Texto básico: João 4.19-42
Introdução
Consideremos duas coisas: o mundo contemporâneo é predominantemente urbano e são muitas as pessoas que estão distantes da salvação. Diante disso e levando-se em consideração que espaço urbano é o lado de fora dos espaços religiosos, especialmente o espaço público, como podemos dar o nosso testemunho cristão nele?
É sobre isso que vamos refletir neste estudo. É no espaço urbano que são oferecidas mais oportunidades para variados contatos humanos. Quando passou pela província de Samaria, Jesus nos deu o exemplo de como podemos agir em lugares assim.
I. O evangelismo pessoal
O texto apresenta uma rica e longa conversa entre o Senhor Jesus Cristo e aquela que ficou conhecida como a mulher samaritana.
Os versículos anteriores narram que, indo da Judéia à Galiléia, passando por Samaria, estando já cansado da viagem, o nosso Salvador parou próximo ao poço de Jacó por volta do meio-dia.
A partir daí segue-se uma rica narrativa da qual destacamos alguns aspectos que hão de nos auxiliar na reflexão sobre o evangelismo pessoal.
A. Usando o espaço urbano
É no espaço urbano que deparamos com muitas pessoas desconhecidas todos os dias, nos mais diferentes lugares: no ônibus, no metrô, no trem, nas ruas, avenidas, praças, etc.
Passamos diariamente por muita gente, sem muitas vezes nos dar conta de que podemos aproveitar situações simples do cotidiano para apresentar o evangelho a alguém.
Nesse episódio a evangelização não ocorreu em um ambiente eclesiástico, em meio a um estudo bíblico formal, durante uma pregação em um culto ou numa hora previamente marcada para isso.
O nosso Senhor aproveitou uma oportunidade comum do dia a dia e anunciou o evangelho à mulher que estava próxima a ele, junto ao poço de Jacó.
A vantagem desse tipo de trabalho é que ele tanto pode ser programado (horário e local), como pode ser sem planejamento prévio, como aconteceu nesse caso; contudo, sempre precisará da disposição para aproveitar as oportunidades de "pregar o evangelho a toda criatura" (Mc 16.15).
B. Estabelecendo um contato
O Senhor Jesus abordou a mulher samaritana a partir de algo trivial. Sendo já a sexta hora desde que o sol havia nascido, ou seja meio-dia, um pouco de água fresca seria muito bom.
A mulher, então, estranhou aquele pedido pelo fato dela ser mulher e ainda mais de Samaria, uma região de inimizade histórica com os judeus.
A partir desse primeiro contato Cristo lhe anuncia o evangelho. O Senhor nos ensina que é necessário estabelecermos contato com as pessoas, se quisermos que alguém seja salvo pelo evangelho.
Para que isso ocorra é necessário quebrarmos barreiras e preconceitos (v. 27), muitas vezes impostos pela sociedade ou pela própria comunidade religiosa (Mc 2.17).
É preciso que nos aproximemos das pessoas, lembrando que em nada somos melhores do que elas (Rm 3.10,23). O que nos diferencia é que nós já experimentamos a graça especial de Deus (Ef 2.8,9). Agora devemos olhar para os outros pecadores com pessoas que também a podem experimentar.
C. Apresentando o evangelho
Depois de vencida a barreira, o Senhor Jesus; aproveitou a própria conversa sobre água e sede para apresentar o evangelho à mulher samaritana, inicialmente através de metáforas relacionadas ao teor do diálogo que vinham tendo, mas depois de maneira mais explícita.
Do teor da conversa, nós conseguimos extrair a essência do evangelho. Cristo falou à samaritana sobre as necessidades espirituais dela (vs.10-15), as quais só ele poderia satisfazer. Tais carências são consequências do pecado sobre os seres humanos (Rm 3.23).
Jesus também comentou com essa mulher sobre as suas deficiências morais (vs.16-18), mostrando que é preciso que as pessoas se reconheçam pecadoras para receber o perdão de Deus (Lc 18.9-14).
O Filho de Deus anunciou à mulher samaritana a necessidade de ela expressar uma fé sincera e confiante no Deus que a Bíblia apresenta, através de uma adoração bíblica ao Senhor (vs. 19-24).
Por fim, Jesus apresentou-se como o Messias (vs.25,26), finalizando o ciclo básico da evangelização, o qual culminou na apresentação bíblica de Cristo como o Deus encarnado (Jo 1.14), o único caminho de acesso a Deus (Jo 14.6), a promessa de Deus para a salvação de pecadores (At 4.12), aquele que supre as nossas reais necessidades e sadias expectativas pela fé na sua obra (Rm 3.22-26; Jo 3.36) na cruz (Cl 1.22; IPe 2.24), morrendo em nosso lugar (G13.13; 1 Pe 3.18), para nos assegurar o perdão e a glorificação final (Jo 6.44).
O arrependimento dos pecados e a fé confiante na obra de Cristo na cruz são os meios que Deus usa para comunicar a graciosa salvação que ele concede. Toda pessoa que quiser evangelizar alguém deve buscar ser instrumento de Deus para levar outros ao arrependimento e à fé (Mc 1.15; At 20.21; Jo 20.31).
II. A visão evangelística
Nos versículos restantes, o texto nos ensina sobre a necessária visão evangelística que os seguidores de Cristo precisam ter. Acompanhemos o desenrolar da narrativa bíblica, da qual destacamos alguns aspectos dessa ótica redentora.
A. A necessidade da persuasão
A continuação da narrativa bíblica nos afirma que, enquanto os discípulos do Senhor Jesus o questionam sobre a conversa com aquela mulher samaritana, ela foi à cidade de Samaria anunciar aos seus concidadãos que havia se encontrado pessoalmente com o Messias. Em resposta animada a essa mensagem, muitos saíram da cidade e foram verificar pessoalmente sobre quem ela ouvira (vs.27-30).
Curiosamente, o texto nos apresenta os discípulos de Cristo incomodados com a conversa evangelística que o Senhor Jesus teve com aquela mulher, ao passo que ela, que acabara de descobrir que Jesus era o Cristo, já estava anunciando o evangelho aos outros (vs.29,41), tendo sido um instrumento real para levar outros samaritanos à fé.
A atitude da mulher pode revelar uma visão evangelística plena e saudável, expressa pela prática efetiva da evangelização, que não é apenas falar do evangelho ou sobre ele, quase que para cumprir uma obrigação. Mais do que isso, evangelizar é insistir e argumentar da melhor maneira possível, procurando levar as pessoas a crerem biblicamente no Filho de Deus (At 18.4; 19.8).
Tal prática não é um apelo humano em lugar da ação divina, mas é uma responsabilidade humana sob a confiança na ação divina, como se Deus mesmo exortasse os pecadores por nosso intermédio (2Co 5.18-20). Deus usa instrumentos humanos.
Enquanto a mulher samaritana ia anunciar o evangelho aos seus concidadãos, o Senhor Jesus explicava aos seus discípulos sobre a responsabilidade instrumental que cada cristão tem de, obedecendo à ordem divina de anunciar o evangelho, recolher para o reino de Deus aqueles que o Senhor mesmo já preparara.
O nosso senhor começou dizendo que a sua satisfação mais profunda era obedecer a Deus (vs.31-34).
Em seguida, ele alertou os seus discípulos para o fato de que os campos já estavam prontos para a ceifa e os frutos aos quais ele se referia seriam eternos (vs.35,36).
Por fim, ele ressaltou os trabalhos distintos do semeador e do ceifeiro, lembrando-lhes que eles haviam sido enviados para colher os frutos preparados (vs.37,38).
Os discípulos de Cristo pareciam preconceituosos demais, a ponto de não conseguir ver as oportunidades para a evangelização, nem entender que Deus mesmo já havia preparado as pessoas para serem salvas, restando aos seus seguidores cumprirem com as suas responsabilidades de colhedores dos frutos maduros (Rm 10.13-15).
Pois bem, a realidade continua a mesma, pois desde a vinda de Cristo, Deus vem preparando diversas pessoas pelo mundo afora para receberem o evangelho, e cabe a cada cristão ver-se como um vocacionado para levar as pessoas a Cristo, procurando efetivamente os frutos que Deus já preparou (Jo 10.16; At 18.9,10).
Não enxergar o fato de que há pessoas preparadas para serem alcançadas é cair na mesma miopia daqueles discípulos, que cegos para isso, estavam tomando mais uma lição de doutrina do próprio Senhor, enquanto a recém-convertida mulher samaritana já estava alcançando outras pessoas para Deus, como nos mostra os versículos 39 a 42.
Enfim, percebemos que a correta visão evangelística é aquela que leva o cristão a perceber que a sua própria responsabilidade pessoal de persuadir os pecadores a que se arrependam dos seus pecados e creiam exclusivamente na pessoa e obra de Cristo para a sua salvação está sob a absoluta vontade soberana de Deus.
Além disso, é preciso que saibamos aproveitar as oportunidades para testemunharmos da Palavra de Deus em ocasiões e lugares diversos (At 20.17-21).
Por outro lado, não se deve pensar que o testemunho cristão está restrito a um recinto sagrado, numa ocasião de culto.
É necessário que se amplie o número de cristãos que efetivamente testemunhem sobre a sua fé, o que é muitíssimo diferente de simplesmente convidar alguém para ir à igreja no domingo à noite, para ouvir o pastor. Se cada cristão praticasse a sua vocação nesse sentido (At 1.8), o evangelho se espalharia abundantemente sobre toda a terra (At 8.4).
III. Sugestões evangelísticas para o espaço urbano
Agora veremos algumas propostas de atividades evangelísticas para serem desenvolvidas no espaço urbano. Estas são apenas sugestões a serem observadas de acordo com o interesse, a disponibilidade e a viabilidade de cada igreja local, além do evangelismo pessoal individual e natural conforme vimos neste estudo.
Aqui apresentamos algumas propostas por entendermos que também é necessário oferecer certa estrutura organizada que estimule e facilite a tarefa de evangelização por parte dos membros das igrejas.
1. Evangelismo de casa em casa
Consiste em mobilizar os crentes para visitarem os lares nas redondezas da igreja, apresentando-se, colhendo motivos de oração, convidando para atividades especiais no templo e, com a devida permissão, pregando o evangelho. Esta é uma estratégia possível para iniciar um trabalho onde não haja nenhuma família de crentes.
2. Programas evangelísticos nas casas
Consiste em realizar cultos com ênfase evangelística nos lares dos crentes ou, preferencialmente, nos lares de não-crentes que abrirem as suas portas. Nesses casos deve-se ter um cuidado especial para expor o evangelho com simplicidade, numa linguagem acessível a todos, assim como deve haver preocupação em se dar atenção aos não-cristãos, que costumam ser esquecidos.
3. Programas evangelísticos ao ar livre
Podem acontecer em praças ou ruas. Contudo, deve-se obter antecipadamente a permissão oficial das autoridades competentes para fazê-lo. Depois, é preciso divulgar a programação na vizinhança e deixar toda a infraestrutura preparada com antecedência. Dependendo do que se queira fazer, dá bastante trabalho, mas é uma alternativa ainda válida, quando bem planejada e realizada com prudência.
4. Evangelização em escolas
Deve-se entrar em contato com as diretorias das escolas para oferecer atividades especiais com os alunos, que variam desde apresentações teatrais, musicais, filmes até palestras e outras maneiras de comunicar o evangelho. Também há escolas que abrem as salas de aula a pessoas devidamente qualificadas teológica e pedagogicamente para ministrarem aulas de educação religiosa. Sendo uma escola leiga, é necessário haver prudência para não configurar proselitismo ou discriminação religiosa, devendo-se ater ao simples e poderoso evangelho.
5. Impactos evangelísticos
Consistem em atividades diversificadas, através das quais se pode comunicar o evangelho, tais como grupos musicais que apresentem uma cantata evangelística (há shopping centers que aceitam apresentações de conjuntos corais na época do Natal ou na Páscoa, por exemplo), peças teatrais ou filmes (como o mundialmente conhecido Jesus, inicialmente editado pela Cruzada Estudantil e Profissional para Cristo). Tais atividades podem acontecer tanto em lugares abertos, como em praças e ruas, assim como em ambientes fechados, tais como ginásios, quadras esportivas, etc.
6. Ações globais
Consistem em uma série de atividades paralelas ocorrendo em uma localidade, sediadas em um ambiente que aceite fazê-las, como uma escola ou mesmo a própria igreja.
As atividades são compostas de palestras de utilidade pública (alimentação saudável, economia doméstica, prevenção de doenças, etc.), serviços gratuitos (corte de cabelo, medição de pressão arterial, consultas médicas e/ou odontológicas, etc.), recreação para adultos e crianças (brincadeiras de salão, teatro, gincana, etc.), e também atividades evangelísticas (evangelização pessoal ocorrendo paralelamente na vizinhança, cantatas, teatros, filmes), encerrando com um culto evangelístico.
Para essas atividades também são necessários os contatos prévios, anunciando na vizinhança o que vai ocorrer. Igualmente fundamental, como no estudo anterior, é necessário poder contar com um grupo de crentes dispostos a acompanharem posteriormente os interessados em aprender sobre o evangelho, para um curso bíblico, comumente conhecido como discipulado, sem o qual pouco resultado permanente será verificado.
Sobre tudo isso, contudo, lembramos que o preparo para a evangelização ideal deve ser o que o Senhor Jesus Cristo proporcionou aos seus discípulos, que consistia basicamente em aprender fazendo, à medida que cresciam na comunhão com o Mestre (Mc 3.13,14). Porque, ao crescer esta comunhão, o testemunho torna-se natural, visto que "a boca fala do que está cheio o coração", conforme Mateus 12.34,35.
Conclusão
A conversa que Cristo teve com a mulher samaritana não apenas nos ilustra que grande parte do ministério do Senhor Jesus foi desenvolvida fora do espaço eclesiástico, mas também nos faz lembrar que, no nosso contexto contemporâneo, nós não devemos continuar desperdiçando tantas oportunidades para anunciarmos o evangelho às pessoas ou limitar esse testemunho às atividades nos espaços eclesiásticos.
Podemos e devemos estar preparados para anunciar o evangelho em diversas situações do nosso cotidiano, buscando resgatar aqueles que Deus mesmo já preparou.
Aplicação
Procure compartilhar o evangelho na medida e na intensidade do que você sabe sobre ele.
Não tenha medo de errar; lembre-se, acima de tudo, que você vai dizer às outras pessoas quem Cristo é o que ele fez por pecadores como você. Para começar, você pode usar o esboço do plano de salvação apresentado na seção "C" deste estudo.
Combine com outros irmãos na fé que tipo de atividades evangelísticas vocês podem fazer juntos e apresentem uma proposta para os líderes da sua igreja.
Autor: Raimundo M. Montenegro Neto