A Obra da Redenção: A morte, ressurreição e ascensão de Cristo – Estudo Bíblico sobre as Institutas

Todos nós, em nossa condição natural, estamos condenados, perdidos e mortos. Por nós mesmos, não há esperança. 

Mas, em Cristo, encontramos perdão, vida e salvação. O nome "Jesus" não foi um acidente; foi dado pelo céu, pois significa "Ele salvará o seu povo dos seus pecados".

Cristo é o centro de tudo. Afastar-se Dele, mesmo que um pouco, é ver nossa salvação desaparecer. 

Descansar e se satisfazer Nele é encontrar a plenitude da graça. Como disse o teólogo Bernardo de Claraval, o nome de Jesus é luz, alimento, remédio, mel na boca e melodia no ouvido.

Mas, para que essa verdade não seja apenas uma bela ideia, precisamos entender *como* Ele nos alcançou a salvação. 

Nossa consciência nos acusa, pois sabemos que a ira de Deus está sobre o pecado. Para que nossa fé seja firme, precisamos compreender cada passo da obra redentora de Cristo.

Neste estudo, seguiremos o roteiro do Credo dos Apóstolos para explorar a obra completa de Jesus: Sua morte, ressurreição e ascensão, entendendo como cada etapa foi essencial para nos trazer de volta a Deus.

1. O amor de Deus e a ira de Deus: como se conciliam?

A Bíblia nos ensina duas verdades que, à primeira vista, parecem contraditórias. Por um lado, ela diz que "Deus amou o mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigênito" (João 3:16). 

Isso mostra que o amor de Deus veio primeiro, antes de qualquer coisa que fizéssemos. Ele nos amou quando ainda éramos seus inimigos.

Por outro lado, a Escritura afirma que, sem Cristo, somos "filhos da ira" (Efésios 2:3) e que "a ira de Deus permanece" sobre nós (João 3:36). Como Deus pode nos amar e, ao mesmo tempo, estar irado conosco?

A resposta está em compreender que, como criaturas de Deus, somos objeto de Seu amor e bondade.

Ele nos criou para a vida e não tem prazer em nossa destruição. No entanto, como pecadores, por nossa própria culpa, nos tornamos objeto de Sua justa ira. A santidade de Deus não pode amar a iniquidade que Ele vê em nós.

A reconciliação em Cristo resolve esse dilema. O amor gratuito de Deus pelo pecador providenciou um meio para que Sua justa ira contra o pecado fosse satisfeita. 

Na cruz, o amor e a justiça de Deus se encontraram. Deus não começou a nos amar porque Cristo morreu por nós; pelo contrário, Cristo morreu por nós porque Deus já nos amava. 

Como disse Agostinho: "De uma maneira admirável e divina, Ele nos amava mesmo quando nos odiava. Ele odiava em nós o que não fez (o pecado), mas amava o que ainda restava de Sua obra (a criatura)".

Aplicação

  • Aprecie a profundidade do amor de Deus: O amor de Deus por você não é uma emoção superficial. É um amor tão profundo que O levou a encontrar uma maneira de satisfazer Sua própria justiça para poder salvá-lo. Medite nessa verdade: Ele o amou mesmo quando você era inimigo Dele.

  • Leve o pecado a sério: Não minimize o pecado. Ele é a causa da inimizade entre nós e um Deus santo. A única razão pela qual a ira de Deus não está sobre você é porque ela foi derramada sobre Cristo em seu lugar. Essa verdade deve levá-lo à humildade e ao arrependimento.

  • Descanse na reconciliação: Até que Cristo nos una a Deus, a iniquidade que permanece em nós merece a indignação divina. Nossa paz não vem de olharmos para nós mesmos, mas de fixarmos nossos olhos somente em Cristo, por meio de quem nossos pecados não são mais imputados a nós.

2. "Padeceu sob Pôncio Pilatos, foi crucificado, morto e sepultado"

O Credo nos leva diretamente do nascimento de Cristo para a Sua morte, pois é nela que se concentra a substância da nossa salvação. 

A obediência de toda a Sua vida foi parte do preço da nossa redenção, mas as Escrituras atribuem a ênfase principal ao Seu sacrifício na cruz.

Sua Condenação: Ele foi condenado sob Pôncio Pilatos, um juiz terreno, para que fôssemos absolvidos diante do tribunal celestial. Nós, os culpados, fomos libertados porque Ele, o inocente, tomou o nosso lugar. Pilatos declarou publicamente a inocência de Jesus várias vezes, mostrando que Ele não morreu por Seus próprios crimes, mas pelos nossos.

Sua Crucificação: A forma de Sua morte não foi acidental. A cruz era maldita pela Lei de Deus. Ao ser pendurado no madeiro, Cristo se tornou "maldição por nós" (Gálatas 3:13), transferindo para Si a maldição que estava sobre nós e nos tornando livres. Ele se fez pecado por nós, para que Nele fôssemos feitos justiça de Deus.

Sua Morte e Sepultura: Ele provou a morte por todos nós para que, morrendo, pudéssemos ser redimidos para a vida. Sua sepultura nos ensina que, unidos a Ele, também morremos e somos sepultados para o pecado. A morte Dele nos liberta do poder da morte; Sua sepultura mortifica a nossa carne.

Aplicação

  • Veja sua absolvição na condenação Dele: Quando sua consciência o acusar, lembre-se de que a sentença que você merecia já foi cumprida por Cristo. Sua condenação foi pregada na cruz com Ele.

  • Encontre sua bênção na maldição Dele: A cruz, um símbolo de maldição, se tornou para nós um símbolo de vitória e bênção. É na cruz que o recibo da nossa dívida foi pregado e anulado (Colossenses 2:14).

  • Viva a realidade da sua morte para o pecado: Ser "sepultado com Cristo" não é apenas uma ideia teológica, mas um chamado prático para mortificar os desejos terrenos. Você foi libertado não apenas da culpa do pecado, mas também do seu poder dominante.

3. "Desceu ao inferno, ao terceiro dia ressuscitou dos mortos"

A obra de Cristo para nos salvar foi ainda mais profunda do que apenas a morte física. Para nos redimir, era necessário que Ele sentisse em Sua alma o rigor do juízo de Deus.

Sua Descida ao Inferno: Esta cláusula do Credo não significa que Ele foi literalmente ao lugar dos condenados, como uma fábula antiga sugere. 

Significa que, na cruz, Ele sofreu em Sua alma os tormentos de um homem condenado. Ele experimentou o "inferno" da separação de Deus, o peso da ira divina contra o nosso pecado, o que o levou a clamar: "Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste?" (Mateus 27:46).

Sua Ressurreição: Se a história terminasse na cruz, estaríamos perdidos. Embora a morte de Cristo tenha cumprido a salvação, é em Sua ressurreição que a obtemos e a desfrutamos. Como Paulo diz, Ele "foi entregue por nossas transgressões e ressuscitou para nossa justificação" (Romanos 4:25). 

Em Sua morte, o pecado foi destruído; em Sua ressurreição, a justiça foi restaurada e a vida renasceu. A ressurreição é a vitória de Cristo sobre a morte e o fundamento da nossa esperança. Ela produz em nós três grandes frutos:

  1. Nossa justificação: A ressurreição é a prova de que o Pai aceitou o sacrifício de Cristo.

  2. Nossa santificação: Pelo poder da Sua ressurreição, somos regenerados para uma nova vida.

  3. Nossa futura ressurreição: Sua ressurreição é a garantia e o penhor da nossa.

Aplicação

  • Não se envergonhe da cruz: A descida de Cristo ao inferno, Sua agonia de alma, revela a profundidade do Seu amor e o preço terrível da nossa redenção. Não devemos ter vergonha de confessar a tristeza e a agonia de Cristo; nelas, encontramos nossa consolação.

  • Viva no poder da ressurreição: A mesma força que ressuscitou Cristo dos mortos está operando em você hoje, capacitando-o a viver uma nova vida. Não tente viver a vida cristã com suas próprias forças; aproprie-se do poder que flui de Cristo ressurreto.
  • Tenha uma esperança segura: Sua esperança na vida eterna não é um desejo vago. Ela se baseia em um evento histórico: a tumba vazia. Porque Ele vive, você também viverá.
  • 4. "Subiu aos céus, está assentado à direita de Deus Pai Todo-Poderoso"

    A história da nossa redenção culmina com a exaltação de Cristo.

    Sua Ascensão: A subida de Cristo ao céu abriu para nós a porta do Reino que Adão havia fechado. Ele entrou com nossa própria carne, como nosso representante, para que, em esperança, já estejamos sentados com Ele nos lugares celestiais (Efésios 2:6). Sua presença corporal foi removida para que Ele pudesse estar presente conosco de uma forma muito mais poderosa e universal através de Seu Espírito.

    Sua Sessão à Direita do Pai: Estar "sentado à direita" não é sobre uma postura física, mas sobre autoridade e poder. Significa que Cristo foi entronizado como Rei e Senhor sobre todo o universo. Deste lugar de honra, Ele cumpre três grandes funções para nós:

    1. Ele é nosso Intercessor e Advogado: Ele entrou no Santuário celestial para interceder continuamente por nós, garantindo que nossas orações sejam ouvidas.

    2. Ele é a fonte do nosso poder: De Seu trono, Ele derrama Seu Espírito e Seus dons sobre a Igreja, nos fortalecendo para viver e lutar contra nossos inimigos.

    3. Ele nos aguarda para o Juízo Final: De lá, Ele voltará como Juiz. Mas para os crentes, este é um grande consolo, pois nosso Juiz é também nosso Redentor.

    Aplicação

    • Aproxime-se do trono com confiança: Por causa do nosso Intercessor, o trono de Deus, que antes era um lugar de terror, se tornou para nós um "trono da graça" (Hebreus 4:16). Vá a Ele com ousadia, sabendo que você tem um Advogado ao lado do Pai.

    • Não espere o céu na terra: Enquanto Cristo reina, o Reino ainda está, de certa forma, escondido. Somos chamados a esperar com fé a manifestação visível de Sua glória em Sua segunda vinda.

    • Alegre-se em seu Juiz: Não tema o dia do juízo. O mesmo que se sentará no trono para julgar é Aquele que se colocou sob o juízo por você. Sua salvação está garantida Nele.

    Conclusão: Cristo, Nosso Único Tesouro

    Toda a nossa salvação está compreendida em Cristo. Se buscamos perdão, está em Sua morte. Se buscamos justiça, está em Sua ressurreição. Se buscamos força, está em Seu reino. Se buscamos esperança, está em Sua volta.

    Em resumo, todos os tesouros de todos os bens estão Nele. Que possamos, portanto, tirar Dele até nos saciarmos, e de nenhuma outra parte. 

    Aqueles que, não contentes com Ele, buscam esperança em outros lugares, ainda que olhem principalmente para Ele, desviam-se do caminho reto. 

    Mas essa desconfiança não pode penetrar em nossa mente, uma vez que conhecemos bem a abundância de Suas riquezas.

    Estudo Bíblico adaptado das Institutas da Religião Cristã - João Calvino / Livro II - Capítulo 16 - "Como Jesus Cristo Desempenhou Seu Ofício de Mediador para nos Trazer a Salvação. Sobre Sua Morte, Ressurreição e Ascensão"


    Lista de estudos da série

    1. O Espelho Quebrado: Redescobrindo quem somos após a queda – Estudo Bíblico sobre as Institutas

    2. Vontade Escravizada: Por que não somos livres para escolher a Deus – Estudo Bíblico sobre as Institutas

    3. Castelo de Areia: Por que nossas melhores obras não podem nos salvar – Estudo Bíblico sobre as Institutas

    4. O Cavaleiro do Coração: Como Deus governa a vontade humana – Estudo Bíblico sobre as Institutas

    5. O Espelho da Lei: Por que os mandamentos de Deus nos condenam – Estudo Bíblico sobre as Institutas

    6. A Ponte Sobre o Abismo: A necessidade de um Mediador divino – Estudo Bíblico sobre as Institutas

    7. A Sombra e a Realidade: Como a Lei do Antigo Testamento apontava para Cristo – Estudo Bíblico sobre as Institutas

    8. O Retrato do Caráter de Deus: Uma exploração profunda dos Dez Mandamentos – Estudo Bíblico sobre as Institutas

    9. A Alvorada da Salvação: Como Cristo foi revelado no Evangelho – Estudo Bíblico sobre as Institutas

    10. O Mesmo Retrato: A unidade fundamental do Antigo e Novo Testamento – Estudo Bíblico sobre as Institutas

    11. A Melodia da Redenção: As gloriosas diferenças entre os Testamentos – Estudo Bíblico sobre as Institutas

    12. Deus Conosco: Por que o Mediador precisava ser Deus e Homem – Estudo Bíblico sobre as Institutas

    13. Carne da Nossa Carne: A importância da verdadeira humanidade de Jesus – Estudo Bíblico sobre as Institutas

    14. O Mistério da União: Como as duas naturezas se unem em Cristo – Estudo Bíblico sobre as Institutas

    15. O Salvador Completo: Os três ofícios de Cristo como Profeta, Sacerdote e Rei – Estudo Bíblico sobre as Institutas

    16. A Obra da Redenção: A morte, ressurreição e ascensão de Cristo – Estudo Bíblico sobre as Institutas

    17. O Mérito da Graça: Como a obra de Cristo satisfez a justiça de Deus – Estudo Bíblico sobre as Institutas

    Semeando Vida

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