que ninguém se glorie".
2. A graça não é uma substância, mas o favor de uma Pessoa
Um erro sutil, mas muito perigoso, é pensar na graça como uma "coisa". Teólogos católicos romanos, por exemplo, falam de uma "graça infusa", que é derramada no coração do homem, quase como um líquido divino injetado em nossa alma. Essa ideia, muitas vezes, tem raízes pagãs, que imaginavam uma espécie de "fluido divino" que nos tornava parcialmente divinos.
Mesmo em círculos evangélicos, podemos cair nesse erro. Falamos da graça como se fosse um poder impessoal, uma "coisa" que buscamos dentro de nós, no "coração" ou na "alma". A fé na obra objetiva de Cristo é, então, desprezada em favor de uma busca por uma experiência interna, mística e indescritível.
Frases que soam piedosas, como "Cristo deve nascer no seu coração" ou "a cruz deve ser erguida em seu coração", podem ser perigosas se nos levarem a buscar a graça dentro de nós mesmos, em vez de buscá-la fora de nós mesmos, em Jesus Cristo.
As Escrituras não falam da graça como uma substância em nós. Elas falam da graça para nós, sobre nós. Estamos "debaixo da graça" (Romanos 6:14). A graça de Deus em Cristo é como um sol que brilha sobre nossa vida. Ela é um atributo ativo e pessoal de Deus.
Assim como a salvação e a vida devem ser buscadas em Cristo, também a graça de Deus deve ser buscada Nele. Ela não é algo que possuímos, mas um favor que recebemos continuamente da Pessoa de Deus por causa da Pessoa de Cristo.
Aplicação
- Mude sua busca de "dentro" para "fora". Quando se sentir espiritualmente seco ou fraco, sua primeira inclinação é olhar para dentro, procurando um sentimento ou uma "faísca"? Treine seu coração para, em vez disso, olhar para fora: para Cristo e Sua obra consumada na cruz. É lá que a graça se encontra.
- Pense na graça em termos de relacionamento, não de transação. Você não "acumula" graça para "gastar" mais tarde. Você vive em um relacionamento de favor com um Deus gracioso. Sua vida cristã não é sobre gerenciar um recurso, mas sobre cultivar um relacionamento.
- Rejeite a ideia de que a fé "não é suficiente". Cuidado com ensinos que dizem que a fé no evangelho é apenas o começo e que você precisa de uma "segunda experiência" ou de uma "graça interior" mais profunda. A fé simples no que Cristo fez por você é o canal pelo qual toda a graça de Deus flui para sua vida.
3. A graça de Deus nos alcança através do Evangelho
Se a graça é o favor imerecido de Deus encontrado em Cristo, como participamos dela? A resposta da Bíblia é inequívoca: por meio da fé no evangelho. Graça e fé estão inseparavelmente ligadas.
Paulo conecta esses dois conceitos de forma magistral: "Porque pela graça sois salvos, por meio da fé" (Efésios 2:8). E novamente: "Portanto, é pela fé, para que seja segundo a graça, a fim de que a promessa seja firme a toda a posteridade" (Romanos 4:16).
A graça não nos chega por meio de vivências milagrosas isoladas, fora de Cristo e de Sua Palavra.
Certa vez, ouvi um homem relatar como ele "conheceu a graça" através de experiências estranhas, usando uma linguagem que não se encontra nas Escrituras. Curiosamente, ele não mencionou Jesus Cristo, a fé ou o evangelho. Para ele, a fé era necessária, mas a "verdadeira graça" era algo que ia "muito além".
Isso é um desvio perigoso do caminho que Deus revelou. Não há outro caminho. A graça de Deus "se manifestou salvadora a todos os homens" (Tito 2:11) na pessoa e obra de Jesus. O apóstolo Pedro nos exorta a esperar "inteiramente na graça que se vos ofereceu na revelação de Jesus Cristo" (1 Pedro 1:13).
O evangelho não é apenas uma mensagem sobre a graça; ele é o "evangelho da graça de Deus" (Atos 20:24). É o anúncio alegre do insondável favor de Deus em Cristo. E esse anúncio não são apenas palavras; é "o poder de Deus para salvação de todo aquele que crê" (Romanos 1:16). A graça de Deus é um poder que nos salva, e esse poder é liberado em nossa vida quando cremos na boa notícia.
Aplicação
- Pregue o evangelho para si mesmo todos os dias. Lembre-se diariamente de que sua aceitação diante de Deus não depende do seu desempenho de hoje, mas do desempenho perfeito de Cristo. Essa é a notícia que liberta a graça em sua vida.
- Não busque atalhos para a graça. O único caminho para experimentar o favor de Deus é o caminho da fé simples no evangelho. Desconfie de qualquer ensino que prometa uma experiência espiritual profunda que minimize a centralidade da cruz e da fé em Cristo.
- Compartilhe o evangelho como um presente de graça. Quando você fala de Jesus para alguém, não está pedindo que a pessoa "se esforce mais". Você está oferecendo um presente gratuito: o favor imerecido de Deus. Isso muda completamente o tom do nosso evangelismo, de exigência para oferta.
Conclusão
A graça de Deus não é apenas o ponto de partida da vida cristã; ela é a fonte de toda a nossa jornada. A graça é o fundamento do perdão dos nossos pecados, da paz que excede todo entendimento, da nova vida que recebemos, da nossa justificação, santificação e glorificação final.
Participar da graça de Deus é beber de uma fonte inesgotável. Ela é a única coisa necessária e, ao mesmo tempo, totalmente suficiente, tanto na vida quanto na morte.
Quando o apóstolo Paulo orou para que seu "espinho na carne" fosse removido, a resposta de Deus não foi a remoção do problema, mas a afirmação da solução: "A minha graça te basta" (2 Coríntios 12:9).
De fato, a graça de Deus é suficiente. Ela se contrapõe a toda preocupação, miséria e sofrimento que enfrentamos. Às vezes, parece que tudo está contra nós. Perdemos o que amamos, recebemos o que tememos. Mas a graça de Deus em Cristo se eleva acima de tudo isso. E todas as vezes que vivemos por essa graça, podemos declarar com confiança inabalável:
Romanos 8:31
... Se Deus é por nós, quem será contra nós?
Que possamos não apenas conhecer a definição de graça, mas viver, respirar e nos alegrar na realidade do favor imerecido de nosso Deus, hoje e para sempre.