A Admoestação: Por que a Correção em Amor é um Abraço que Resgata – Estudo Bíblico sobre os temas do NT

No último estudo bíblico, falamos sobre o consolo. Ao ler o título de hoje, talvez você pense: "Agora vem o oposto". Em nossa mente, consolo e admoestação parecem inimigos. Alegramo-nos com o consolo, mas ninguém gosta de ser admoestado.

No entanto, a verdade bíblica é que consolo e admoestação não se contradizem. Na verdade, deveríamos nos alegrar com ambos. Assim como é ruim viver sem consolo, também é prejudicial viver sem correção ou sem aceitá-la quando ela vem.

A beleza dessa conexão se revela na língua original do Novo Testamento. A mesma palavra grega, parakaleo, é usada tanto para consolar quanto para admoestar. Podemos ver isso comparando diferentes traduções. 

Em Atos 13.15, quando Paulo e Barnabé estão na sinagoga, os líderes os convidam a falar. Algumas versões dizem: "Se tendes alguma palavra de exortação para o povo, falai". Outras traduzem como: "Se tendes alguma palavra de consolação... falai".

Como isso é possível? O verbo parakaleo significa literalmente "chamar para junto de si". Imagine um pai que vê seu filho fazendo algo perigoso. Ele o chama: "Filho, venha aqui um momento", e então o admoesta, corrigindo seu comportamento. Agora, imagine esse mesmo pai vendo seu filho chorando. Ele o chama para perto, o abraça e o consola.

Em ambos os casos, o ato de "chamar para junto" nasce do amor e do cuidado. A admoestação, portanto, não é um ato de rejeição, mas de proteção e resgate. Como podemos entender a admoestação não como uma crítica destrutiva, mas como uma ferramenta essencial de Deus para nosso crescimento e segurança espiritual?

1. A admoestação é o cuidado de Deus expresso em palavras

No Antigo Testamento, a palavra "admoestar" não aparece com tanta frequência, mas a prática está por toda parte. E não se engane, ser admoestado pelo Senhor nunca foi uma maldição, mas sempre uma bênção. É o Pai celestial agindo para afastar Seus filhos do mal e guiá-los para o que é bom.

O rei Josafá, ao instituir juízes em Jerusalém, deu-lhes uma ordem clara: "adverti-os, para que não pequem contra o SENHOR, e não venha grande ira sobre vós e sobre vossos irmãos" (2 Crônicas 19.10). A finalidade da admoestação é nos preservar do pecado e nos manter no caminho certo. Quem não ficaria grato por um cuidado assim?

O Salmo 19 descreve os preceitos do Senhor como "mais desejáveis do que o ouro... e mais doces do que o mel" (v. 10). Logo em seguida, o salmista conclui: "Além disso, por eles se admoesta o teu servo; em os guardar, há grande recompensa" (v. 11). 

A Lei de Deus, que nos adverte sobre o pecado, é vista como algo belo e desejável. É por isso que Eclesiastes afirma: "Melhor é o jovem pobre e sábio do que o rei velho e insensato, que já não se deixa admoestar" (Eclesiastes 4.13). Recusar a correção é um sinal de insensatez.

É crucial entender que as admoestações da Bíblia não são legalistas. Muitas vezes, cria-se uma falsa oposição entre o Antigo Testamento (visto como Lei) e o Novo Testamento (visto como Evangelho). Mas isso é um erro. As admoestações do Antigo Testamento já eram evangélicas, pois estavam fundamentadas na aliança de graça que Deus estabeleceu com Seu povo.

Primeiro, Deus se entrega ao Seu povo, e depois, dentro dessa relação de amor, vêm as orientações. Ele diz a Abraão: "Eu sou o Deus Todo-Poderoso". E então acrescenta: "anda na minha presença e sê perfeito" (Gênesis 17.1). 

Ele declara a Israel: "Eu sou o SENHOR, teu Deus, que te tirei da terra do Egito", e só depois apresenta os Dez Mandamentos (Êxodo 20.2). As admoestações não são um meio para conquistar o favor de Deus, mas para viver na graça que já recebemos.

Essa mesma lógica permeia o Novo Testamento. O Sermão do Monte não começa com exigências, mas com as Bem-Aventuranças. 

Primeiro, Jesus declara Seus discípulos "felizes" e lhes dá o Reino; depois, Ele ensina a lei desse Reino. As cartas de Paulo seguem um padrão semelhante: primeiro, a doutrina (o que temos em Cristo) e, depois, a prática (como devemos viver por causa de Cristo).

O início de Romanos 12 deixa isso claríssimo: "Rogo-vos, pois, irmãos, pelas misericórdias de Deus, que apresenteis o vosso corpo por sacrifício vivo...". 

A admoestação para uma vida santa não é uma troca, mas uma resposta natural e grata à imensa misericórdia que recebemos. A misericórdia de Deus nos impulsiona a uma vida de gratidão. Só esquecendo a graça é que podemos continuar a viver no pecado.

Aplicação

Como você reage quando é corrigido ou confrontado com uma verdade bíblica que desafia seu comportamento? Nossa reação inicial muitas vezes revela se enxergamos a admoestação como um ataque pessoal ou como o cuidado de Deus.

  • Reavalie sua percepção: Comece a orar para que Deus mude sua perspectiva. Peça para ver a correção (seja através de um sermão, de um amigo ou da leitura da Bíblia) como um presente, um ato de amor de um Pai que não quer que você se perca.
  • Diferencie a fonte: Nem toda crítica é uma admoestação piedosa. Aprenda a discernir. A admoestação bíblica é fundamentada na Palavra, motivada pelo amor e visa à restauração, não à humilhação. A crítica legalista impõe fardos e acusa.
  • Agradeça em vez de se defender: Da próxima vez que um irmão ou líder lhe trouxer uma palavra de correção com amor, exercite a humildade. Em vez de justificar-se imediatamente, agradeça pela coragem e preocupação dele. Peça um tempo para orar e refletir sobre o que foi dito.

2. A admoestação é uma responsabilidade de toda a comunidade da fé

É muito cômodo pensar que a tarefa de admoestar pertence apenas ao pastor e aos presbíteros. No entanto, o Senhor distribuiu essa responsabilidade a todos os membros de Sua família. É um trabalho belo e, por vezes, difícil, que demonstra o amor prático dentro da igreja.

Um pastor não deve ter medo de admoestar o povo de Deus, desde que o faça da maneira correta. A correção deve vir "em nome do Senhor", fundamentada na Sua misericórdia. Lembro-me de uma ocasião em que um presbítero, após um sermão meu, disse com sabedoria: "Você bateu tanto, figurativamente falando, que até as ovelhas saudáveis do Senhor ficaram assustadas". 

Aquela palavra me ensinou a corrigir com mais graça e cuidado, lembrando que a admoestação visa também a nos manter na fé, buscando a salvação fora de nós mesmos, em Cristo.

Contudo, a Bíblia é clara ao afirmar que essa não é uma tarefa exclusiva da liderança. Em Levítico, encontramos uma ordem surpreendente: "Não odiarás a teu irmão no teu coração; não deixarás de repreender o teu próximo e não levarás sobre ti pecado por causa dele" (Levítico 19.17). O texto conecta diretamente a ausência de repreensão ao ódio. 

Deixar um irmão caminhar em direção ao abismo sem alertá-lo é uma forma de odiá-lo, pois permitimos que ele se perca. Amá-lo de verdade é ter a coragem de avisá-lo.

No Novo Testamento, Jesus estabelece esse princípio para a Sua Igreja em Mateus 18.15: "Se teu irmão pecar contra ti, vai argui-lo entre ti e ele só...". 

Este é um mandato para todos os membros da Igreja. A intenção é sempre "ganhar" o irmão, resgatá-lo de um caminho que leva à destruição. Infelizmente, essa prática é rara. É mais comum ouvir queixas e fofocas sobre um irmão do que saber que alguém foi procurá-lo em particular, com amor e humildade, para conversar.

As desculpas são muitas: "Não sei falar direito", "Eu também não sou perfeito", "Não vai adiantar nada". Mas essas justificativas ignoram a seriedade do pecado e o poder restaurador do evangelho. 

A Palavra de Deus insiste: "A palavra de Cristo habite em vós abundantemente, em toda a sabedoria, ensinando-vos e admoestando-vos uns aos outros" (Colossenses 3.16). E Hebreus nos exorta: "Exortai-vos uns aos outros todos os dias, para que nenhum de vós se endureça pelo engano do pecado" (Hebreus 3.13).

Aplicação

A fofoca é a versão covarde e destrutiva da admoestação. Ela fala *sobre* a pessoa, enquanto a admoestação fala *com* a pessoa. Como podemos sair do ciclo da fofoca e entrar na prática do cuidado mútuo?

  • Faça um pacto pessoal: Decida hoje que você não falará sobre o erro de um irmão com uma terceira pessoa antes de ter orado e conversado com o próprio irmão. Se você não tiver coragem ou a intenção de falar com ele, então não fale sobre ele.
  • Prepare seu coração antes de falar: A admoestação nunca deve ser feita no calor da raiva. Antes de procurar alguém, ore. Examine suas próprias motivações. Você está indo para ganhar uma discussão ou para ganhar um irmão? Você está indo com um espírito de superioridade ou de humildade, sabendo que você também é um pecador salvo pela graça?
  • Seja específico e bíblico: Ao conversar, não faça acusações vagas ("Você tem uma atitude ruim"). Aponte o comportamento específico de forma clara e amorosa, mostrando como aquilo se choca com os ensinamentos da Palavra de Deus.
  • Esteja pronto para ouvir: Uma conversa de admoestação não é um monólogo. Esteja preparado para ouvir a perspectiva do outro e, quem sabe, até para reconhecer que você interpretou algo de forma errada.

3. A admoestação começa no lar e exige um coração dependente de Deus

Se a admoestação mútua é uma tarefa de toda a igreja, ela encontra um campo de treinamento especial e vital dentro da família. 

Aos pais, a Escritura ordena: "E vós, pais, não provoqueis vossos filhos à ira, mas criai-os na disciplina e na admoestação do Senhor" (Efésios 6.4). Paulo compara seu ministério ao cuidado de um pai e uma mãe, que naturalmente alertam seus filhos sobre o mal e os incentivam ao bem.

Lembro-me de um jovem que atendi em meu gabinete. Ele levava uma vida desregrada, e os rumores sobre seu comportamento eram muitos. 

Quando finalmente conversei com ele, perguntei se alguém já o havia alertado sobre os perigos do caminho que estava seguindo. Sua resposta foi chocante e triste: "Ninguém nunca me chamou a atenção seriamente". As pessoas o criticavam pelas costas, mas ninguém, nem mesmo seu pai, sentou-se para admoestá-lo com amor e firmeza.

Por que isso acontece? Porque admoestar é difícil. Na verdade, em nossas próprias forças, é quase impossível. Se pensamos "Eu vou consertá-lo, eu vou mudá-lo", o mais provável é que fracassemos e nos sintamos frustrados. Por natureza, nos falta a sabedoria, a paciência e o amor necessários para admoestar como o Senhor deseja.

Mas o que é impossível em nossa força torna-se possível Nele. A admoestação se torna fácil quando reconhecemos nossa total dependência de Deus.

Quando pedimos a Ele a sabedoria que nos falta, quando aprendemos com Ele a paciência e quando amamos nossos irmãos e filhos através do Seu amor, então encontramos a capacidade de corrigir. 

Às vezes, uma única palavra dita no momento certo é suficiente. Outras vezes, um gesto ou um olhar. Em outras situações, é preciso uma conversa séria e planejada.

A maior barreira para a admoestação eficaz, seja na igreja ou em casa, é a hipocrisia. Ai de nós se fizermos aquilo que condenamos nos outros! Nossas vidas precisam ser o alicerce de nossas palavras. Se nossos filhos ou irmãos nos veem praticando o mal, o Senhor nos cobrará por termos sido uma pedra de tropeço para eles.

Aplicação

A admoestação eficaz não é uma técnica a ser dominada, mas o fruto de um coração que caminha perto de Deus. Ela nasce da humildade, não da arrogância.

  • Pais, comecem em casa: Criar filhos na "admoestação do Senhor" não é apenas dar broncas. É criar um ambiente onde a Palavra de Deus é a autoridade, onde o perdão é praticado e onde as conversas sobre pecado e graça são normais e cheias de amor. Sua vida é o sermão mais importante que seus filhos ouvirão.
  • Ore por sabedoria e coragem: Se você vê um irmão ou um filho em um caminho perigoso, não confie em sua própria capacidade. Leve a situação a Deus em oração. Peça sabedoria para saber *se*, *quando* e *como* falar. Peça coragem para não se omitir por medo.
  • Comece por você mesmo: Você é ensinável? Você se deixa admoestar? A melhor maneira de aprender a dar correção é aprender a recebê-la. Peça a Deus um coração humilde e aberto, que não se ofenda com a correção, mas que a veja como uma oportunidade de crescimento.

Conclusão

As palavras de Jesus ecoam com seriedade: "Nem todo o que me diz: Senhor, Senhor! entrará no reino dos céus, mas aquele que faz a vontade de meu Pai, que está nos céus" (Mateus 7.21). Saber as coisas não é suficiente; somos bem-aventurados quando as praticamos.

A admoestação bíblica é uma dessas práticas essenciais. Ela não é um ataque, mas um resgate. Não é um sinal de inimizade, mas a mais pura expressão de amor fraternal. É o "chamar para junto" de Deus, usando nossas vozes para proteger, guiar e restaurar aqueles a quem amamos.

Que Deus nos dê a graça de superar nosso medo e comodismo, trocando a fofoca pela conversa corajosa, a indiferença pelo cuidado ativo e a crítica pelas costas pela admoestação face a face. Que comecemos a praticar essa disciplina, começando em nosso próprio coração e em nossa própria casa, para a glória de Deus e para a saúde de Sua Igreja.


Lista de estudos da série

1. O Evangelho: A Vitória de Deus que Redefine a Vida – Estudo Bíblico

Semeando Vida

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