Deus Conosco: Por que o Mediador precisava ser Deus e Homem – Estudo Bíblico sobre as Institutas

Imagine um grande abismo separando dois penhascos. De um lado, está a humanidade, caída, impura e aterrorizada. Do outro, está Deus, em Sua infinita santidade, majestade e justiça. 

O pecado criou uma separação tão profunda que nenhuma escada humana consegue atravessá-la. Nenhum de nós pode alcançar a Deus.

Todos nós, como filhos de Adão, trememos diante da majestade divina. Até mesmo os anjos, que são puros, precisam de uma Cabeça para se manterem unidos a Deus. 

Como, então, nós, que estamos "mortos em delitos e pecados", poderíamos sequer pensar em nos aproximar Dele?

Se nós não podemos subir, a única solução é que a própria majestade divina desça até nós. Mas como Deus, que é perfeitamente santo, poderia se unir a nós, que somos impuros? 

Para construir uma ponte sobre este abismo, era necessário um Mediador. Mas quem poderia ser essa ponte?

Neste estudo, vamos explorar a necessidade e a beleza da encarnação. Vamos mergulhar no mistério de por que nosso Mediador, Jesus Cristo, precisava ser, ao mesmo tempo, verdadeiro Deus e verdadeiro homem. 

A pergunta que nos guiará é: Por que a dupla natureza de Cristo não é apenas uma doutrina complexa, mas o próprio fundamento da nossa salvação e esperança?

1. Nosso Mediador precisava ser homem

Para que pudesse haver uma reconciliação, era preciso que houvesse proximidade. A distância entre a santidade de Deus e a nossa impureza era tão grande que precisávamos de alguém que pudesse tocar os dois lados do abismo. Precisávamos de um "Emanuel", que significa "Deus conosco".

Foi por isso que o Filho de Deus se tornou homem. O apóstolo Paulo, conhecendo nossa fraqueza e nosso medo, nos apresenta Cristo de uma forma maravilhosamente acessível. Ele não diz "um mediador entre Deus e os homens, Jesus Cristo, *Deus*", mas sim, "Jesus Cristo, *homem*" (1 Timóteo 2:5). 

O Espírito Santo sabe que, para nos sentirmos seguros, precisamos saber que nosso Mediador é um de nós, que Ele é "carne da nossa carne e osso dos nossos ossos".

Essa verdade é um imenso consolo. Não temos um Sumo Sacerdote distante e indiferente, "mas um que, como nós, em tudo foi tentado, mas sem pecado" (Hebreus 4:15). 

A humanidade de Cristo é a garantia da nossa adoção. Porque o Filho eterno de Deus tomou para Si o que era nosso (nossa natureza humana), nós, pela graça, podemos receber o que é Dele (Sua filiação divina). 

Por causa dessa "santa fraternidade", como Jesus mesmo a chama, podemos chamá-lo de nosso Irmão e, através Dele, chamar a Deus de nosso Pai (João 20:17). Se somos irmãos de Cristo, somos também co-herdeiros com Ele do Reino dos Céus (Romanos 8:17).

Aplicação

  • Aproxime-se de Jesus com confiança: Quando se sentir sozinho em suas lutas e tentações, lembre-se de que Jesus, como homem, entende perfeitamente suas fraquezas. Ele não o condena; Ele se compadece de você. Corra para Ele em oração, sabendo que Ele é um Sumo Sacerdote compreensivo e misericordioso.

  • Descanse em sua identidade de filho: Sua filiação não é baseada em seus méritos, mas no fato de que você foi unido, pela fé, ao Filho unigênito. Você é um filho amado porque o Filho amado se tornou seu irmão. Deixe essa verdade acalmar seus medos e lhe dar segurança.

  • Veja a humanidade com dignidade: A encarnação de Cristo eleva a dignidade da natureza humana. Se o próprio Filho de Deus não se envergonhou de se tornar um de nós, como podemos desprezar a nós mesmos ou ao nosso próximo, que também foi criado à Sua imagem?

2. Nosso Mediador precisava ser Deus

Se, por um lado, o Mediador precisava ser homem para se aproximar de nós e nos representar, por outro, Ele precisava ser Deus para poder, de fato, nos salvar. 

A tarefa do Redentor era imensa, algo que nenhuma criatura, por mais santa que fosse, poderia realizar.

O Redentor precisava vencer a morte. Mas quem poderia fazer isso, senão a própria Vida? A morte é uma força poderosa demais para qualquer ser humano. Somente o Deus da Vida poderia engolir a morte na vitória.

O Redentor precisava vencer o pecado. Mas quem poderia fazer isso, senão a própria Justiça? Todo ser humano está manchado pelo pecado. Somente o Deus perfeitamente justo poderia esmagar o poder do pecado.

O Redentor precisava destruir os poderes do mundo e do ar. Mas quem poderia conseguir isso, senão um poder mais forte que o mundo e o ar? Somente o Senhor do céu e da terra, o Rei dos reis, poderia desarmar os principados e potestades e triunfar sobre eles.

Onde encontramos a Vida, a Justiça e o Domínio senão em Deus? É por isso que o Deus Todo-Poderoso, em Sua misericórdia, se tornou nosso Redentor na pessoa de Seu Filho unigênito. Qualquer ensino que diminua a divindade de Cristo não apenas rouba Sua majestade, mas também destrói o fundamento da nossa fé.

Aplicação

  • Confie na vitória total de Cristo: Seus maiores inimigos — pecado, morte e o diabo — já foram derrotados. Porque seu Redentor é Deus, Sua vitória é completa e eterna. Você não está lutando por uma vitória incerta; você está vivendo a partir de uma vitória já conquistada.

  • Adore a Jesus como Deus: Não veja Jesus apenas como um grande mestre moral ou um bom exemplo. Curve-se diante Dele em adoração, reconhecendo-O como "meu Senhor e meu Deus". A plenitude da divindade habita Nele corporalmente (Colossenses 2:9).

  • Não tema o futuro: O mesmo que é seu Redentor é também o Criador e Sustentador do universo. Porque Ele é Deus, nada pode frustrar Seus planos ou arrancá-lo de Suas mãos. Sua salvação está segura.

3. As duas naturezas unidas em uma só obra

Para nos reconciliar com Deus, nosso Mediador precisava cumprir dois requisitos fundamentais. 

Primeiro, Ele precisava oferecer uma obediência perfeita para compensar a desobediência de Adão. Segundo, Ele precisava pagar a penalidade pelo pecado, satisfazendo a justiça de Deus.

Essas duas tarefas exigiam a união das naturezas divina e humana. Como verdadeiro homem, Jesus se vestiu da pessoa de Adão. 

Ele tomou nosso lugar, obedeceu ao Pai perfeitamente em nosso favor e apresentou nossa própria carne diante do justo juízo de Deus para sofrer a penalidade que merecíamos.

Mas, como o homem sozinho não poderia vencer a morte, e como Deus sozinho não poderia senti-la, a união das duas naturezas foi essencial. 

Cristo uniu a natureza humana à divina para que pudesse: a) submeter a fraqueza da natureza humana à morte como pagamento pelo pecado; e b) com o poder de Sua natureza divina, lutar contra a morte, vencê-la e obter a vitória para nós.

É uma verdade que deve nos encher de admiração: o Filho de Deus se revestiu de nossa carne para destruir o pecado e a morte, a fim de que o triunfo e a vitória fossem nossos. 

Ele ofereceu em sacrifício a carne que tomou de nós para apagar nossa condenação e aplacar a justa ira do Pai. Toda a nossa esperança descansa neste fundamento.

Aplicação

  • Medite na profundidade da cruz: A cruz não foi apenas a morte de um bom homem. Foi o lugar onde Deus e o homem se encontraram para realizar a maior obra da história. Veja na cruz tanto a fraqueza humana de Cristo (que o permitiu morrer) quanto o poder divino (que o capacitou a vencer a morte).

  • Rejeite especulações vãs: Alguns se perguntam se Cristo teria se encarnado mesmo que Adão não tivesse pecado. As Escrituras, no entanto, são claras: a causa da vinda de Cristo foi aplacar a Deus e nos levar da morte para a vida. Qualquer especulação além disso é curiosidade perigosa. O centro da missão de Cristo é a redenção dos pecadores.

  • Foque no essencial: Como o apóstolo Paulo, decida "nada saber... senão a Jesus Cristo e este crucificado" (1 Coríntios 2:2). É na reconciliação que Cristo nos trouxe, e não em mistérios ocultos, que encontramos a vida eterna. Toda a sabedoria de que precisamos está escondida Nele.

Conclusão

A ponte sobre o abismo que nos separava de Deus foi construída. E que ponte maravilhosa ela é! De um lado, está firmemente ancorada em nossa humanidade. Ele é nosso irmão, nosso parente, 

Aquele que entende nossas fraquezas. Do outro lado, está firmemente ancorada na própria divindade. Ele é o Deus Todo-Poderoso, a Vida, a Justiça e o Rei vitorioso.

Jesus Cristo, em Sua pessoa única, é a união perfeita de Deus e do homem. Ele não é metade Deus e metade homem; Ele é plenamente Deus e plenamente homem. E era necessário que fosse assim. 

Como homem, Ele pôde morrer em nosso lugar. Como Deus, Ele pôde vencer a morte. Como homem, Ele pôde nos representar. Como Deus, Ele pôde nos salvar.

Toda a nossa fé, esperança e segurança repousam sobre esta verdade. Qualquer tentativa de diminuir Sua humanidade ou Sua divindade é um ataque direto ao coração do Evangelho. 

Que possamos, portanto, com reverência e gratidão, adorar nosso Mediador, Jesus Cristo, o Deus-Homem, a única ponte que nos leva de volta para casa, para os braços do Pai.

Estudo Bíblico adaptado das Institutas da Religião Cristã - João Calvino / Livro II - Capítulo 12 - "Jesus Cristo, para se tornar um Mediador, teve que se fazer homem"


Lista de estudos da série

1. O Espelho Quebrado: Redescobrindo quem somos após a queda – Estudo Bíblico sobre as Institutas

2. Vontade Escravizada: Por que não somos livres para escolher a Deus – Estudo Bíblico sobre as Institutas

3. Castelo de Areia: Por que nossas melhores obras não podem nos salvar – Estudo Bíblico sobre as Institutas

4. O Cavaleiro do Coração: Como Deus governa a vontade humana – Estudo Bíblico sobre as Institutas

5. O Espelho da Lei: Por que os mandamentos de Deus nos condenam – Estudo Bíblico sobre as Institutas

6. A Ponte Sobre o Abismo: A necessidade de um Mediador divino – Estudo Bíblico sobre as Institutas

7. A Sombra e a Realidade: Como a Lei do Antigo Testamento apontava para Cristo – Estudo Bíblico sobre as Institutas

8. O Retrato do Caráter de Deus: Uma exploração profunda dos Dez Mandamentos – Estudo Bíblico sobre as Institutas

9. A Alvorada da Salvação: Como Cristo foi revelado no Evangelho – Estudo Bíblico sobre as Institutas

10. O Mesmo Retrato: A unidade fundamental do Antigo e Novo Testamento – Estudo Bíblico sobre as Institutas

11. A Melodia da Redenção: As gloriosas diferenças entre os Testamentos – Estudo Bíblico sobre as Institutas

12. Deus Conosco: Por que o Mediador precisava ser Deus e Homem – Estudo Bíblico sobre as Institutas

13. Carne da Nossa Carne: A importância da verdadeira humanidade de Jesus – Estudo Bíblico sobre as Institutas

14. O Mistério da União: Como as duas naturezas se unem em Cristo – Estudo Bíblico sobre as Institutas

15. O Salvador Completo: Os três ofícios de Cristo como Profeta, Sacerdote e Rei – Estudo Bíblico sobre as Institutas

16. A Obra da Redenção: A morte, ressurreição e ascensão de Cristo – Estudo Bíblico sobre as Institutas

17. O Mérito da Graça: Como a obra de Cristo satisfez a justiça de Deus – Estudo Bíblico sobre as Institutas

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