A Conversão: A Virada de 180 Graus que Deus Opera em Nós – Estudo Bíblico sobre os temas do NT

"Conversão" é uma palavra que todos nós, na igreja, conhecemos bem. Sabemos que ela é essencial para a vida cristã. O Catecismo de Heidelberg a define de forma bela e profunda: a conversão tem duas partes. 

A primeira é a morte do velho homem, que consiste em sentir um pesar sincero por termos ofendido a Deus, odiando e evitando cada vez mais o pecado. A segunda é a vivificação do novo homem, que é alegrar-se de todo o coração em Deus por meio de Cristo e desejar viver segundo a Sua vontade, exercitando-se em toda boa obra.

Talvez saibamos distinguir entre novo nascimento e conversão, entre a "primeira conversão" e a "conversão diária". Mas todo esse conhecimento teórico pode mascarar uma falta de conversão real e prática em nossas vidas.

Quando as Escrituras nos chamam à conversão, a intenção não é apenas que saibamos o que ela é, mas que nos convertamos de fato de pecados específicos. A conversão exige uma mudança. E a pergunta honesta que devemos nos fazer é: muitas coisas estão realmente mudando em nossa vida?

Um teólogo lamentou que já não entendemos o que é pecado e graça. Da mesma forma, podemos perguntar: ainda vemos muitas conversões acontecendo? Por isso, é fundamental entendermos a que somos chamados quando o Senhor nos conclama à conversão. A questão que nos guiará é: o que significa, na prática, essa virada de direção que Deus exige de nós?

1. Conversão é uma mudança radical de direção

A palavra hebraica mais comum para "converter-se" no Antigo Testamento significa, em seu uso cotidiano, "voltar", "retroceder no caminho", "mudar de direção". É uma palavra de ação.

Após Davi derrotar Golias, os israelitas perseguiram os filisteus e depois "voltaram... e saquearam seu acampamento" (1 Samuel 17:53). A mesma palavra é usada em um contexto espiritual em 1 Samuel 7. Israel estava sob o domínio dos filisteus e clamava ao Senhor. O profeta Samuel então lhes diz:

1 Samuel 7:3
Se de todo o vosso coração vos converterdes ao Senhor, tirai dentre vós os deuses estranhos e os astarotes, e preparai o vosso coração ao Senhor, e servi a ele só.

Até então, os israelitas serviam a ídolos pagãos. Seus corações não estavam voltados para o Senhor. A conversão exigia uma mudança total de lealdade. O povo, então, reuniu-se, jejuou, derramou água como sinal de um coração contrito e confessou: "Contra o Senhor temos pecado" (v. 6).

Esta história nos ensina os três elementos essenciais da verdadeira conversão:

  1. Uma mudança no coração: Um arrependimento sincero, uma compunção por termos irado a Deus com nosso pecado.
  2. Uma mudança na confissão: Uma admissão aberta de nossa culpa: "Contra Ti pecamos".
  3. Uma mudança na ação: Romper efetivamente com os pecados e começar a fazer o que agrada ao Senhor.

Os profetas estão repletos de chamados à conversão, sempre ligados a pecados concretos: opressão aos pobres (Amós 5), rituais religiosos vazios (Miqueias 6), idolatria. E o profeta Ezequiel enfatiza a responsabilidade pessoal: "A alma que pecar, essa morrerá... Mas, se o ímpio se converter de todos os seus pecados que cometeu... certamente viverá" (Ezequiel 18:20-21).

Aplicação

  • Identifique os "deuses estranhos" em sua vida. A conversão sempre envolve abandonar ídolos. Quais são os ídolos que competem com Deus pelo seu coração? Conforto, segurança financeira, aprovação dos outros, poder? A verdadeira conversão exige "tirar" esses ídolos do centro da sua vida.
  • Verifique se sua conversão tem os três elementos. Você sente um pesar genuíno pelo seu pecado (coração)? Você o confessa abertamente a Deus (confissão)? Você toma medidas práticas para abandoná-lo e buscar a obediência (ação)? Uma conversão que carece de um desses elementos é incompleta.
  • Pratique a responsabilidade pessoal. É fácil culpar nossa criação, nossa cultura ou nossas circunstâncias por nossos pecados. Ezequiel nos lembra que somos pessoalmente responsáveis por nossas escolhas. Assuma a responsabilidade por seus pecados e "convertei-vos, pois, e vivei".

2. Conversão é uma mudança de mentalidade e de caminho

No Novo Testamento, João Batista e o próprio Senhor Jesus iniciam seus ministérios com o mesmo chamado: "Arrependei-vos, porque é chegado o Reino dos céus" (Mateus 3:2; 4:17). Esse chamado era dirigido a um povo extremamente religioso. Eles cumpriam suas obrigações, jejuavam, davam o dízimo. Por que precisavam se converter?

Porque, com toda a sua religiosidade, eles não queriam viver da graça. Tentavam merecer o favor de Deus por meio de suas obras. A chegada do Reino era a chegada da graça de Deus. Eles precisavam se "converter", dar as costas às suas obras religiosas mortas e buscar o perdão e a vida em Jesus Cristo.

O Novo Testamento usa duas palavras principais para conversão. Uma (metanoia) significa literalmente "mudar de mente", pensar e querer de outra forma. A outra (epistrophe) significa "mudar de caminho", de estilo de vida. Embora às vezes uma enfatize a mudança interna e a outra, a externa, na prática elas são inseparáveis. Atos 3:19 as une: "Arrependei-vos, pois, e convertei-vos".

A conversão abrange a transformação do coração, da mente, da vontade, das afeições e de todo o curso da vida. Por isso, não vejo diferença fundamental entre "Importa-vos nascer de novo" (João 3:7) e "Arrependei-vos e convertei-vos".

Aplicação

  • Examine sua mentalidade sobre a salvação. Você ainda opera com uma mentalidade de obras, tentando "pagar" a Deus com sua obediência? Ou sua mente foi renovada para entender que você vive unicamente pela graça? A verdadeira conversão é uma revolução em como pensamos sobre nossa relação com Deus.
  • Verifique se sua mudança de mente resultou em uma mudança de caminho. É possível ter a teologia correta sobre a graça, mas continuar andando nos mesmos caminhos de egoísmo, orgulho ou imoralidade. Uma verdadeira metanoia (mudança de mente) levará inevitavelmente a uma epistrophe (mudança de caminho).
  • Pregue o arrependimento para si mesmo. A conversão não é um evento único, mas um estilo de vida. Todos os dias, precisamos nos arrepender de nossa autossuficiência e nos converter novamente para a suficiência de Cristo.

3. Conversão é uma obra de Deus que exige nossa resposta

Aqui chegamos a um mistério profundo. Quem opera a conversão? Nós ou Deus? As Escrituras afirmam ambos sem contradição.

Por um lado, a conversão é claramente um dom de Deus. O profeta ora: "Converte-nos a ti, Senhor, e seremos convertidos" (Jeremias 31:18). Em Atos 11:18, a igreja conclui: "Logo, também aos gentios concedeu Deus o arrependimento para a vida".

Por outro lado, o chamado para se converter é dirigido a nós. Deus repreende os obstinados que "não quiseram se arrepender". Ninguém jamais poderá explicar perfeitamente a relação entre a soberania de Deus e a responsabilidade humana. As Escrituras simplesmente as colocam lado a lado, como em Filipenses 2:12-13:

Filipenses 2:12-13
...operai a vossa salvação com temor e tremor; porque Deus é o que opera em vós tanto o querer como o efetuar, segundo a sua boa vontade.

Portanto, quando o Senhor nos chama à conversão de um pecado, não devemos ficar paralisados, nos perguntando se "podemos" ou não. Devemos simplesmente obedecer. E, ao obedecermos, reconheceremos que não foi nossa obra, mas a graça de Deus que nos capacitou.

A desculpa da "incapacidade" ("estamos mortos em nossos pecados, nada podemos fazer") é apenas meia verdade. Ela ignora a outra metade: o poder onipotente da graça de Deus. Jesus disse aos discípulos, sobre a dificuldade da salvação: "Aos homens é isso impossível, mas a Deus tudo é possível" (Mateus 19:26). Quem crê nisso não se paralisa, mas ora com fé: "Converte-me", e se levanta para obedecer.

Pense no paralítico em Marcos 2. Jesus ordena a um homem que não podia se mover: "Levanta-te". O homem não argumentou sobre sua incapacidade. Ele pensou: "Se o Senhor manda, eu devo e posso fazer". E ele se levantou. A fé na graça todo-poderosa de Deus torna a conversão possível.

Aplicação

  • Pare de usar sua fraqueza como desculpa. Quando confrontado com um pecado, não diga "eu não consigo mudar". Isso é verdade, mas é apenas metade da história. A verdade completa é: "Eu não consigo, mas Deus pode em mim". Mude sua queixa de impotência para um clamor por poder.
  • Responda ao chamado de Deus hoje. A Bíblia adverte sobre a possibilidade de endurecer o coração a ponto de a conversão se tornar impossível (Hebreus 6). Não brinque com a paciência de Deus. Se hoje você ouvir a Sua voz, não endureça seu coração. Responda imediatamente em obediência.
  • Confie no poder do Evangelho. Alguns pensam que a conversão vem pela ameaça do inferno. O medo pode produzir conformidade externa, mas não conversão genuína. O verdadeiro poder para mudar corações está no Evangelho do amor de Cristo. É a bondade de Deus que nos leva ao arrependimento.

Conclusão: A conversão contínua

A conversão não é apenas para os incrédulos. A conversão é um chamado diário para os crentes. Nesta vida, nunca estaremos livres de tropeços e quedas. A conversão diária é o processo de se levantar, confessar e voltar para o caminho.

Não podemos ter paz com o pecado. O Senhor disse ao homem curado: "Não peques mais, para que não te suceda coisa pior" (João 5:14). E Paulo pergunta: "Permaneceremos no pecado, para que a graça abunde? De modo nenhum!" (Romanos 6:1-2).

Iremos atrás da santidade, sabendo que um dia compareceremos perante o tribunal de Cristo para prestar contas. Esse pensamento solene deve nos levar a uma pergunta constante: "Será que preciso me converter disso ou daquilo... hoje?". Que o Senhor nos dê a graça de responder a essa pergunta com corações honestos e vidas transformadas.


Lista de estudos da série

1. O Evangelho: A Vitória de Deus que Redefine a Vida – Estudo Bíblico

Semeando Vida

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