Marketing ou Ministério?: O risco de transformar a igreja em um produto – Estudo Bíblico sobre a Igreja "Point"

Vocês certamente já devem ter notado que a quantidade de “celebridades” que têm declarado ser evangélicas é cada dia maior em nosso país. Essa seria uma boa notícia se, juntamente com a confissão de fé evangélica, pudéssemos constatar o interesse por uma vida santificada.

Contudo, o que se percebe, na maioria das vezes, são pessoas que têm se identificado mais com um determinado grupo religioso do que com o Senhor Jesus Cristo, como revelado nas Escrituras, haja vista o “testemunho” que muitos têm dado.

Um site noticiou que uma determinada igreja é “o novo point das celebridades”, e mostrou que a frequência a essa igreja é aquilo que vários artistas têm em comum. Point é uma gíria usada para se referir a um “local badalado”, e várias igrejas têm, de fato, assumido essa característica. Esse é o assunto de nossa lição de hoje.

I. A GOSTO DO FREGUÊS

Há um dito popular que afirma que o cliente tem sempre razão. Na igreja point esse ditado é a mais pura realidade. 

Muitas denominações evangélicas têm se deixado influenciar pelo pragmatismo e têm recorrido a vários métodos que, supostamente, têm “dado certo” para trazer pecadores ao “arrependimento”. O problema é que, na ânsia de trazer pessoas para as igrejas, os métodos não têm sido questionados e analisados pelo crivo da Santa Palavra de Deus.

Essa atitude, que pode ser vista abundantemente em nosso país, está longe de ser original. Fora de nossa pátria existem, por exemplo, várias igrejas ligadas a um movimento denominado “sensível aos interessados”. 

Essa ideia está presente em um livro que há alguns anos foi moda no Brasil, Uma igreja com propósitos, de Rick Warren, Editora Vida.

Nesse livro, Warren divulga ideias como: pregar o evangelho nos termos do incrédulo a fim de que seja agradável e fácil para eles se tornarem crentes, e mudar os métodos sempre que necessário. Para isso, ele ensina:

Estabeleça um culto com o objetivo de que os membros da igreja tragam seus amigos. E torne esse culto tão atraente, agradável e relevante aos sem igreja, que os membros de sua igreja ficarão ansiosos por compartilhar esse culto com os perdidos pelos quais eles se interessam.

John MacArthur afirma que alguns dos gurus desse movimento aconselham inclusive a retirar do sermão todas as referências explícitas à Bíblia e ensinam a nunca pedir à congregação para abrir a Bíblia em um texto específico, pois os “interessados” ficam desconfortáveis com essa atitude (cf. Pregação superficial, Revista Fé para Hoje, nº 32, Ed. Fiel).

Para esse movimento, a quantidade de pessoas atraídas ao culto valida o método; afinal, os fins justificam os meios. 

Infelizmente não são poucos aqueles que têm aderido a esses modismos para a igreja crescer. Vejamos algumas ênfases desses grupos como consequência da mentalidade de que a igreja deve agradar o freguês.

A. Comodidade

Em tempos não tão distantes, o que se precisava para começar um novo trabalho de evangelização era de uma família ou um grupo de irmãos dispostos ao trabalho de anunciar as boas-novas da salvação. 

Contava-se com a graça de Deus que, à semelhança do que se fazia na igreja primitiva, acrescentava dia a dia os que iam sendo salvos (At 2.47). Com o crescimento do grupo, os templos eram, então, construídos conforme a necessidade.

Para a igreja point isso está ultrapassado. A primeira coisa a ser feita para começar um novo trabalho é organizar o local a fim de que tudo funcione para promover a comodidade do público-alvo. Tudo é pensado nos mínimos detalhes para que o local agrade às pessoas. 

Climatização, bancos acolchoados, sistema de som de última geração, estacionamento, etc. É claro que essas coisas não são más em si mesmas, mas quando o que chama a atenção em uma igreja é o conforto ao invés da fidelidade à Palavra o foco está mesmo errado.

B. Entretenimento

Outra questão é que a igreja point se preocupa basicamente com o bem-estar dos frequentadores. Com isso, os cultos viram shows com todo tipo de atração, desde palhaços até um ringue de luta-livre na frente do púlpito.

Um jornal da cidade de Vitória (ES), em uma matéria especial sobre religião, afirmou que “para atrair os jovens, algumas igrejas estão inovando, com cultos cada vez mais animados e eventos que são a cara da juventude, em boates, raves e até com escola de samba, tudo regado a músicas cristãs”. 

A matéria cita ainda um “ministério de aventuras” criado em uma igreja com o objetivo de levar os jovens a viagens e passeios para praticar esportes radicais.

C. Evangelho light

Uma mudança ainda mais complicada pode ser verificada. O compromisso dos pregadores não é mais anunciar “todo o desígnio de Deus” (At 20.27), antes, sua função é distrair o público. 

A ideia é que as pessoas gostem das preleções que não mencionam o pecado, o inferno ou a ira de Deus, pois temas assim assustam os ouvintes. 

Os pregadores assumem então a função de animadores de auditório, com o compromisso de arrancar gargalhadas do “respeitável público”.

As palavras de Paulo a Timóteo, no texto básico da lição, se cumprem de forma clara:

Pois haverá tempo em que não suportarão a sã doutrina; pelo contrário, cercar-se-ão de mestres segundo as suas próprias cobiças, como que sentindo coceira nos ouvidos; e se recusarão a dar ouvidos à verdade, entregando-se às fábulas. (2Tm 4.3-4)

Certamente muitas igrejas crescerão desse modo, mas haverá vidas salvas e transformadas? Possivelmente não. O resultado será vidas vazias, pois um evangelho deturpado não transforma o coração dos homens.

II. RETIRANDO O SENHOR DO CENTRO

Nesse ponto, devemos fazer uma pergunta: O que leva uma igreja a se esforçar para ser um point, um lugar agradável para as pessoas? Essa postura terá lugar sempre que a razão de ser da igreja não for centrada no Senhor. Isso acontece, basicamente, por duas razões:

A. Propósito invertido

O Catecismo Maior de Westminster, em sua primeira pergunta, nos ensina que o fim principal do homem é glorificar a Deus e gozá-lo para sempre. Podemos entender, então, que a igreja existe também, e principalmente, para glorificar a Deus.

Quando esse é o pensamento que norteia a igreja, em seu trabalho de proclamação, o evangelho é pregado de forma fiel, pois a igreja quer honrar o Senhor e sabe que ele salvará os seus pela loucura da pregação (1Co 1.21) e também endurecerá a quem lhe apraz (Rm 9.15-16).

O problema na igreja point é que o propósito principal não é a glória de Deus, mas a salvação do perdido. Isso muda tudo. Se a preocupação primeira é fazer com que as pessoas creiam, o evangelho será barateado a fim de ser agradável ao homem.

Conquanto possa haver sinceridade por parte daqueles que querem, a todo custo, ver as pessoas salvas, isso não os autoriza a mudar a mensagem do evangelho. O apóstolo Paulo afirma categoricamente que qualquer evangelho que seja diferente daquele que está revelado deve ser considerado anátema (Gl 1.6-9).

Com o homem colocado no centro, como fazem essas igrejas, se o jovem rico aparecesse em uma delas e, depois de confrontado com o seu pecado do amor ao dinheiro, saísse triste (Mc 10.17-22), possivelmente alguém iria atrás dele para dizer que ele não precisava doar tudo não, que não era necessário ser tão radical.

B. Igreja como negócio rentável

Se aqueles que assumem o padrão de ser uma igreja point, mas são sinceros em suas ricas a fim de salvar o pecador do inferno, acabam por retirar o Senhor do centro da vida da igreja, muito pior fazem aqueles que enxergam a igreja como um grande negócio. Para esses, o centro é o dinheiro e tudo é feito a fim de conseguir mais fiéis, pois isso significa mais contribuições (cf. lição 6).

Não há com o que se assustar em relação a esses, pois a Bíblia é bem clara nesse ponto. Paulo, ao falar a Timóteo sobre os falsos mestres, descreve-os como “homens cuja mente é pervertida e privados da verdade, supondo que a piedade é fonte de lucro” (1Tm 6.5).

O apóstolo Pedro também previne os irmãos, afirmando que, da mesma maneira que surgiram falsos profetas em Israel, haveria no meio da igreja falsos mestres que, movidos por avareza, fariam comércio do povo com palavras fictícias (2Pe 2.3). Ele ainda afirma que muitos seguiriam as práticas desses falsos mestres, a ponto de infamarem o caminho da verdade (2Pe 2.2).

Pode ser que muitos desses tenham começado sinceros, mas perderam o foco por causa do amor ao dinheiro. Paulo fala sobre esse risco na carta a Timóteo, no mesmo contexto do texto citado anteriormente:

Ora, os que querem ficar ricos caem em tentação, e cilada, e em muitas concupiscências insensatas e perniciosas, as quais afogam os homens na ruína e perdição. Porque o amor do dinheiro é raiz de todos os males; e alguns, nessa cobiça, se desviaram da fé e a si mesmos se atormentaram com muitas dores. (1Tm 6.9-10)

Para aqueles que têm compromisso com o dinheiro, fazer da igreja um point é essencial para que consigam o que realmente querem: encher os bolsos com dinheiro alheio.

III. TEOCENTRISMO: O CAMINHO PARA A SAÚDE DA IGREJA

Já vimos que o grande problema que gera a mentalidade da igreja point é a retirada do Senhor do centro da vida da igreja. Devemos estar bem convictos de que a igreja, bem como todas as coisas, existe para a glória de Deus (Rm 11.36; Ef 3.21).

É bem verdade também que à igreja foi dada a missão de proclamar as virtudes daquele que nos chamou das trevas para a maravilhosa luz (1Pe 2.9). Se tivermos como objetivo principal a glória do Senhor, poderemos cumprir nossa tarefa firmados nos seguintes princípios:

A. Submissão às Escrituras

A Bíblia é a única regra de fé e prática em todos os aspectos da nossa vida, quer seja individual, quer seja coletivamente, como igreja. É muito importante atentar para a maneira estabelecida por Deus para chamar pecadores ao arrependimento — a própria Palavra.

A Escritura afirma que “aprouve a Deus salvar os que creem pela loucura da pregação” (1Co 1.21). Em outro lugar lemos: “a fé vem pela pregação, e a pregação, pela palavra de Cristo” (Rm 10.17). É por isso que o apóstolo Paulo estava preocupado em levar a Palavra onde Cristo não havia sido pregado, pois não se pode crer em alguém de quem nada se ouviu (Rm 10.14-15).

Esse ensino é a ordem do Senhor para a sua igreja. Quando Jesus comissionou seus discípulos, ordenou que fizessem discípulos ensinando todas as coisas que ele ordenou (Mt 28.18-20). No texto básico de nossa lição, é isso que o apóstolo está ordenando a Timóteo. Ele deveria, sendo oportuno ou não, pregar a Palavra (2Tm 4.2).

B. Fidelidade na proclamação

Voltando ao texto básico, Paulo diz a Timóteo para, em sua pregação, corrigir, repreender e exortar com toda longanimidade, e isso deveria ser feito com fidelidade ao que diz a Escritura, por isso, ele completa: “com doutrina”.

O apóstolo já havia dito a Timóteo, na primeira carta, para ter cuidado com ele mesmo e com a doutrina, pois dessa forma salvaria tanto a ele como a seus ouvintes (1Tm 4.16). Agora, na segunda carta, afirma que haveria um tempo em que os homens desprezariam a sã doutrina, cercando-se de mestres segundo suas próprias cobiças (2Tm 4.3-4).

A despeito disso, Timóteo deveria se manter fiel à doutrina. Paulo podia fazer esse apelo, pois sabia que Timóteo conhecia as sagradas letras que podem tornar o homem sábio para a salvação desde a infância (2Tm 3.15).

Paulo está exortando Timóteo a ter a mesma atitude que ele tinha. Ao escrever sua primeira carta à igreja de Corinto, o apóstolo Paulo diz que não negociava sua mensagem. Os judeus queriam sinais, os gregos, sabedoria; Paulo diz: “Mas nós pregamos a Cristo crucificado, escândalo para os judeus, loucura para os gentios” (1Co 1.22-23). O que importava para Paulo era agradar a Deus, ser fiel a ele.

Devemos também confiar que o evangelho é o poder de Deus para a salvação de todo o que crê e continuar proclamando a Palavra sem negociá-la.

C. Dependência do Senhor

Depois de alertar Timóteo quanto ao fato de que os homens se recusariam a dar ouvidos à verdade, Paulo exorta: “Tu, porém, sê sóbrio em todas as coisas, suporta as aflições, faze o trabalho de um evangelista, cumpre cabalmente o teu ministério” (2Tm 4.5).

Diante de pessoas que desejavam mestres falando o que elas queriam ouvir, seria uma tentação adequar a mensagem ou confiar em algum método. Só mesmo na dependência do Senhor e confiando no método que ele mesmo estabeleceu é que Timóteo seguiria fiel, suportando as aflições.

Para cumprir cabalmente o seu ministério, Timóteo deveria entender que o Senhor salvaria quem ele quisesse pela Palavra, a mesma Palavra que Paulo afirmou ser, nos versículos anteriores, “útil para o ensino, para a repreensão, para a correção, para a educação na justiça, a fim de que o homem de Deus seja perfeito e perfeitamente habilitado para toda a boa obra” (2Tm 3.16).

Em nossos dias, muitos colocam a confiança em métodos para encher a igreja. Precisamos continuar dependendo do Senhor e confiando somente nele. Ele certamente salvará os seus.

CONCLUSÃO

A igreja não pode sucumbir à mentalidade de que para salvar pecadores vale tudo, inclusive negociar o evangelho. Devemos nos posicionar firmemente e deixar de lado qualquer ideia, por mais atraente que possa parecer, que retire o Senhor do centro da vida da igreja.

Ao mesmo tempo, precisamos estar convictos de que é a vontade de Deus que a igreja se empenhe na proclamação das boas-novas da salvação. A partir do momento em que fizermos isso, confiando naquele que chama os seus pela fiel pregação da Palavra, poderemos, pela graça do Senhor, ver mudanças significativas e ter igrejas que cresçam de forma saudável, preocupadas, unicamente, com a glória do Senhor.

APLICAÇÃO

Verifique se você não é um daqueles que, em nome da salvação dos perdidos, tem negociado a verdade do evangelho. Avalie, sempre pelo crivo da Escritura, as propostas e novidades que são apresentadas no meio evangélico com vistas à evangelização. Integre-se nos trabalhos de evangelização da sua igreja local, confiando no Deus que salva os perdidos, e procure apresentar o evangelho com fidelidade.


Lista de estudos da série

1. A prova de fogo: Como a fé cristã floresce em meio à perseguição – Estudo Bíblico sobre a Igreja Perseguida

Semeando Vida

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