Texto central: Daniel 6.19-28
INTRODUÇÃO
O Deus do profeta é o Deus de toda a Bíblia. Não há como contestar essa verdade. Os profetas, como agentes da revelação de Deus, nos transmitem uma visão ainda mais abrangente do caráter de Deus. Por ser este agente, o profeta sabia muito bem o que distinguia o Deus de Israel dos deuses dos povos pagãos.
Os profetas sabiam que o Deus de Israel é o Deus da história. O Deus de Israel não é limitado pela história e pelas ações humanas. Ele age e interfere na história para que esta tome o curso que ele quer. O povo de Deus e seus profetas já tinham 'provado' das ações deste Deus muitas vezes, e nisto o conheciam.
Os profetas reconheciam em Deus, um Deus que estava presente no meio do seu povo, jamais deixando de ignorar sua santidade, soberania e poder.
As Escrituras nos descrevem Deus como um Deus presente, que interfere na história do homem, um Deus que fala, mantém comunhão, faz aliança, é justo, se compadece, salva, redime o pecador, lhe dá perdão, está atento a todos os fatos da história humana.
Deus se preocupa com os aflitos, com os órfãos, com a viúva e com o peregrino; Deus é um Deus que ama o seu povo, que trabalha para o seu bem,
Isaías 64.4
Porque desde a antiguidade não se ouviu, nem com ouvidos se percebeu, nem com os olhos se viu Deus além de ti, que trabalha para aquele que nele espera.
I - DEUS QUE FALA
Os profetas, como os demais escritores bíblicos, escarneciam dos deuses pagãos dos povos vizinhos por diversas razões e uma delas era justamente porque tais deuses não falavam. É assim que o profeta descrevia a situação:
Salmos 115.5
Têm boca, e não falam...
O profeta Jeremias se referia aos ídolos de maneira semelhante:
Jeremias 10.5
Os ídolos são como um espantalho em pepinal, e não podem falar.
O acontecimento do Monte Carmelo entre o profeta Elias e os profetas de Baal é uma outra referência escarnecedora que se faz aos deuses pagãos. Segundo os profetas, eles não podiam responder e não respondiam porque não podiam falar,
1 Reis 18.28,29
E eles clamavam em altas vozes, e se retalhavam com facas e com lanceias, segundo o seu costume, até derramarem sangue. Passado o meio-dia, profetizaram eles, até que a oferta de manjares se oferecesse; porém não houve voz, nem resposta, nem atenção alguma.
Para o profeta de Israel, não havia coisa mais estranha do que pensar em um deus mudo, impassível e impessoal.
O Deus de Israel, o Deus único e verdadeiro é o Deus que fala. Infelizmente, o povo israelita, muitas vezes, se esqueceu disto e se voltou para os deuses das nações. O verdadeiro profeta jamais faria isto.
Os profetas, com agentes da Palavra, recebiam as manifestações da palavra e da voz de Deus. Deus é um Deus que se comunica com o homem, que fala com ele, que o instrui, exorta, ameaça, promete, etc..
Quando os profetas falavam, eles falavam a Palavra de Deus, comunicando e anunciando a sua verdade ao seu povo. O profeta era apenas um instrumento. Às vezes Deus usava outros meios para falar ao povo ou a quem quer que fosse, além do profeta. Deus falava até mesmo através dos pagãos, como no caso de Nabucodonosor (Dn 4.34-37) ou através de Dario (Dn 6.25-27).
Segundo os profetas, Deus usava os fenômenos naturais para disciplinar seu povo e o profeta explicava estes atos de Deus.
Segundo Amós, uma seca que se arrastava anos a fio, a miséria que impiedosamente vinha assolando, as pestes que atacavam de formas variadas ou um tremor de terra, eram a voz de Deus.
Deus estava chamando o seu povo para voltar para Ele (Am 4.4-13) mas, sua disciplina era, quase sempre, recusada. O profeta explicava os atos de Deus.
Deus continua falando em nossos dias. Hoje, porém, não temos o profeta nos moldes do profeta do Antigo Testamento que, segundo a revelação e inspiração de Deus, interpretava os atos de Deus na história.
O que temos, no entanto, é a revelação de Deus já completa, como lemos na carta aos Hebreus:
Hebreus 1.1,2
Havendo Deus, outrora, falado muitas vezes, e de muitas maneiras, aos pais, pelos profetas, neste últimos dias nos falou pelo Filho a quem constituiu herdeiro de todas as cousas, pelo qual também fez o universo.
Deus hoje fala ao seu povo. A forma que ele escolheu para fazer isto é a sua Palavra, registrada e publicada, para que conhecêssemos a sua vontade.
Para ouvirmos a sua voz hoje, devemos estar atentos à Sua Palavra. Muitas vozes clamam o direito da voz de Deus mas nem todos os que falam em nome de Deus, tem autorização de Deus. Assim, precisamos viver em comunhão íntima com o Senhor, conhecer a Sua Palavra e ter um coração sempre aberto ao Deus que fala.
II - DEUS QUE FAZ ALIANÇA
Os profetas tinham a plena certeza de que Deus estava presente no meio do seu povo. Esta convicção era fruto da confiança que os mesmos tinham na Aliança que o próprio Deus havia feito. Deus se relaciona com o ser humano e isto o caracteriza como diferente dos deuses dos povos pagãos.
Os deuses pagãos se mantinham distantes dos seus adoradores, exigiam coisas absurdas como o sacrifício humano.
O episódio do Monte Carmelo nos mostra bem essa relação com o deus pagão. Embora os profetas de Baal se sacrificassem, mutilando seus próprios corpos, uma prática que era comum entre eles, nenhuma resposta foi dada pois os deuses dos povos pagãos não estavam presentes, não se relacionavam com os seus servos (1Rs 18.20-40). Eles na verdade, nada são.
Quando olhamos para os profetas, percebemos que os mesmos chamavam a atenção do povo para a Aliança que Deus havia feito. Amós fez o povo lembrar que o "acordo" era a única maneira para se andar juntos: "Andarão dois juntos, se não houver entre eles acordo?" (Am 3.3). Este texto nos faz lembrar um companheiro de viagem, alguém que caminha conosco, que está ao nosso lado.
Mas esta presença de Deus, que era fruto da Sua Aliança, embora fosse um grande privilégio, tinha também seus deveres, e esses, o povo quase sempre ignorava. Estavam muito mais atentos aos direitos da Aliança do que aos deveres.
Os servos de Deus não deixavam de falar das implicações da Aliança. Josué, quando da renovação da Aliança com Deus, deixou claro ao povo que não era fácil praticar as exigências da Aliança, porém, não era impossível:
Josué 24.19-22
Então Josué disse ao povo: Não podereis servir ao Senhor porquanto é Deus santo, Deus zeloso, que não perdoará a vossa transgressão nem os vossos pecados. Se deixardes o Senhor e servirdes a deuses estranhos, então se voltará, e vos fará mal, e vos consumirá, depois de vos ter feito o bem. Então disse o povo: Não, antes serviremos ao Senhor. Josué disse ao povo: Sois testemunhas contra vós mesmos de que escolhestes ao Senhor, para o servir. E disseram: Nós o somos.
Percebe-se, nesta passagem, que há sérias implicações em ser de Deus, implicações que nem sempre são levadas a sério. Entre nós, também, muitos estão, constantemente, interessados em seus direitos, poucos consideram os seus deveres.
O profeta Oséias nos lembra que ser de Deus é uma grande bênção porque Deus é cheio de misericórdia e amor, um pai amoroso, como uma mãe cheia de delicadezas e, tudo isso, apesar da indiferença do povo de Israel.
Deus punia e pune o pecado, é verdade, mas nunca alterou sua Aliança eterna. A infidelidade do povo não muda os planos eternos de Deus (Os 11).
O profeta Amós, contemporâneo de Oséias, nos faz lembrar das exigências da Aliança, enquanto Oséias, de certa forma, enfatiza o caráter imutável de Deus.
Amós mostra que ser de Deus nos traz maiores responsabilidades. Conhecer a Deus, Sua Lei, Sua Palavra, Seus ensinos, ser povo de Deus, ser da família de Deus, é uma grande responsabilidade.
Deus pune, agindo de acordo com a Sua própria Aliança (Am 3.1,2). Deus diz que Israel seria punido porque era Sua família escolhida entre todas as famílias da terra.
Aqui, então, temos os dois lados da Aliança. De um lado temos os privilégios e, do outro, os deveres. Deus jamais deixou de cumprir a sua parte e nós devemos obedecer a Ele a fim de que possamos desfrutar, com toda a intensidade, das bem-aventuranças dessa Aliança eterna.
III - DEUS SOBERANO
Esse foi um dos temas mais extraordinários tratados pelos profetas. Os profetas não podiam entender Deus fora desse aspecto absolutamente essencial de sua pessoa — a soberania. Para o profeta, Deus só podia ser entendido, amado e vivido dentro dessa perspectiva.
O profeta falava de Deus em termos de sua soberania, de seu comando, de seu controle, de seu domínio, de seu modo sábio, prudente e santo de conduzir todas as coisas de acordo com seu plano, dentro de seu projeto e conselho, redundando tudo para o seu louvor e glória.
Deus é o soberano da história. Todo o conjunto que isso envolve está aberto diante de Deus e é perfeitamente dirigido por Ele. Nada acontece fora do seu maravilhoso plano e nada ocorre sem que Ele saiba. Qualquer coisa, mesmo que pareça algo efêmero, está debaixo do senhorio e da soberania de Deus (Am 4.7).
Os profetas tinham consciência de que os homens faziam seus planos, esquecendo-se dos planos de Deus e, em muitos casos, com planos totalmente opostos aos planos de Deus.
Sendo assim, a mensagem profética instava os homens a que deixassem seus próprios desígnios, loucura diante de Deus, e seguissem o plano único e eficaz de Deus (Is 5.12, 44.21-28, 55.8,9). Os profetas sabiam que Deus tinha um plano e eles se compraziam em ver que tal plano estava sendo eficazmente realizado.
Como já foi observado acima, os homens nem sempre consideravam os planos eternos do Deus soberano. Ao contrário, cercavam-se de mestres que só pensavam nas coisas dos homens (Is 29.13,14) mas, apesar disso, a obra de Deus haveria de se realizar e, disso, o profeta estava absolutamente convencido. Deus realiza a obra e, quando Ele age, ninguém pode impedir (Is 43.13).
Às vezes, as obras de Deus pareciam estranhas aos homens e mesmo os profetas ficavam perplexos e admirados diante da sabedoria divina (Is 28.29). Os profetas perguntavam: "Quem é como o nosso Deus? Quem é semelhante ao nosso Deus?" (Is 40.13,18,21 e 25; Jr 10.7; Dn 4.35).
Para compreendermos a soberania de Deus, precisamos associá-la com alguns pontos que são extremamente sugestivos e, sem os quais, corre-se o risco de perder de vista a beleza do plano de Deus.
• Santidade: Os profetas entendiam que Deus é santo e que, por isso mesmo, nele não existe o mal. Deus é todo santo, separado do mal dos homens (Is 6.1-3).
A santidade de Deus, no entanto, não o impede ser justo. Deus disciplina, corrige e busca trazer o seu povo ao reconhecimento de seus pecados e transgressões. Deus levantava os inimigos para que os filhos de Israel se tornassem a Ele (Jz 1.6).
Quando os profetas falavam na santidade associada à soberania de Deus, eles nos mostraram que Deus tem um caráter irretocável.
Deus é o único ser capaz de não se contaminar com o mal. Seu caráter santo não pode tolerar a injustiça, o pecado e, por isso, o profeta dizia: "Jurou o Senhor Deus pela sua santidade... " (Am 4.2). O que o profeta queria dizer é que, por ser santo, Deus iria castigar o erro que estava sendo cometido em Israel.
• Justiça: Este é outro aspecto extremamente importante. Deus é absolutamente justo. Quando se fala que Deus endurece o coração, que Deus age contra o seu povo, que Deus castiga, que Deus cria a guerra e o mal, essas ações de Deus são atos de justiça. Deus jamais é responsável pelo mal. As ações de Deus são justas (Ez 18.25). Deus é justo e não tolera o pecado e, por isto, disciplina.
• Poder: Deus é poderoso, o Todo- Poderoso (Is 1.24). Deus é todo suficiente, incomparável em poder. Deus tem domínio sobre todas as coisas, visíveis e invisíveis. Deus é poderoso para nos livrar das ciladas do inimigo (Dn 6.20,27; Sf 3.17). O profeta conhecia a Deus como o Deus poderoso, associando esse poder ao seu governo soberano, ao seu senhorio total sobre todas as coisas.
Assim, o homem e seu destino estão sob a soberania de Deus. Para o profeta, a soberania de Deus só poderia ser entendida à luz de sua santidade, de sua justiça e de seu poder. O profeta podia dizer sem nenhum constrangimento:
Jeremias 10.7
Quem te não temeria a ti, ó Rei das nações? pois isto é a ti devido; porquanto entre todos os sábios das nações, e em todo o seu reino, ninguém há semelhante a ti.
CONCLUSÃO
Os profetas, como agentes da revelação, falavam do poder de Deus, sua relação com os homens, sua aliança, sua soberania, santidade, amor e justiça. Estas coisas estariam encobertas ao homem se Deus não as tivesse revelado através de seus profetas.
Eles anunciavam os 'mistérios' de Deus até que estes vieram a ser plenamente revelados na pessoa de seu filho, Jesus Cristo.
Os profetas não procuraram dar uma definição de Deus nem provar que Ele existia. Para eles, Deus era real e a si mesmo se revelava. Cumpria ao profeta fazer conhecida do povo, tal revelação.
Senhor absoluto sobre todas as coisas, associou Israel consigo, e por isto podia, então, ser chamado de "seu Deus" e chamava a Israel de "meu povo". Hoje, como Igreja de Deus, representamos o novo Israel do Senhor. Devemos viver para sua honra e glória e divulgar a sua mensagem de salvação.
Você está disposto a isso? Você, de fato, entendeu as implicações do senhorio absoluto de Deus? Que Deus nos ajude para que a cada dia possamos "temer e tremer diante do Senhor".
Autor: Luiz Henrique Filho