Apocalipse 16.1-21 - As taças da ira - Juízos Sobre o Império Romano



Por Ray Summers

Alguns acham que esta visão é agreste e fantástica. Não é uma apresentação figurada de acontecimentos reais que os cristãos da Ásia tivessem visto; simboliza a rápida execução da ira de Deus, a desencadear-se sobre o Império Romano em desapiedada fúria.

O império ainda se mostrava forte e evidentemente não havia perigo de colapso. Mas para uma pessoa iluminada (pelo Espírito de Deus), como era João, o Estado Romano estava condenado. Assim, neste ponto o apóstolo deixa a história para trás, e paira nas alturas da imaginação, vislumbrando o futuro ainda desconhecido. (D. Smith, op. cit., p. 675) 

Quando se lhes dá permissão, os anjos voam em rápida sucessão para executar a ira de Deus sobre o grande inimigo de sua causa e de seu povo.




Há muitos pontos semelhantes entre estas pragas e as pragas anunciadas pelas trombetas. Como no caso destas, representam ais ou calamidades desencadeadas contra a natureza e contra os homens; e ainda, como no caso das trombetas, uma parte do seu simbolismo corre parelhas com as pragas do Egito. 

Mas há notáveis diferenças entre as taças e as trombetas. Os juízos das trombetas eram convites ao arrependimento; os juízos das taças são visitações do castigo, quando já passou a esperança ou a oportunidade de arrependimento. 

Os juízos das trombetas eram parciais, atingindo apenas uma terça parte do seu objetivo; os juízos das taças são finais, pois atingem o mundo por inteiro. 

Os juízos das trombetas não atingem o homem até o soar da quinta trombeta; já os juízos das taças atingem o homem desde a primeira. O simbolismo das taças e o das trombetas são paralelos. Há diferença no simbolismo da quinta de cada série, mas a coisa simbolizada é a mesma. 

À medida que as taças se vão esvaziando, vai aumentando o juízo, até que por fim atinge a cidade imperial. 

Não alcançou êxito nenhum qualquer tentativa feita para se determinar a significação especial dos objetos visitados pela ira de Deus — a terra, o mar, os rios, o sol. O que parece importante aqui é anotar apenas o efeito geral da final e vingadora ira de Deus.

As taças são agrupadas em quatro, duas, o entreato e a final (a sétima) — justamente como se dera no caso dos selos e das trombetas.





1 - A primeira taça foi derramada sobre a terra. Ela não prejudicou a terra, como se deu ao soar da primeira trombeta. Caiu sobre os homens assinalados com o nome da besta e lhes acarretou chagas fundas e malignas.

Apocalipse 16.1-2
1 - Ouvi, vinda do santuário, uma grande voz, dizendo aos sete anjos: Ide e derramai pela terra as sete taças da cólera de Deus.
2 - Saiu, pois, o primeiro anjo e derramou a sua taça pela terra, e, aos homens portadores da marca da besta e adoradores da sua imagem, sobrevieram úlceras malignas e perniciosas.

2 - A segunda taça foi esvaziada sobre o mar, e as águas se tornaram em sangue; e todas as coisas em contato com o mar pereceram.

Apocalipse 16.3
3 - Derramou o segundo a sua taça no mar, e este se tornou em sangue como de morto, e morreu todo ser vivente que havia no mar.

3 - A terceira taça foi derramada sobre os rios e as fontes das águas, que também se tornaram em sangue. Ouviu-se uma voz proclamando a justiça de Deus neste ano. Ele castiga de acordo com o pecado: uma vez que o Império tinha feito correr como água o sangue dos mártires, agora tudo que o Império encontrava para beber era apenas sangue — e merecia isso mesmo. Os juízos de Deus são retos.

Apocalipse 16.4-7
4 - Derramou o terceiro a sua taça nos rios e nas fontes das águas, e se tornaram em sangue.
5 - Então, ouvi o anjo das águas dizendo: Tu és justo, tu que és e que eras, o Santo, pois julgaste estas coisas;
6 - porquanto derramaram sangue de santos e de profetas, também sangue lhes tens dado a beber; são dignos disso.
7 - Ouvi do altar que se dizia: Certamente, ó Senhor Deus, Todo-Poderoso, verdadeiros e justos são os teus juízos.

4 - A quarta taça foi despejada sobre o sol. Este passou a castigar com seus causticantes raios e com fogo os homens maus. Mostraram-se tais homens tão pervertidos que blasfemaram o nome de Deus, em meio aos castigos recebidos, e se negaram a abandonar suas perversões.

Apocalipse 16.8-9
8 - O quarto anjo derramou a sua taça sobre o sol, e foi-lhe dado queimar os homens com fogo.
9 - Com efeito, os homens se queimaram com o intenso calor, e blasfemaram o nome de Deus, que tem autoridade sobre estes flagelos, e nem se arrependeram para lhe darem glória.

Ao passo que as quatro primeiras pragas foram dirigidas contra a natureza, mas produziam seu efeito sobre os homens, as duas pragas que vêm a seguir são derramadas particularmente sobre os homens.

5 - A quinta taça foi esvaziada sobre o trono da besta. E o reino da besta se escureceu, se fez tenebroso; e grandes dores e males sobrevieram aos habitantes do reino, que chegaram a morder suas línguas em terrível angústia. Mas, na sua perversão, não decidiram abandonar o culto aos ídolos.

Apocalipse 16.10-11
10 - Derramou o quinto a sua taça sobre o trono da besta, cujo reino se tornou em trevas, e os homens remordiam a língua por causa da dor que sentiam
11 - e blasfemaram o Deus do céu por causa das angústias e das úlceras que sofriam; e não se arrependeram de suas obras.

6 - A sexta taça derramou-se sobre o rio Eufrates. Secou-se o rio, para que se preparasse o caminho dos reis do Oriente, os maiores inimigos orientais do Império Romano.

Apocalipse 16.12
12 - Derramou o sexto a sua taça sobre o grande rio Eufrates, cujas águas secaram, para que se preparasse o caminho dos reis que vêm do lado do nascimento do sol.


As Três Rãs: Satã Recrutando Agentes ou Aliados
Este entreato é colocado, na visão, entre os símbolos seis e sete, justamente como se dera nas outras visões. 

Quando se esvaziou a sexta taça, abriu-se o caminho para a vinda dos Partos, inimigos de Roma. Isto é símbolo da aguerrida hoste nas mãos de Deus para batalhar contra Roma. Quando os três aliados das forças malignas veem esta possibilidade, entendem que devem sem demora reunir os reis da terra para derrotar os Partos (persas).

Apocalipse 16.13-16
13 - Então, vi sair da boca do dragão, da boca da besta e da boca do falso profeta três espíritos imundos semelhantes a rãs;
14 - porque eles são espíritos de demônios, operadores de sinais, e se dirigem aos reis do mundo inteiro com o fim de ajuntá-los para a peleja do grande Dia do Deus Todo-Poderoso.
15 - (Eis que venho como vem o ladrão. Bem-aventurado aquele que vigia e guarda as suas vestes, para que não ande nu, e não se veja a sua vergonha.)
16 - Então, os ajuntaram no lugar que em hebraico se chama Armagedom.

João vê que surgem no cenário três espíritos imundos na forma de rãs. Saíram da boca do dragão, da boca da primeira besta e da boca da segunda besta, que é aqui chamada o falso profeta. Não se usa nenhum verbo para dizer como eles apareceram. O grego apenas diz: "Vi fora da boca do dragão..."

Dana acha que as rãs foram vomitadas. (Dana, The Epistles and Apocalipse of John, p. 141) Swete acha que foram exaladas — o fôlego dos três aliados se transformou em rãs. (Swete, op. cit., p. 207) A asquerosidade do quadro nos inclina a adotar a ideia de Dana. A ideia de se exalar más influências certo levará alguém a preferir a interpretação de Swete. Talvez não faça diferença.

Estas três rãs são chamadas espíritos de demônios, enviados pelos três aliados malignos para enganar os reis do mundo e fazê-los tomar o partido de Roma, para a batalha que se aproxima. 

Conseguem êxito na sua empreitada de seduzir e enganar, e reúnem os reis todos num campo de batalha, um lugar de nome "Armagedom". Só se trava a batalha quando chegamos ao capítulo 19.

Este é o simbolismo. Qual o significado? Os futuristas (Larkin, op. cit., p. 144 em diante.) não encontram dificuldade. Não veem necessidade alguma de interpretar o Armagedom, que, para eles, é o fecho da História Universal e assegura o trono de Deus para si.

Mas nem os futuristas nem os adeptos do método da continuidade histórica apresentam um significado que tivesse algum sentido e algum conforto para aqueles primitivos cristãos — os que realmente mais precisavam duma mensagem assim — os perseguidos cristãos da Ásia Menor.

O último grupo de intérpretes, agora referido, aplica o quadro à apostasia da Igreja Católica Romana. (Para um exemplo, veja Barnes, in loco.) Assim, para eles, o secar do Eufrates representa o ensino opositor da Reforma, que fez cessar o manancial do ensino católico romano.

As três rãs são: primeira, a declaração do Concílio de Trento; segunda, a declaração do Concílio do Vaticano; terceira, as encíclicas papais, particularmente aquelas que completam o sistema mariolátrico. A batalha é a luta entre o catolicismo e a Igreja Verdadeira.

Como poderia uma interpretação destas ter algum significado e algum conforto para os cristãos do primeiro século, aos quais foi primeiramente dirigido o livro do Apocalipse?!

Este parágrafo é muito simbólico. Retrata o diabo, o imperador e a concilia congraçando seus exércitos para dar combate aos exércitos da justiça.

As três rãs talvez simbolizem alguma forma de propaganda maligna, visto que saem das bocas dos três aliados. São a progênie do diabo, do governo ateu e da religião falsa. São os verdadeiros inimigos de Cristo.

A religião verdadeira não tem inimigo pior, e Satã não tem melhor aliado do que a falsa propaganda. 

Desde as testemunhas que resistiram a Moisés diante de Faraó, passando por estes produtos do século primeiro, como Simão, o mago, até nossos dias, sempre têm surgido aqueles que pretenderam operar sinais que a credulidade da época atribuía a influências sobre-humanas.

Assim, estes agentes recrutadores de Satã operam sinais (uma concepção caracteristicamente Joanina do milagre) para ganhar adeptos. Retrata-se aqui a ânsia de galgar o poder e também a mordacidade da falsa religião, em seus esforços para se fortalecer. Por detrás deles está o diabo, que os incentiva.

Deve ter havido muitas ocasiões em que as nações se deixaram dominar por uma grande paixão pela guerra, coisa que os historiadores dificilmente explicam. Um desses conflitos é agora aqui retratado, mas trata-se mais duma guerra espiritual que material.

Os tais aliados congregam seus exércitos num certo campo de batalha chamado Armagedom. Este fora um famoso campo de batalha dos hebreus. 

Lá Gideão e seus trezentos derrotaram os midianitas. Lá o rei Saul fora batido pelos filisteus. Também lá Baraque e Débora sobrepujaram as hostes do rei cananeu Jabim. Lá Acazias morreu pelas setas de Jeú. E lá ainda Faraó Neco desbaratou a Josias.

Tal lugar era como um fogo a queimar dia e noite o coração e a memória do povo judeu, e a lamentação por Josias no vale do Megido era sempre lembrada como um exemplo típico de luto nacional. Assim, Megido simbolizava muito bem a angustiosa situação universal da retidão e do mal empenhados numa batalha de vida ou morte.

Esta guerra não é travada com espadas ou lanças materiais, não. Esta batalha está ligada a todos os ensinos do Novo Testamento, aos ideais sustentados por Jesus, a sua morte na cruz e a todos os divinos propósitos da graça.

O caminho de Jesus nunca foi o da espada material. Sua espada é a espada do Espírito — a Palavra de Deus. Se alguém achar que aqui se trata duma batalha literal ou material, devemos esperar que ele admita que o exército do mal seja comandado por um quartel-general composto de três rãs!

É claro que esta visão é simbólica, e nada aqui é literal. Não há motivo para se achar que uma destas figuras seja simbólica e a outra literal. Este lugar — Armagedom — de que nos fala o Apocalipse não se encontra no mapa de nenhuma nação da terra. É um lugar que se relaciona com a lógica do contexto, e não com o espaço.

Nesta batalha o que vai decidir o resultado não são os armamentos materiais ou físicos; ela se trava entre a retidão e o mal, e da retidão certamente é a vitória.



7 - A sétima taça é agora esvaziada, e se afirma que todas as forças do mal não conseguem derrotar a causa da justiça. Quando o conteúdo da taça foi despejado no ar, ouviu-se uma voz vinda do trono no templo, a qual dizia: "Está feito" (tempo perfeito).

Com esta prestação final da ira de Deus, houve manifestações dessa ira — trovões, relâmpagos, vozes e um terremoto; a imperial cidade de Roma fendeu-se em três partes. Este número divino indica que a operação divina subverteu a cidade. Babilônia (aqui Roma) era tida e havida como o supremo poder mundial antidivino. (Moffatt, op. cit., p. 449)

Apocalipse 16.17-21
17 - Então, derramou o sétimo anjo a sua taça pelo ar, e saiu grande voz do santuário, do lado do trono, dizendo: Feito está!
18 - E sobrevieram relâmpagos, vozes e trovões, e ocorreu grande terremoto, como nunca houve igual desde que há gente sobre a terra; tal foi o terremoto, forte e grande.
19 - E a grande cidade se dividiu em três partes, e caíram as cidades das nações. E lembrou-se Deus da grande Babilônia para dar-lhe o cálice do vinho do furor da sua ira.
20 - Todas as ilhas fugiram, e os montes não foram achados;
21 - também desabou do céu sobre os homens grande saraivada, com pedras que pesavam cerca de um talento; e, por causa do flagelo da chuva de pedras, os homens blasfemaram de Deus, porquanto o seu flagelo era sobremodo grande.

Assim também Deus a considerou, e o seu poder destruidor se mostrou tão eficaz que o terremoto arrasou as montanhas e fez submergir as ilhas, que eram as fortalezas de Roma.

Pedras do peso de um talento (cem libras) caíram sobre os homens, que, mesmo assim, continuaram a blasfemar contra Deus, acusando-o como o responsável por essas calamidades — um quadro que pinta muito bem o juízo de Deus.

Aqui, como noutras passagens, notamos as três coisas que acarretaram a destruição de Roma: [1] as calamidades naturais, [2] a deterioração interna e a [3] invasão externa. Roma estava condenada. 

Assim João retrata o juízo de Deus sobre os opressores do seu povo. Não adiantara nada àqueles aliados enviar pelo mundo as suas rãs recrutadoras, pois que o poderio divino os fez, a Roma e a eles, em pedaços.

Quando João viu o terremoto e aquelas gigantescas pedras se reunirem para esmagar e despedaçar Roma, um dos sete anjos, empenhado em ministrar a vingadora ira de Deus, convidou João a subir a um outro ponto de observação, para presenciar de lá em detalhes o que ele acabava de ver na rápida destruição da cidade.

O que ele viu abrange toda a última cena da batalha entre as forças do bem e as forças do mal. Devemos fugir aqui à tentação de entrelaçar os assuntos desta seção (17:1 a 20:10) com um programa um tanto fantasticamente escatológico.

Isto se tem feito não poucas vezes, com inteira perda de tempo e energias, torcendo-se ainda os verdadeiros ensinos das Escrituras. 

Estas cenas não constituem um quadro de acontecimentos relacionados que visem a satisfazer nossa curiosidade acerca do futuro. Todos nós, é verdade, somos um bocado curiosos, e alguns controlam sua curiosidade melhor que outros.

Estas visões foram apresentadas com o propósito de anunciar a promessa da ulterior e final vitória da retidão sobre todas as forças do mal. Esta era a sua mensagem aos cristãos da Ásia Menor pelo ano 95 de nossa era. Ela lhes assegura a indiscutível vitória do cristianismo sobre Roma.

De maneira semelhante, ela nos assegura também em nossos dias que a Causa de Cristo triunfará sobre a causa do mal em todas as épocas.

Neste sentido, o método de interpretação conhecido como o método da filosofia da história está certo. A visão nos é facultada sob o simbolismo de vários atos que pintam a queda de Roma.

ÍNDICE

26 - A exultação dos redimidos - Apocalipse 15.1-8
27 - As taças da ira - Apocalipse 16.1-21

Semeando Vida

Profundidade Teológica e Orientação Espiritual para Líderes e Estudiosos da Fé

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