De volta à adoração verdadeira: O que a Reforma nos ensina sobre o culto – Estudo Bíblico sobre a Reforma Protestante

Em João quatro, na conversa com a mulher samaritana, Jesus mostrou como a doutrina, o culto e a vida estão interligados. Começou tratando da água viva (doutrina), mudou para o assunto do marido (vida), e depois definiu a adoração apropriada (culto). Nossa fé envolve a verdade de Deus (doutrina), o encontro com Deus (culto) e a obediência e serviço a Deus (vida).

Como os três estão muito integrados, o mal andamento de uma dessas áreas da fé cristã afeta as outras duas. Por isso, após falarmos de uma reforma da doutrina, precisamos de reforma do culto.

Digo isto, pois a igreja evangélica brasileira está doente quanto às suas práticas litúrgicas. Eu nem diria que ela tem cultuado falsos deuses, pois este seria um erro mais fácil de detectar; mas, muitas vezes, tem cultuado o Deus verdadeiro de forma errada (MI 1 7-10- Am 5.21-24; Is 1.11-15).

Assim sendo, trataremos da história de um rei que reformou o culto em Judá e Israel conforme as Escrituras (2Rs 23.24); uma atitude a ser imitada. O primeiro texto a ser estudado trata de retirar do culto o que não é próprio, e o segundo trata de instituir no culto o que é correto. A Reforma acontece quando se abandona o que é mau e se resgata o que é bom.

1. O que devemos excluir (2Rs 23.4-20)

Como fruto de uma vida consagrada ao Senhor e também em obediência aos preceitos do Livro da Lei, Josias decidiu “fazer uma limpeza” no culto de Judá e Israel. Vejamos algumas de suas medidas:

  • Tirou os utensílios idólatras e o poste-ídolo do templo e os queimou (v. 4,6).
  • Destituiu os sacerdotes idólatras (v. 5).
  • Derrubou as casas de prostituição-cultual (v. 7); em nome da religião, tinham esta atitude pagã horrível.
  • Derrubou os altares erigidos a outros deuses (v. 8,12).
  • Acabou com o sacrifício infantil ao deus Moloque (v. 10).
  • Tirou os cavalos e carros dedicados ao sol (v. 11).
  • Considerou profano e derrubou o altar em Betei, capital de Israel, conforme profetizado em IRs 13.2 (v. 15,16) e também agiu em Samaria (v. 19).
  • Honrou aquele que combateu o falso culto (v. 17,18).
  • Matou todos os sacerdotes idólatras de Israel (v. 20; veja Dt 13.6-18; 17.2-7); métodos drásticos para um mal enraizado — a idolatria já existia em Israel há muito tempo.

Parecia impossível reformar um culto que por muito tempo estava deturpado; é verdade que alguns problemas eram relativamente recentes (da época de Manassés, v. 12,26), mas outros era muito antigos (da época de Salomão, v. 13; e Jeroboão, v. 15).

Entretanto, assim como o culto sempre sofria desvios por meio das atitudes de um rei — Acaz (v. 12), Manassés (v. 12), Salomão (v. 13), Jeroboão (v. 15), reis de Israel (v. 19), reis de Judá (v. 12) — era somente por meio de medidas drásticas de um rei que o culto poderia ser purificado. Desse modo, Josias agiu radicalmente mas com êxito espiritual que durou o período de sua forte liderança (2Cr 34.33).

Estamos numa época na qual parece impossível reformular o culto, pois a diversidade litúrgica é imensa. Os variados cultos surgem para agradar o gosto de cada "consumidor”. Mudanças são feitas sem questionamento quanto a sua fundamentação bíblica.

Vale mais a criatividade do que a exatidão bíblica. Muitas coisas têm sido acrescidas à liturgia simplesmente por serem atraentes (Ex: grupos de coreografia). Invertemos a ordem de prioridades: gastamos menos tempo lendo a Bíblia e orando, e mais tempo com a música, principalmente em forma de apresentações (como um show).

Os chamados “dirigentes de louvor", com suas frases entre os cânticos, têm criado teologias estranhas e incorretas (Ex: “Oh, Espírito Santo! Vem passear entre nós.") E tudo isso é visto como parte de um “grande avivamento”.

E triste vermos alguns líderes moldando os cultos em suas igrejas conforme seus gostos particulares, sem consultar a Escritura para constatar se é do agrado do Senhor. Para espanto de alguns, Deus não aprova inovação no culto (Lv 10.1,2), mesmo que a mudança seja sincera e bem intencionada.

A sinceridade e a boa intenção não tomam o culto verdadeiro; o culto só é aceito por Deus quando tem base na Escritura (Dt 12.30-32). Por isso, precisamos excluir os modismos que não combinam com a Palavra, conforme a obra de Josias.

A princípio, lutar pela reforma do culto traz dissabores, mas ao final, respeito. Josias, com tudo o que fez, deixou saudades após sua morte, pelo seu zelo e integridade (2Cr 35.24-25).

2. O que devemos resgatar (2Cr 35.1-19)

Em sua reforma do culto, Josias não destruiu somente, mas construiu. Ele resgata algumas coisas perdidas em lugar daquelas que ele havia excluído. A principal ênfase da passagem de 2 Crônicas é a volta ao sacrifício pascal como centro do culto.

Hoje, não deve ser diferente. Nosso culto precisa estar centrado em Cristo Jesus e em seu sacrifício por nós. Deve estar focalizado em Cristo (Ap 5.12) e não no Espírito, pois este tem como função glorificar a ele (Jo 16.13,14).

Vejamos como Josias resgatou os aspectos essenciais do culto:

Ele imolou o cordeiro da Páscoa (v. 1)

A descrição do sacrifício pascal nos versos 11 a 15 usa certas frases que ligam o bom culto com algumas práticas antigas: "como está escrito no Livro de Moisés” (v. 12), “segundo o rito” (v. 13), "segundo o mandamento de Davi, e de Asafe, e de Hemã, e de Jedutum” (v. 15). Nem tudo o que é antigo é ruim e ultrapassado; precisamos resgatar os aspectos positivos do culto de nossos antepassados (Ex: apreço à doutrina da justificação e à Santa Ceia).

Colocou os sacerdotes nas funções certas e no lugar certo

A Casa do Senhor (v. 2,10). Assim como no culto judaico, os participantes de nossos cultos devem ser ordenadamente encaixados.

Recolocou a arca sagrada no templo

Pois era ali que Deus deveria se fazer presente; enfatizou o culto como um serviço ao Senhor (v. 3,16). É fundamental que não nos esqueçamos de Deus no culto pois a sua presença gloriosa faz do culto um genuíno serviço ao Senhor.

Resgatou o aspecto familiar do culto (v. 4-6)

Em meio às diferenças entre gerações (jovens disputam com os mais idosos um espaço no culto para o seu estilo preferido), é bom destacarmos que Deus se agrada de uma família que presta culto unida.

Relembrou a necessidade crucial dos levitas se santificarem antes do sacrifício (v. 6)

Veja 2Cr 29.5,15. Quantos de nós não se preparam para a hora do culto? Deixamos de descansar o corpo e a mente antes de culto e acabamos divagando durante a liturgia.

Ofertou em abundância ao Senhor (v. 7-9)

Nosso culto deve ser uma entrega total de tudo que possuímos e somos.

Trouxe a boa música de volta ao culto

E os ministros de música foram tornados exclusivos àquele ministério (v. 15). Como Josias, devemos colocar a música no seu devido lugar: como parte do diálogo entre nós e Deus na liturgia.

A celebração da páscoa no décimo oitavo ano de Josias superou as celebrações anteriores sob a monarquia (v. 18); foi a melhor de um período de mais ou menos quatrocentos anos. Houve uma grande reforma no culto que primeiro excluiu tudo o que era ruim, e depois resgatou todas as coisas que eram verdadeiras.

Precisamos resgatar a centralidade de Deus no culto. Os reformadores do século XVI diziam Soli Deo Gloria (glória somente a Deus), pois sabiam que quando se perde o foco na glória de Deus, o culto vira entretenimento, a pregação vira marketing, trocamos a fidelidade pelo sucesso e a piedade pelo 'sentir bem'. Estas coisas mencionadas acontecem quando deixamos Deus de lado.

O culto público é muito sadio (At 2.42; Hb 10.25). A despeito do culto privado, o povo de Deus precisa reunir-se para prestar culto — foi por isso que Josias reuniu todo o povo.

Mas a reunião pública não deve desconsiderar o caráter santo de Deus. Ele é "fogo consumidor" e não tolera a falta de reverência. Por isso, quando Isaías viu aquele que era Santo, Santo, Santo, teve a certeza de que iria morrer (Is 6.5); quando João viu a Cristo glorificado, caiu como morto (Ap 1.17); quando Pedro deu-se conta da santidade de Cristo, disse: “Senhor, retira-te de mim, porque sou pecador” (Lc 5.8).

Conclusão

Assim como Josias, precisamos redescobrir as Escrituras a fim de reformarmos o nosso culto, eliminando os modismos desnecessários e voltando a um culto simples, mas verdadeiro. Nunca nos esqueçamos de que nosso culto deve ser prestado a Deus não só em espírito, mas também em verdade (Jo 4.24).

Aplicação

Não cometa o erro egocêntrico de ir ao culto perguntando: “O que eu vou ganhar com isso? Será que vou ser abençoado?"

E depois sair dizendo: “Ah! Hoje o culto não valeu a pena, não mexeu comigo.” Aprenda que culto, em primeiro lugar, preocupa-se em honrar a Deus, em servi-lo. Ter nossas necessidades atendidas é uma consequência natural de uma adoração em espírito e em verdade.

Autor: Heber Carlos de Campos Júnior

Semeando Vida

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