A chegada da boa nova: A história da implantação do Evangelho no Brasil – Estudo Bíblico sobre a Reforma Protestante

As tentativas de implantação do cristianismo evangélico em nosso país são antigas. Nos séculos 16 e 17, os protestantes europeus se instalaram duas vezes no Brasil. Na primeira ocasião houve a tentativa de instalação da França Antártica.

Tratava-se de uma colônia estabelecida no Rio de Janeiro, entre 1555 e 1560. Dentre os colonos, alguns eram calvinistas, mas foram todos expulsos pelos portugueses.

Décadas depois, os holandeses ocuparam grande parte do nordeste brasileiro. Em 1630, tomaram Olinda e Recife e, a partir dessas cidades, aumentaram seu domínio e controlaram a área que se entende de Sergipe ao Maranhão.

A ocupação holandesa implicou a presença da Igreja Reformada, haja vista que o calvinismo era a religião estatal. A ação dos reformados chegou ao fim em 1654 quando foram expulsos dali.

O Brasil teve de esperar mais de 200 anos para que o protestantismo fosse introduzido de maneira efetiva e próspera em seus limites. Isso aconteceu por meio do médico escocês Robert Reid Kalley, que, em 1855, iniciou aqui a obra congregacional.

Para entender o porquê de sua vinda e a de outros missionários é necessário ir às páginas do Novo Testamento e considerar a ordem dada por Jesus aos seus discípulos: "Ide por todo o mundo e pregai o evangelho a toda criatura" (Mc 16.15).

1. De Jerusalém aos confins da terra

A Bíblia ensina que na “plenitude do tempo, Deus enviou seu Filho” (Gl 4.4). A vinda de Jesus cumpriu, portanto, a vontade do Pai.

A missão que lhe havia sido designada por Deus Pai foi concluída com sucesso. Ressuscitado, o Filho declarou aos apóstolos:

At 1.7-8
Não vos compete conhecer tempos ou épocas que o Pai reservou pela sua exclusiva autoridade; mas recebereis poder, ao descer sobre vós o Espírito Santo, e sereis minhas testemunhas tanto em Jerusalém como em toda a Judéia e Samaria e até aos confins da terra.

Observemos que essa afirmação é, na realidade, a resposta de Jesus à pergunta: "Senhor, será esse o tempo em que restaures o reino a Israel?" (At 1.6).

Os discípulos ainda não tinham compreendido a missão de Jesus para eles. Seus olhos estavam voltados para a nação de Israel, mas Jesus tinha em vista o mundo, "os confins da terra".

Essas dimensões geográficas, Jerusalém-Judeia-Samaria-confins da terra, servem como sumário do livro de Atos, isto é, como roteiro da narrativa de Lucas.

Nos primeiros tempos, os crentes se reuniam em Jerusalém (At 1.12; 2.5). Deus agiu de maneira poderosa e quase três mil se converteram em um único dia (2.41). Em seguida, o número de fiéis aumentou para quase cinco mil (4.4).

A igreja crescia (6.1), ao mesmo tempo em que sofria ameaças e ataques por parte dos judeus. Após a morte de Estevão, “levantou-se grande perseguição contra a igreja em Jerusalém; e todos, exceto os apóstolos, foram dispersos pelas regiões da Judeia e Samaria" (8.1).

No capítulo seguinte somos informados de que “a igreja, na verdade, tinha paz por toda a Judéia, Galileia e Samaria, edificando-se e caminhando no temor do Senhor, e, no conforto do Espírito Santo, crescia em número” (9.31).

Em Antioquia “foram os discípulos, pela primeira vez, chamados cristãos” (11.26). Por ocasião da primeira viagem missionária (At 13-15), Barnabé e Paulo pregaram o evangelho às diferentes regiões da Ásia.

Na segunda viagem, Paulo e Silas chegaram à Europa (cap. 16) e diferentes cidades foram alcançadas: Filipos, Tessalônica, Bereia, Atenas e Corinto. O livro de Atos termina mencionando Paulo em Roma, pregando o evangelho na casa onde estava alojado (28.16 e 23).

Noutro lugar, encontramos a informação de que esse mesmo Paulo intentava ir ao limite do continente, nos confins da Europa: a Espanha (Rm 15.28). O ministério do apóstolo Paulo demonstra como ele cumpriu a ordem de anunciar Jesus em todos os lugares possíveis.

O mesmo aconteceu com os demais líderes da igreja. Segundo as diversas tradições que circulavam no período antigo, os demais apóstolos cumpriram o “ide” de Jesus em diferentes lugares da Ásia e da Europa:

  • Pedro em Roma (Itália);
  • João em Éfeso (Turquia);
  • André foi martirizado na Macedônia (perto da Grécia);
  • Bartolomeu serviu na Anatólia, Etiópia, Armênia, Índia e Mesopotâmia;
  • Filipe na Frígia e em Hierápolis, ambas na Turquia;
  • Judas Tadeu atuou na Mesopotâmia, Edessa, Arábia, Síria e Pérsia (Irã);
  • Mateus viveu na Judeia, Etiópia e Pérsia;
  • Matias morreu na Etiópia, mas não sem antes pregar na Judéia e Macedônia;
  • Tiago, "o maior”, morreu em Jerusalém (At 12.2);
  • Tiago, "o menor”, foi missionário na Palestina e no Egito;
  • Tomé foi pregador na Pérsia e na Índia;
  • e sobre Simão, o zelote, nada se sabe.

Consolidado na Ásia, Norte da África e na Europa, ao longo dos séculos o cristianismo passou a ser a grande força político-religiosa do mundo ocidental.

Se nos primeiros três séculos ele lutou para sobreviver, a partir do 4°século, com o apoio de Constantino e de outros imperadores romanos, a religião cristã passou a exercer cada vez mais influência sobre a sociedade, dando origem ao conceito de cristandade (uma sociedade regida pelos valores do cristianismo).

A Igreja Cristã, apoiando e sendo apoiada pelos governantes, exerceu o poder político e ideológico, além do religioso. Não foi por acaso que o Bispo de Roma (o “Papa”), cidade capital do Império, ganhou projeção e eminência.

As origens do sistema católico-romano podem ser situadas no 4º século, no entrelaçamento entre igreja e estado, religião e política. O cristianismo deixou de ser um compromisso com Jesus, fruto do novo nascimento, e se transformou no compromisso com uma instituição que, oficialmente, apresentava-se como cristã.

É nesse contexto que podemos interpretar as diversas propostas reformistas que foram feitas no decorrer dos séculos medievais. A Reforma Protestante não foi a primeira tentativa, foi, sim, a primeira que obteve êxito.

Estabelecido o protesto, originou-se o protestantismo como religião à parte de Roma. E, assim, de 1517 a 1648, a Europa experimentou disputas, guerras e acordos entre protestantes e católicos.

No contexto dessas guerras religiosas, milhares migraram para o Novo Mundo, principalmente das Ilhas Britânicas (Inglaterra, Escócia e Irlanda). E dessa maneira o protestantismo, em suas variadas expressões (as denominações), atravessou o Atlântico e se estabeleceu na chamada Nova Inglaterra.

2. O evangelho no Brasil

O século 19 é considerado o século das missões protestantes e os Estados Unidos foram a principal matriz desse avanço. O protestantismo brasileiro é filho dele. Mas antes dos missionários desembarcarem no Brasil, alguns fatos e situações contribuíram para o seu sucesso.

No aspecto político, devido às relações de Portugal com a Inglaterra, algumas decisões tomadas pela Coroa portuguesa e os acordos estabelecidos entre os dois países abriram as portas para estrangeiros não católicos.

A Constituição de 1824 oficializou o catolicismo como religião do Império e assegurou às demais religiões o direito de culto. Da América do Norte vieram aqueles que fundaram as igrejas do chamado “protestantismo de missão”.

Os Metodistas

Em 1835 veio Fountain Elliot Pitts, que regressou no ano seguinte. Em seguida vieram Justin Spaulding (1836) e Daniel Parish Kidder (1837), este último também como agente da Sociedade Bíblica Americana. Kidder regressou a sua terra após a morte da esposa, em 1840, e Spaulding em 1841, interrompendo a missão metodista. Em 1867 ela seria retomada com Junius Eastham Newman e, a partir de 1876, com John James Ransom.

Os Congregacionais

O casal Robert Reid Kalley e Sara Poulton Kalley desembarcou no Rio de Janeiro em 1855. Kalley era um médico escocês que, ao se converter, na idade adulta, voltou para Igreja Presbiteriana, onde havia sido batizado no oitavo dia de vida. De 1838 a 1847, ele morou na Ilha da Madeira.

Ali serviu como presbítero da Igreja Presbiteriana e, após ser ordenado pastor por seis ministros presbiterianos ligados à Sociedade Missionária, em Londres, voltou à Ilha onde exerceu um abençoado ministério em diversas frentes.

Nos EUA, onde permaneceu de 1853 a 1854, informado que o pastor presbiteriano James Cooley Fletcher - que servia no Rio de Janeiro como capelão da Sociedade de Amigos dos Marinheiros Americanos - pedia o envio de missionários para o país, Kalley decidiu vir para o Brasil como missionário independente, sem ligação com qualquer agência ou denominação.

Aqui plantou o congregacionalismo, que, dentre as denominações estabelecidas por missionários, é a mais antiga do país.

Os Presbiterianos

A Igreja Presbiteriana do Norte dos EUA enviou Ashbel Green Simonton (1859), Alexandre Latimer Blackford (1860) e Francis Joseph Christopher Schneider (1861), que organizaram as Igrejas do Rio (1862), São Paulo (1865) e Brotas (1865).

A Igreja Presbiteriana do Sul enviou George Nash Morton e Edward Lane, que aqui desembarcaram em 1869 e se instalaram em Campinas. As duas representações se uniram e, por meio da criação do Sínodo em 1888, “nacionalizaram” a missão presbiteriana em solo brasileiro.

Os Episcopais e Os Irmãos

Richard Holden desembarcou na região amazônica em 1860, enviado pela Igreja Episcopal e pela Sociedade Bíblica Americana. Esse escocês, que havia feito seu curso teológico nos EUA se alojou em Belém, Pará. Em 1862, mudou-se para Salvador, onde enfrentou a oposição romanista. Desligando-se da Igreja Episcopal, Holden se uniu à Igreja Congregacional onde, a partir de 1865, passou a auxiliar Robert Kalley, tendo, inclusive, pastoreado a comunidade por dois anos e meio na ausência dele.

Abraçou o darbismo e, em 1871, desligou-se dos congregacionais. Depois de implantar a Igreja dos Irmãos em Portugal, em 7 de julho de 1878, Holden fundou o primeiro núcleo de Os Irmãos no Brasil, com doze pessoas que deixaram a Igreja Evangélica Fluminense.

Em nosso país esse movimento ficaria conhecido como Casa de Oração. Quanto à Igreja Episcopal, sua implantação no Brasil aconteceu em 1890, na cidade de Porto Alegre (RS), pelos missionários americanos Lucien Lee Kinsolving e James Watson Morris.

Os Batistas

A primeira investida ocorreu em maio de 1860, com a chegada de Thomas Jefferson Bowen ao Rio de Janeiro, missionário enviado pela Convenção do Sul dos EUA. Uma série de problemas fez com que ele e sua esposa Lurenna deixassem o país depois de oito meses. O inicio (efetivo) do trabalho batista em solo brasileiro remonta à década de 1870, com a chegada dos emigrados do Sul dos EUA.

Na cidade paulista de Santa Bárbara foi organizada, em 1871, por Richard Ratcliff e Robert Porter Thomas, a primeira Igreja Batista. Os primeiros missionários junto aos brasileiros foram William Buck Bagby (1881) e Zachary Clay Taylor (1882), sendo a primeira igreja nacional organizada em Salvador, Bahia.

Os Cristãos Evangélicos

Essa denominação teve sua primeira igreja organizada em 1901, por iniciativa do canadense Reginaldo Young: a Igreja Cristã Paulistana, no bairro da Aclimação, é considerada a mãe da denominação Igreja Cristã Evangélica do Brasil (ICEB). Young, auxiliado por Frederico C. Glass, contribuiu para que o evangelho fosse pregado em Goiás, Minas Gerais, Paraná e Rio de Janeiro.

Com a chegada de Bryce W. Ranke, em 1905, a missão foi organizada, a pequena "igreja-mãe” dinamizada e o trabalho que até então não era coordenado ganhou um eficiente líder. Fato interessante é que de 1942 a 1967 a Igreja Cristã Evangélica se uniu às Igrejas Congregacionais e formou a União das Igrejas Evangélicas Congregacionais e Cristãs do Brasil (UIECCB).

Os Pentecostais

O pentecostalismo brasileiro é, como as igrejas do “protestantismo de missão”, filho dos EUA. O fundador da Congregação Cristã do Brasil, o italiano Luigi Francescon (1866-1964), mudou-se para os Estados Unidos em 1890. No ano seguinte ele se converteu e, de 1892 a 1903, Francescon foi membro da Igreja Presbiteriana Italiana, em Chicago. Ali serviu como diácono e depois como presbítero.

Deixando o presbiterianismo, Francescon, que há anos recebia a influência do pentecostalismo, mergulhou de vez no movimento e passou a dirigir as reuniões do grupo que com ele tinha deixado a Igreja Presbiteriana. Configurava-se, assim, entre os italianos de Chicago e, depois com os de Los Angeles, a experiência de Francescon como líder pentecostal.

Convicto da direção do Espírito Santo, Francescon foi para Buenos Aires (Argentina) e lá implantou o pentecostalismo em 1909. Meses depois, em 1910, em São Paulo, junto aos italianos, era estabelecido o pentecostalismo no Brasil sob a legenda “Congregação Cristã do Brasil".

Da mesma matriz, o pentecostalismo americano, vieram ao Brasil os suecos Daniel Berg (1884-1963) e Gunnar Vingren (1879-1933). Em novembro de 1910, a dupla sueca desembarcou em Belém com 90 dólares no bolso, sem saber uma palavra em português e sem qualquer pessoa para recebê-los. Por que agiram assim?

Por acreditarem estar obedecendo à vontade de Deus. Instalando-se na capital paraense, Vingren e Berg começaram seu ministério em um local ainda inexplorado pelos demais missionários evangélicos: o norte do Brasil.

Conclusão

O grande desafio que se apresenta a todos que se identificam como evangélicos é o da obediência ao evangelho.

Apresentar qualidade e não somente quantidade. Alguém já descreveu a igreja evangélica em nosso país como um grande rio, cuja distância entre as margens é considerável, mas ele é raso, sem profundidade.

Testemunhar Jesus vai muito além da profissão de fé, é necessário ser sal e luz até os confins da terra, e isso inclui o Brasil.

Aplicação

Você já teve o privilégio de conduzir alguém aos pés de Cristo? Tem orado pela conversão de amigos e parentes? Além de orar por eles, você já lhes explicou o evangelho?

Que tal começar em sua casa uma reunião semanal só com pessoas que ainda não abraçaram o evangelho?

Autor: Dráusio Piratininga Gonçalves

Semeando Vida

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