A vida cristã é dinâmica e impõe lutas constantes. Vezes sem conta, somos desafiados a conviver com provações, aflições e tentações. Para ilustrar, as Escrituras utilizam a linguagem esportiva, em que somos considerados como "atletas de Deus". Devemos correr com perseverança a carreira que nos está proposta. Com fé em Deus haveremos de vencer.
Seguir fielmente a Cristo não é tarefa simples. Nos primórdios do Cristianismo houve perseguição acirrada aos cristãos, e muitos foram executados publicamente pela espada cruel de imperadores que se aclamavam deuses e exigiam a adoração do povo.
Afrontando os cristãos, esses governantes reivindicavam para si um título dado a Jesus, afirmando: "César é senhor". Percebe-se que, para muitos, crer em Cristo significava assinar o seu próprio atestado de óbito.
Esta é uma luta de ordem espiritual, como ensina o apóstolo Paulo (Ef 6.10ss). Mas, na linguagem apocalíptica, é uma luta contra as forças do mal que foram incorporadas na ação de duas bestas, tornando-se, então, real, visível, palpável. Mas, "quem são as bestas?" ou: "o que significa essa luta?"
Análise do texto
O Apocalipse é tal qual uma carta enigmática em que símbolos e figuras precisam ser decifrados. A partir do capítulo 13, o apóstolo João utiliza a linguagem extraída da profecia de Daniel 7, referindo-se a duas bestas: uma que procede do mar e a outra da terra. Do mar procede o poder político; da terra procede a corrupção do poder espiritual.
As bestas encontram-se a serviço do dragão (Satanás) que, derrotado por Miguel, o anjo-guerreiro, e seus seguidores, foi lançado "à beira-mar", a linha demarcatória que indica a verdadeira moradia do inimigo: "o abismo", onde encontra-se preso e impotente.
A "besta do mar" (13.1 -10) é uma figura simbólica de todos os que almejam honra e glória para si e se opõem ao único Rei. A sua aparência assemelha-se ao dragão: 7 cabeças com 10 chifres, com "nomes blasfemos" que simbolizam a sua realeza e o seu desejo de usurpar o lugar de Deus.
Esse "monstro marinho" caracteriza-se por cores e formas de violentas feras, possuindo a agilidade do leopardo (ou pantera), a força brutal do urso e o rugido apavorante do leão.
A primeira besta representa o Império Romano, os césares que reivindicaram honras e nomes divinos para si, inclusive impondo o culto ao imperador. Homens cruéis como Júlio César, Augusto, Cláudio, Vespasiano e Tito foram proclamados deuses pelo senado romano após a sua morte.
Nero e Dominiciano perseguiram e mataram milhares de cristãos. Este último, contemporâneo de João, exigia para si o título de Dominus et Deus - Senhor e Deus; era um novo Nero que personificava o mal satânico.
A "besta da terra" (13.11-18) recebe a autoridade da primeira besta e promete grandes sinais diante dos homens (13.13). Trata-se de um poder religioso ou ideológico que legitima o culto ao imperador. Pode estar representado em um sistema, uma "comissão", ou um líder também denominado de falso profeta ou anticristo (I Jo 2.12, 22).
Ele controla até mesmo o comércio através de sua marca, a marca da besta (13.17), simbolizada no controvertido 666 que é o número do homem, próximo da perfeição (7), mas que jamais irá alcançá-la. Este número foi utilizado para descrever as medidas e armas do gigante Golias (I Sm 17.4-7), e da imagem de ouro erguida por Nabucodonosor (Dn 3.1).
As bestas representam o poder que controla e manipula os sistemas econômicos, políticos, religiosos etc, oprimindo e explorando as pessoas; legitima-se através de uma ideologia ou propaganda sutil que atrai e seduz.
Assegura a Palavra que estes monstros - o dragão, a besta e o falso profeta - serão completamente exterminados pelo poder soberano do Senhor (19.19,20).
A partir dos textos indicados é possível fazer algumas considerações, compreendendo que esta luta é:
1. Uma luta contra as forças desse mundo
A luta contra as bestas é de ordem espiritual sim, mas ela instala-se em nosso cotidiano (Ef 6.10-20). Segundo o apóstolo João, o dragão (Satanás) incorpora-se e atua através da ação política e religiosa das bestas.
Em outras palavras, os imperadores e os sacerdotes do culto ao imperador encontravam-se possuídos pelo mal. As suas mentes estavam possessas, maquinando toda sorte de males contra os cristãos, a ponto de controlar o comércio.
A raiz de toda a motivação da besta é o orgulho que procura a auto-afirmação do homem contra Deus; ela aspira impor-se sobre os demais e apresenta-se como um poder ditatorial e controlador dos povos.
Nesse aspecto, tudo o que se levanta contra Deus ou pretende usurpar o seu trono ou poder, incorpora a mesma função da besta do Apocalipse e encontra-se a serviço do dragão (Satanás).
De igual modo, todo aquele que se curva frente às pretensões da besta do mar coloca-se dentro dos limites da ação do dragão e demonstra rebeldia ao Cordeiro. Não são exceção os que, à semelhança dos imperadores, corrompem os seus cargos e funções, exploram as pessoas e manipulam a massa.
Há, neste texto, um alerta aos governos e sistemas que se consideram "semideuses" e conseguem o apoio até mesmo da religião para se promoverem.
2. Uma luta que deve ser enfrentada corajosamente
Muitos "estremecem" ao ouvirem falar do Apocalipse, sentindo pânico e pavor em relação aos acontecimentos desta profecia.
Lamentavelmente, pregadores despreparados (e desajustados) são os principais responsáveis pela interpretação deturpada que ameaça e intimida muitos ouvintes, gerando medo, e não, temor de Deus.
As consequências estão por toda a parte: "crentes" cheios de superstições e crendices; alguns até mesmo preocupados com a possibilidade de serem possuídos pelo dragão; "caça-fantasmas da fé" que continuam a procurar as bestas do Apocalipse, fazendo cálculos, prognósticos e previsões.
Porém, ao contrário do que geralmente se ensina por aí, o livro de Apocalipse pretende confortar e encorajar os cristãos, ensinando-os a resistir. Os cristãos não devem temer impérios, falsos profetas, governantes e sistemas usados pelo inimigo.
Alguém sugeriu que o diabo assemelha-se a um cão muito feroz, capaz de matar alguém; mas que se encontra com uma corrente que limita o seu raio de ação. Em outras palavras: só pode ser atingido pelo inimigo aqueles que se aproximam dele.
O biblista Gilberto Gorgulho sintetiza a mensagem do livro em seu comentário bíblico que possui o seguinte título: Não tenham medo. O Senhor é o Deus Emanuel que se encontra conosco, renovando as nossas forças e alimentando a nossa esperança (Js 1.9; Mt 28.20; Jo 16.31).
3. Uma luta cuja vitória está garantida
Finalmente, é importante salientar que todo o esforço do inimigo é vão. Até mesmo a sua ação encontra-se sob o único e verdadeiro poder daquele que diz: "Toda a autoridade me foi dada no céu e na terra" (Mt 28.18). Um dia todos haverão de dobrar os seus joelhos e reconhecer que "Jesus Cristo é Senhor" (Fp 2.9-11).
Corretamente diz a mensagem do pára-choque do caminhão: "Tudo é força, mas só Deus é poder".
Os textos apocalípticos são enfáticos ao afirmar que as bestas serão lançadas ao fogo do inferno e serão eliminadas para sempre; e o Cordeiro e os que foram lavados pelo seu precioso sangue haverão de reinar para sempre no céu.
Ao falar da vitória final, o apóstolo João consola os cristãos, desafiando-os a pensar nas coisas do alto, que estão reservadas para os que se encontram marcados, não com a marca da besta, mas com o sangue de Jesus. Estes haverão de celebrar a vitória final do Cordeiro.
Muita gente fica tão preocupada com o inimigo que termina por vender a imagem de um Cristo enfraquecido pela concorrência das forças do mal. Deus tem o controle e o domínio de todas as coisas.
Ele é o único Senhor. E o dragão e as bestas serão exterminados definitivamente. Não há o que temer. A vitória do Senhor é certa, aleluia!
Autor: Rev. Wilson Emerick de Sousa
Lista de estudos da série
1. Não tenha medo: Como ler o livro da Revelação corretamente – Estudo Bíblico sobre a Introdução ao Apocalipse2. Mais que um profeta: A visão de Jesus que fortalece a esperança – Estudo Bíblico sobre Cristo em Apocalipse
3. Uma mensagem para hoje: O que Cristo diz à sua igreja – Estudo Bíblico sobre as Cartas às Sete Igrejas
4. Quem está no controle?: O governo soberano de Deus na História – Estudo Bíblico sobre o Trono Celestial
5. O mistério revelado: Por que só Jesus pode abrir o livro da História – Estudo Bíblico sobre o Livro e o Cordeiro
6. O mundo em crise: Entenda o significado dos cavaleiros do Apocalipse – Estudo Bíblico sobre os Sete Selos
7. O alerta divino: O que o som das trombetas anuncia ao mundo – Estudo Bíblico sobre as Sete Trombetas
8. Nossa maior tarefa: O papel da igreja em tempos de crise – Estudo Bíblico sobre a Missão do Povo de Deus
9. A guerra invisível: Entenda a vitória de Cristo sobre Satanás – Estudo Bíblico sobre a Mulher e o Dragão
10. Impérios vs. o Cordeiro: Identifique as forças que se opõem a Deus – Estudo Bíblico sobre as Duas Bestas
11. A ira do Cordeiro: A justiça final de Deus sobre a rebeldia – Estudo Bíblico sobre os Sete Flagelos
12. A queda inevitável: O fim de todo sistema que se opõe a Deus – Estudo Bíblico sobre a Queda da Babilônia
13. 1000 anos de paz?: O que a Bíblia realmente diz sobre o reinado de Cristo – Estudo Bíblico sobre o Milênio
14. O fim é apenas o começo: Descubra a promessa da vida eterna – Estudo Bíblico sobre Novo Céu e Nova Terra