Dramas e dor: A jornada de sofrimento e coragem na vida de um porta-voz de Deus – Estudo Bíblico sobre a Vida do Profeta

Por que o profeta sofria tantos dramas e dor se estava fazendo a vontade de Deus? Não era ele um vocacionado? Não foi Deus mesmo quem o chamou e colocou a palavra em sua boca? (Jr 1.9). Por que, então, o profeta enfrentava tantas situações de aparente fracasso?

Os profetas eram pessoas comuns e, ao mesmo tempo, especiais; comuns porque estavam sujeitos aos mesmos sentimentos que nós; especiais, uma vez que eram porta-vozes do Deus Altíssimo.

Nesta luta entre o ordinário e o extraordinário, aparece a figura do profeta; assim é que presenciamos Amós, o profeta vaqueiro, criador de gado, que foi enviado por Deus para profetizar no estrangeiro; ou então Oséias, o marido traído, exemplificando com sua própria vida a mensagem divina, denunciando a infidelidade da nação a um Deus cheio de graça e misericórdia.

O que mais diremos de Jeremias, o profeta chorão, que foi se consumindo aos poucos ao ver o fim iminente de sua missão (Jr 20.18), ou Jonas, que só à força profetizava?

Este é o mistério de Deus e de Sua Palavra. Deus usa homens fracos, que sofrem, que vivem da Palavra, e sofrem porque amam a Deus, porque desejam ver mudanças, mudanças que quase sempre não ocorrem. Assim é a Palavra: no tempo certo, mostra o seu poder (Is 40.6-8).

I - A palavra exorta os poderosos

A vida dos profetas nos faz pensar. Algumas vezes se mostravam extremamente corajosos e, em outras, amedrontados, fugindo da ameaça de uma poderosa mulher. Elias, um grande profeta do Senhor, desafiou os profetas de Baal (deus da fertilidade) e, em nome do Deus de Israel, os venceu e os matou (1 Rs 18.20-40).

Logo depois fugiu com medo de uma ameaça, demonstrando medo; pediu para si a morte, demonstrando autopiedade (1 Rs 19.1-4). Deus, em sua misericórdia, animou, confortou e restaurou o profeta à sua verdadeira missão (1Rs 19.5-18).

Os profetas sofreram porque não se calaram diante dos poderosos. Eles não podiam se calar diante da corrupção dos reis, príncipes, juízes, magistrados, sacerdotes e de toda a elite que mantinha o poder em Israel, fosse o poder político ou o poder religioso.

O que mais castigava os profetas era saber que, em muitos casos, o poder religioso era manipulado para manter o poder político.

Os profetas combateram, condenaram e criticaram toda a estrutura que mantinha os poderosos numa vida boa e fácil às custas da destruição da população e, por isso, alguns, dentre eles, foram condenados, acusados de conspiração (Am 7.10; Jr 26.8; 38.4-6).

Os profetas surgiam em situações de desequilíbrio e, mesmo quando os governantes falavam contra eles, não se calavam, não se acovardavam, não fugiam, não se conformavam com a situação, mas proclamavam com autoridade a palavra do Senhor (Mq 3.1-12; 7.3; Os 4.6).

Veja o caso de Jeremias (Jr 1.9-10). O Senhor o chamou para arrancar e destruir antes de edificar e plantar. Será que este chamado seria aceito nos dias de hoje, quando alguns dizem que temos de viver subservientes diante da iniquidade de nossas autoridades? Deus está dizendo para Jeremias: "Eu irei colocá-lo contra os poderosos".

Esta é uma palavra que não seria aceita facilmente pelos poderosos. Muitos defendem a autoridade iníqua dizendo que o fato de alguém estar no poder é a realização da vontade de Deus. É verdade que ninguém chega ao poder se não for pela autorização de Deus. No entanto, nem sempre (ou na maioria das vezes) quem está no poder está fazendo o que é da vontade de Deus.

E por isto que, quando o rei, o príncipe, o governante, ou seja, qualquer líder político ou religioso, não governa de acordo com a vontade revelada de Deus, pode e deve ser contestado.

Daniel, embora estivesse na corte, não deixou de proclamar a Palavra de Deus contra o soberano. Amós contestou Jeroboão II. João Batista condenou a atitude de Herodes e os apóstolos não se curvaram diante da posição dos líderes políticos e religiosos de sua época (At 5.29). Elias repreendeu o rei Acabe por causa da vinha de Nabote (1Rs 21.17-29).

Os profetas demonstraram coragem e intrepidez, uma vez que estavam autorizados pelo Senhor. Se Deus mandar, como não falar? Os profetas ouviram a voz do Senhor e comunicaram sua mensagem, mesmo correndo perigo, sofrendo perseguição, injustiças e suportando o descaso dos poderosos.

II - O povo rejeita a palavra do senhor

A tendência natural do ser humano é para o mal, não importa se é dominador ou dominado. O ser humano, em qualquer posição em que esteja, tem desejos e sentimentos que, via de regra, são contrários à vontade estabelecida pelo Senhor.

Será que os profetas foram sempre defensores do povo a qualquer preço? Não conheciam os profetas a tendência humana natural para o pecado? Os profetas jamais defenderam o povo a qualquer preço, conhecendo muito bem a tendência natural deste para o pecado e para a maldade.

Os profetas não tinham uma visão romântica do povo. Para eles, a vontade do povo não era critério para se saber a vontade de Deus e isto porque, muitas vezes, e, quase sempre, o povo estava distante da vontade de Deus. Aproximava-se do Senhor com os lábios, mas o coração estava em outra direção (Is 29.13).

Assim os profetas entenderam que o povo, de maneira geral, incluindo pobres, viúvas e estrangeiros, caminhavam quase sempre na direção errada. Sendo assim, tinham que ser exortados, confrontados e criticados, a fim de que voltassem à sensatez e fizessem a vontade do Senhor.

Os profetas defendiam o povo (pobres, viúvas, escravos, estrangeiros) dos governos corruptos e iníquos, mas não o inocentavam moral e espiritualmente. Os pecados de idolatria e corrupção praticados pelo povo eram tão ofensivos a Deus quanto os pecados dos líderes da nação.

Em certas circunstâncias, o drama vivido pelo profeta residia no fato de que, embora ele fosse um intercessor, tinha que interceder por um povo corrupto. Vejamos o grande profeta de Israel, Moisés (Êx 32). A autoridade de Moisés foi rejeitada pelo povo que, desobedecendo a Deus, construiu para si um bezerro de ouro. Como interceder por um povo assim? Como clamar por um povo corrupto e transviado?

Vemos, por exemplo, Isaías se identificando com seu povo e sua raça: "...sou homem de lábios impuros, habito no meio de um povo de impuros lábios" (Is 6.5).

Daniel, quando confessa o pecado da nação, se coloca também como culpado, dizendo: nós pecamos, nós agimos de maneira errada, nós não guardamos os mandamentos (Dn 9.1-19).

Uma das grandes queixas dos profetas contra os falsos-profetas, era que estes não se importavam com o povo, não eram solidários (Ez 13.1-16). Mesmo os profetas mais vigorosos, que acusavam veementemente a nação, se colocavam como intercessores, suplicando a misericórdia de Deus (Am 7.1-6).

A situação do profeta era angustiante pois se via isolado do povo, embora quisesse o seu bem. O povo rejeitava a Palavra do Senhor, não dava ouvidos e, assim, o profeta se entristecia (Is 8.13-18; Jr 15.10,17, 18; 16.1-9).

Neste particular, Lamentações de Jeremias mostra em cores vivas a situação terrível do profeta em face da iniquidade do povo.

O povo estava sendo consumido pelo inimigo, o malogro estava batendo às portas de Israel, as nações vizinhas estavam sendo preparadas para invadir e derrubar Jerusalém. O profetas chorava, sofria, vivia em dor na tentativa de salvar o povo e, ao mesmo tempo, tendo que comunicar o castigo de Deus (Jr 8.4-22; 9.1-6).

Apesar de toda a situação desastrosa do povo, sua infidelidade, sua corrupção, seu pecado, sua maneira vil de viver, o profeta sempre lhe foi solidário, sofrendo junto com ele, suportando suas iniquidades, no entanto, jamais deixando de condenar o pecado ainda que suplicasse em favor do pecador.

III - A palavra do profeta confronta o pecado

O profeta confrontava o pecado, independente de quem fosse o pecador, e exortava as pessoas a endireitarem seus caminhos diante do Senhor.

Para o verdadeiro profeta, pecado era sempre pecado, quer fosse cometido pelos líderes políticos e religiosos ou pelo povo em geral. Ele, no entanto, sabia que as consequências eram diferentes.

Quando os líderes religiosos deixavam a lei de Deus, evidentemente que tal comportamento tinha consequências maiores, porque além da ruína pessoal, este pecado atingia todo o povo. Todos estes erros precisavam se extirpados e, para isto, o profeta denunciava todo o desvio.

Por isto o profeta sofria, era perseguido, isolado, preso, ameaçado de morte e difamado. Porque tinha coragem de denunciar o erro e isto fazia dele uma figura indesejável.

O pecado era confrontado com a verdade, com a Palavra, a fim de que o povo de Deus se arrependesse e endireitasse suas veredas diante do Senhor, mas isso, infelizmente, nem sempre acontecia. O profeta falava e o povo não dava ouvidos (Jr 8.6; 9.8-10; Os 4.1,2; Mq 7.2-4; Is 1.1-9). Por que o povo agia dessa maneira?

1. Dureza do coração

A dureza de coração é um pecado condenado na Bíblia. Nossa tendência natural é para o pecado. Os profetas diziam que o povo não se arrependia porque era duro de coração (Jr 9.14; Ez 11.19,20; 36.26). Este estilo de vida dos líderes políticos, religiosos e povo em geral é a causa do sofrimento do profeta.

De um lado estava o profeta, guardião da verdade, colocando à disposição do povo a vontade de Deus e, do outro lado, estavam pessoas que não se curvavam, não se rendiam e, assim, viviam distantes de Deus, causando dano a si mesmas, provocando a ira de Deus e prejudicando o desenvolvimento da nação.

2. Falta de conhecimento

Muitas vezes o povo era enganado, vitimado pelo ensino distorcido ou pela falta de ensino. Os profetas denunciaram o fato dos sacerdotes terem deixado de cumprir sua missão que era trazer o ensinamento correto ao povo (Os 4.6). Dos lábios do sacerdote deveria sair a instrução (Ml 2.7,8).

Alguns sacerdotes ensinavam por interesse, quer dizer, ensinavam o que lhes convinha ou ao rei; simplesmente diziam as coisas que agradavam, não falavam a palavra do Senhor (Mq 3.11). Isso agradava o povo, pois é muito mais fácil ficar do lado de quem não exige compromisso e mudança de vida.

As dimensões mais variadas da vida dos profetas nos ensinam a viver um relacionamento verdadeiramente autêntico com o nosso Deus.

Ao analisarmos a vida dos profetas, nos deparamos com gigantes da fé, da ousadia, da intrepidez e, ao mesmo tempo, homens como nós, sujeitos aos mesmos sentimentos, que sofreram, tiveram seus momentos de crise, passaram por dramas e dor e cujas vidas e mensagens venceram os obstáculos do tempo e chegaram até nós.

Neste estudo, nós respeitamos, admiramos e temos os profetas como modelos, mas para que a mensagem de Deus chegasse límpida e pura até o povo eles tiveram que lutar.

Lutaram contra a soberba dos poderosos, contra a insensatez do povo. Foram perseguidos, ameaçados, presos, exilados, sofreram, choraram, lamentaram por uma nação rebelde e contumaz, porém jamais deixaram de denunciar o pecado e mostrar o caminho da salvação.

Por que fizeram isso? Porque eram pessoas comprometidas com Deus e procuravam viver no centro de sua vontade, mesmo que isso lhes custasse a própria vida.

Autor: Luiz Henrique Filho

Semeando Vida

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