Apocalipse 11.1-19 - A medição do templo, as testemunhas, conflito e vitória no Cristianismo Primitivo


Por Ray Summers 

A medição do templo é o terceiro símbolo do entreato. Foi dada a João uma vara de medir, e se lhe ordenou que medisse o templo, o altar e os adoradores. Não seria medido o átrio exterior, visto ter sido dado às nações, e a Cidade Santa seria pisada por quarenta e dois meses.

Apocalipse 11.1-2
1 - Foi-me dado um caniço semelhante a uma vara, e também me foi dito: Dispõe-te e mede o santuário de Deus, o seu altar e os que naquele adoram;
2 - mas deixa de parte o átrio exterior do santuário e não o meças, porque foi ele dado aos gentios; estes, por quarenta e dois meses, calcarão aos pés a cidade santa.

Isto não quer dizer que o Templo de Jerusalém estivesse ainda de pé, nem que seria restaurado antes do fim do mundo e da segunda vinda de Cristo.

A linguagem aqui, como quase em todo o Apocalipse, é puramente simbólica. O Templo seria medido como prova de cuidado e preservação especiais. (Ver Zacarias 2.2)

O significado do simbolismo aqui é este: o verdadeiro Israel seria protegido e preservado por Deus durante as perturbações que estavam por vir. É, portanto, uma visão de conforto e consolação para os que são de Deus, em contraste com a ameaçadora condenação de seus opressores. 

A grande massa do mundo gentílico, dominada por Roma perseguidora, sofreria bastante. Isto está aí simbolizado pelo fato de não se medir o átrio dos gentios para proteção. Diz-se que esse período de aflições duraria quarenta e duas semanas.

Em números redondos, isto quer dizer três anos e meio. Três e meio era o número indefinido. Simboliza incerteza, inquietação, desordem, cujo ponto crítico é para o bem ou para o mal. 

Assim, aqui está realizada a proteção de Deus sobre os seus durante um tempo indefinido de desordens e aperturas, enquanto o povo em geral permanecesse sob o poder da Roma pagã; contudo, não seria assim para sempre. Haverá uma crise. E Deus vai providenciar tudo.

Apocalipse 11.1-19
3 - Darei às minhas duas testemunhas que profetizem por mil duzentos e sessenta dias, vestidas de pano de saco.
4 - São estas as duas oliveiras e os dois candeeiros que se acham em pé diante do Senhor da terra.

Estas duas testemunhas têm sido interpretadas de diversos modos. Larkin, representando a escola futurista, interpreta literalmente. (Larkin, op. cit., p. 84 em diante) 

Acha que devem ser homens que serão testemunhas no fim do mundo. Terão poderes sobrenaturais e gozarão da proteção divina por algum tempo. Em seguida, serão mortos pelos representantes do dominante Anticristo; mas, depois de três dias e meio, serão novamente trazidos à vida. 

Ele (Larkin) então acha que se trata de Moisés e Elias; e explica que, segundo Malaquias 4:5 e 6, Elias vai voltar como arauto do grande e terrível dia do Senhor. Isto não se teria cumprido em João Batista, diz Larkin, porque ele só anunciou a primeira vinda de Cristo e os julgamentos. 

Ele foge às afirmativas de Cristo em Mateus 17:11-13 e 11:1-14, de que João era Elias, achando que Jesus quis significar com essa expressão que João seria Elias, se o mundo recebesse o Reino; o mundo rejeitou a Jesus e ao Reino, portanto, João não era Elias! 

Vê-se que não podemos tomar a sério interpretações como esta. A questão principal aqui é: Que conforto ou animação poderia levar aos cristãos perseguidos do tempo de João o saber que dali a vários milhares de anos aqueles eventos aí descritos seriam gloriosa realidade?

É claro que nenhum conforto ou consolo. Tal mensagem não teria significado algum para eles, e muito menos conforto.

Carroll, representando a escola de interpretação histórica contínua, acha que esta visão se aplica à apostasia da Igreja no escuro período que vai do terceiro século até a Reforma. (Carroll op. cit., p. 150 em diante)

Ele segue o método de interpretação do ano-dia, que toma os 1.260 dias dos três anos e meio por 1.260 anos, assim abrangendo do fim do terceiro século até o século da Reforma.

As duas testemunhas, para ele, são a verdadeira igreja e o pregador que nunca cessa de dar seu testemunho no correr desse escuro período. A mesma questão, então, aparece como surgiu ante a interpretação literal. Que conforto os cristãos do tempo de João encontrariam nesta interpretação?

Eles estavam precisando de algo que os confortasse imediatamente nos seus dias. Eles nada sabiam, e nem estavam cuidando de saber da apostasia da Igreja Católica do Ocidente, nem da apostasia da Igreja Católica Grega do Oriente. 

Eles conheciam, sim, e muito bem, uma igreja combatida e perseguida de seus próprios dias, que estava necessitando, e muito, de alguma coisa que lhes desse a certeza do auxílio e da fortaleza que vêm de Deus. Nenhuma dessas suas interpretações referidas corresponderia as suas necessidades.

O critério certo a ser adotado a cada passo, para se descobrir a mensagem de João, deve ser este: Que significado teria para os cristãos dos dias de João esta mensagem?

Ele estava escrevendo num tempo de suprema e urgente necessidade. A mensagem dele, certo, seria um grande esforço seu no sentido de atender àquela necessidade. E é desse ponto de vista que devemos encarar esta passagem bíblica. 

Quando encarada do ponto de vista adequado, nota-se que esta visão faz parte do entreato colocado entre o sexto e o sétimo símbolos duma série.

Este entreato consta de quatro partes; as outras três partes são claramente imagens apocalípticas. Também devem ser encaradas como predições mais simbólicas do que literais. 


E, que simbolizam?

O número 2, no simbolismo oriental, traz a ideia de fortaleza — dois homens são muito mais fortes que um. Desse modo, as duas testemunhas aqui surgem para simbolizar um testemunho, ou testemunha, de grande poder. (Dana, kiddle, Richardson, Pieters, D. Smith, Hengstenberg Swete)

Parece, então, que, com isso, Deus está a dizer: "Estai certos de que, embora o mundo em que ora viveis esteja dominado por homens maus, vós sereis protegidos e o evangelho será pregado; o testemunho cristão será mantido firme." 

Cada palavra aqui empregada para descrever as duas testemunhas e a função delas mostra que João está escrevendo de modo alusivo, indireto.

 A tarefa da Igreja é a publicação universal do evangelho; isto será levado avante, ainda quando os adversários não o queiram. As testemunhas representam o espírito militante dos verdadeiros cristãos e o testemunho deles.

Esta visão naturalmente se divide em três partes, nas quais está refletido o notável progresso do evangelho durante a era apostólica.

Primeira, é o período em que se pregou o evangelho com admirável sucesso. Ele foi atestado por evidentes provas divinas, como aquelas que se viram nos milagres operados pelos apóstolos.

Este período está simbolizado nos versículos 4, 5 e 6, que nos falam de duas testemunhas que possuem o poder divino; parece que nada as pode destruir, e têm poder de operar milagres no mundo material, como têm, igualmente, o poder de trazer males sobre quantos os hostilizam. 

Apocalipse 11.4-6
4 - São estas as duas oliveiras e os dois candeeiros que se acham em pé diante do Senhor da terra.
5 - Se alguém pretende causar-lhes dano, sai fogo da sua boca e devora os inimigos; sim, se alguém pretender causar-lhes dano, certamente, deve morrer.
6 - Elas têm autoridade para fechar o céu, para que não chova durante os dias em que profetizarem. Têm autoridade também sobre as águas, para convertê-las em sangue, bem como para ferir a terra com toda sorte de flagelos, tantas vezes quantas quiserem.
Segunda, é o tempo em que aparece um poder que tenta destruir o testemunho do evangelho.

Consegue êxito temporário, e, nessa época em que se escreveu este livro, o evangelho passa pelo período de crise. Parece que o Império Romano estava prestes a esmagar o cristianismo e, a seguir, regozija-se sobre os seus destroços. Isto é simbolizado nos versículos de 7 a 10. 

Apocalipse 11.7-10
7 - Quando tiverem, então, concluído o testemunho que devem dar, a besta que surge do abismo pelejará contra elas, e as vencerá, e matará,
8 - e o seu cadáver ficará estirado na praça da grande cidade que, espiritualmente, se chama Sodoma e Egito, onde também o seu Senhor foi crucificado.
9 - Então, muitos dentre os povos, tribos, línguas e nações contemplam os cadáveres das duas testemunhas, por três dias e meio, e não permitem que esses cadáveres sejam sepultados.
10 - Os que habitam sobre a terra se alegram por causa deles, realizarão festas e enviarão presentes uns aos outros, porquanto esses dois profetas atormentaram os que moram sobre a terra.

A besta, símbolo de Roma encarnada no imperador, guerreou contra as testemunhas e fez estacar o seu notável trabalho. Foram mortas e, para gritarem indignos hurras sobre elas, deixaram insepultos os seus corpos, a fim de que todo o povo pudesse contemplá-los boquiaberto. 


O mundo, contra quem as duas testemunhas haviam pregado, fez grandes festas, e houve grande regozijo e congratulações de parte a parte, porque se haviam tirado da frente de seus passos as duas testemunhas e estas não molestariam mais os homens do mundo.

Não é preciso ter imaginação muito viva para se perceber nesta figura a atitude do Império Romano no período em que pareceu que de fato o cristianismo acabaria esmagado, para nunca mais se levantar.

Terceira, é o período do progresso do evangelho que veio provar que Roma se enganara fazendo pouco caso do poderio de Deus.

O poder divino levou Roma à derrota e possibilitou à mensagem redentora do evangelho viver e sobreviver triunfante. Este período é simbolizado nos versículos 11,12 e 13, período que estava já mui próximo dos cristãos do tempo de João.

Apocalipse 11.11-13
11 - Mas, depois dos três dias e meio, um espírito de vida, vindo da parte de Deus, neles penetrou, e eles se ergueram sobre os pés, e àqueles que os viram sobreveio grande medo;
12 - e as duas testemunhas ouviram grande voz vinda do céu, dizendo-lhes: Subi para aqui. E subiram ao céu numa nuvem, e os seus inimigos as contemplaram.
13 - Naquela hora, houve grande terremoto, e ruiu a décima parte da cidade, e morreram, nesse terremoto, sete mil pessoas, ao passo que as outras ficaram sobremodo aterrorizadas e deram glória ao Deus do céu.

O simbolismo mostra a restauração da vida das duas testemunhas. Revivendo, após os três dias e meio em que pareciam mortos, segue-se um indefinido período de perturbação e desordem, chegando os próprios inimigos do povo de Deus a reconhecer que foi o poder divino que trouxe tudo aquilo. 




Acabam vitoriosas as duas testemunhas, e a verdade da mensagem delas é vingada, quando os inimigos veem os cristãos libertados pelo poder de Deus. Em ligação com isto, há uma tal demonstração do poder divino, que muitos são levados a reconhecer a Deus e a dar-lhe glória. 

Isto também foi o que se deu na vitória do cristianismo sobre suas perseguições durante o reinado de Domiciano. Quando o cristianismo surgiu vitorioso daquela sangrenta provação, muitos foram levados a abraçar o cristianismo.

Assim termina o entreato, uma mensagem da retribuição divina. Não haverá mais delongas. A divina mensagem de julgamento está já a ser proclamada em toda a sua crueza e amargura.

O povo de Deus é conhecido dEle e gozará de sua proteção. Haverá um testemunho mui forte a favor do evangelho durante esse período de desordens, que está próximo. Quando passar tudo, o cristianismo estará totalmente vingado aos olhos dos mortais.


A sétima trombeta, de transição: o pacto de Deus

No fim da sexta trombeta foi estatuído que duas visões de natureza consoladora apareceriam antes da seguinte visão geral.

Uma dessas visões consoladoras foi o entreato (10:1 a 11:13),que confortou os cristãos, trazendo-lhes a certeza da justa retribuição de Deus sobre aqueles que os estavam perseguindo.

A segunda é esta visão da arca do concerto, que é uma transição e conduz à visão seguinte. No versículo 14 anuncia-se o terceiro ai, que é introduzido pela arca do concerto e abrange as forças destruidoras que vêm a seguir, começando com o capítulo 12.

Apocalipse 11.14-19
14 - Passou o segundo ai. Eis que, sem demora, vem o terceiro ai.
15 - O sétimo anjo tocou a trombeta, e houve no céu grandes vozes, dizendo: O reino do mundo se tornou de nosso Senhor e do seu Cristo, e ele reinará pelos séculos dos séculos.
16 - E os vinte e quatro anciãos que se encontram sentados no seu trono, diante de Deus, prostraram-se sobre o seu rosto e adoraram a Deus,
17 - dizendo: Graças te damos, Senhor Deus, Todo-Poderoso, que és e que eras, porque assumiste o teu grande poder e passaste a reinar.
18 - Na verdade, as nações se enfureceram; chegou, porém, a tua ira, e o tempo determinado para serem julgados os mortos, para se dar o galardão aos teus servos, os profetas, aos santos e aos que temem o teu nome, tanto aos pequenos como aos grandes, e para destruíres os que destroem a terra.
19 - Abriu-se, então, o santuário de Deus, que se acha no céu, e foi vista a arca da Aliança no seu santuário, e sobrevieram relâmpagos, vozes, trovões, terremoto e grande saraivada.

Quando a sétima trombeta soou, um exército de vozes celestiais declarou: "Os reinos do mundo vieram a ser de nosso Senhor e do Seu Cristo, e Ele reinará para todo o sempre." Este é um cântico de vitória e regozijo. Dias escuros e difíceis tinham sobrevindo, mas Cristo saíra vitorioso. 

No conflito dos cristãos com o mundo, iniciando-se com o capítulo 12, virão dias ainda mais escuros. Anuncia-se o resultado da luta antes de se começar a pintar o duro conflito.

O resultado é a vitória de Cristo. Para confortar os cristãos antes de começar o conflito, Deus mostra a arca do seu concerto no templo celestial. Isto simboliza que Deus não se esqueceu do Seu povo, nem do Seu pacto com eles. 

A Igreja entrará em luta brava com o mundo, a perseguição satânica rugirá alto, mas o pacto que Deus fez com seu povo está de pé e firme. Eles — os cristãos — sairão vencedores.

Este é de fato um modo mui encorajador de introduzir a visão do conflito. O periodismo moderno lança mão deste mesmo método ao reportar a história de alguma grande batalha. 

Um cabeçalho nos dá a certeza da vitória de nossos exércitos, nesta ou naquela batalha; a seguir, vem a reportagem das ações bélicas.

Muitas vezes parece que o inimigo está por cima e vai acabar vencendo; mas de qualquer forma sabemos que a vitória é nossa, porque já lemos o cabeçalho anunciando o nosso triunfo. João lançou mão deste expediente muitas vezes no livro do Apocalipse — e sempre de modo mui eficaz.


ÍNDICE

21 - O anúncio da desforra - Apocalipse 10.1-11
22 - A medição do Templo e as duas testemunhas - Apocalipse 11.1-19

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