Declarado justo: O guia definitivo sobre a justificação pela fé – Estudo Bíblico sobre a Reforma Protestante

O reformador Lutero nos conta que um príncipe alemão chamado Duque George, ao confortar seu agonizante filho, Duque John, falou-lhe sobre a doutrina da justificação: Você deve olhar somente para Cristo e para os méritos dele e esquecer completamente as suas obras.

A esposa do Duque John, ao ouvir isso, mais tarde perguntou ao Duque George: Por que essas verdades não são pregadas publicamente?

Ele respondeu: Porque elas só devem ser faladas para pessoas que estão morrendo, e não para aquelas que estão bem.

O motivo: confiança excessiva na graça pode ser perigosa. Nos dias de hoje, muitas pessoas continuam tendo medo de que, se os outros confiarem na graça de Deus, irão relaxar em sua vida de fé e prática. Mas, isso é um grande erro.

1. Declarados justos

No entendimento da Reforma Protestante nós não seremos aceitos por Deus porque de alguma forma conseguiremos alcançar a santidade perfeita, mas porque, embora continuemos pecadores, Deus declarou-nos justos. Portanto, graça não é um poder introduzido em nós para nos ajudar a nos tornarmos bons, é a aceitação divina de pecadores.

Para a Reforma, portanto, nós somos simultaneamente justos e pecadores.

Mesmo em um bom dia, um cristão comum é também ruim, e comete muitas falhas. Apesar disso, o cristão não precisa viver cada dia aterrorizado esperando a condenação. Ele foi declarado justo por Deus e, por isso, vive todos os seus dias como se tivesse satisfeito todos os requerimentos da Lei.

O conceito reformado de justificação recebe o nome de justificação forense, que tem a ver com o ato declarativo de Deus em nos considerar justos. Roma nunca conseguiu aceitar que uma pessoa possa ser justa e pecadora ao mesmo tempo. Para a Igreja Romana, ou ela é justa ou é pecadora.

Mas, a Escritura diz que “Abraão creu em Deus, e isso lhe foi imputado para justiça”.

Romanos 4.3
Pois que diz a Escritura? Abraão creu em Deus, e isso lhe foi imputado para justiça.

E Paulo continua: “Ora, ao que trabalha, o salário não é considerado como favor, e sim como dívida. Mas, ao que não trabalha, porém crê naquele que justifica o ímpio, a sua fé lhe é atribuída como justiça”.

Claramente a justiça que Abraão e todos os crentes recebem é uma justiça forense, ou seja, declarativa. Eles são declarados justos porque são revestidos da Justiça de Cristo.

Somos declarados justos, porém, ainda somos pecadores. Pela falta de entendimento desse ponto, muitas igrejas contemporâneas se aproximam bastante da igreja medieval.

Muitos crentes modernos são ensinados que podem amar a Deus perfeitamente e que podem ser justos nesse mundo assim como Cristo é justo. Como na igreja medieval, a graça é novamente taxada de uma assistência do Espírito Santo a fim de nos ajudar a viver a "vida cristã vitoriosa”, o que nos garantirá a salvação. E claro que este ensino não é bíblico, e é uma volta ao catolicismo.

Não precisamos cumprir os requerimentos da lei para sermos salvos, até porque, ninguém os conseguiria cumprir plenamente. E Deus não está disposto a nos aceitar com apenas parte do cumprimento da Lei.

Não temos escolha, ou cumprimos toda a Lei ou morremos como culpados. Mas, há um outro caminho. Paulo deixou isso claro:

Romanos 3.21-22
mas, agora, sem lei, se manifestou a justiça de Deus mediante a fé em Jesus Cristo, para todos os que creem.

2. Deus exige “seu” melhor, não o nosso

A descoberta de Lutero a respeito da justificação pela fé não foi algo tão novo assim, porque em parte Roma já admitia isso. Roma não cria que as pessoas eram salvas apenas pelas obras, mas pela graça que capacitava a realizar boas obras.

Entretanto, Lutero e Calvino insistiam que a graça era algo mais do que simplesmente um poder capacitador ou transformador, pois nunca poderíamos ser tão internamente transformados pelo Espírito Santo nesta vida a ponto de poder viver sem pecado. Por isso, a justificação pela transformação interna não é o caminho da salvação. Deus requer seu melhor e não o nosso.

Ele agiu para trazer esse melhor, e isso se deu na pessoa de Jesus, em sua vida, morte e ressurreição que são a base da nossa justificação. A fé na obra de Cristo garante nossa justificação diante de Deus.

Precisamos reconhecer nossa falência espiritual, pois nossa conta está totalmente negativa. Somos pecadores desde o nascimento e por toda a vida continuamos pecando.

Por nossas forças, e mesmo capacitados pelo Espírito Santo, nunca conseguiremos reverter este quadro. Ou seja, nunca conseguiremos que nossas boas ações superem o montante de nossas más ações, e mesmo que conseguíssemos isso, ainda assim, precisaríamos ser julgados pelas más, porque as boas ações não podem encobrir as más.

De fato, um assassino não pode ser absolvido apenas porque fez uma oferta para um orfanato. Nós precisamos de algo que cubra nossos débitos, e não apenas isso, mas que ainda nos abra uma grande linha de crédito.

Ou seja, para sermos salvos, precisamos nunca pecar e ainda por cima amar a Deus e ao próximo de uma forma perfeita por toda a vida. É claro que nenhum de nós jamais conseguiu ou conseguirá isso.

E podemos até dizer, de forma clara, que por causa do evangelho, Deus não espera isso realmente de nós. Note, não de nós. Porque esta justiça tanto de forma negativa (ausência de débitos), como de forma positiva (abundância de créditos) pode vir a nós através de Cristo Jesus. Ele não só morreu por nós, como também viveu uma vida santa em nosso lugar.

3. Sola fide

Lutero não somente entendia que a salvação era pela graça, mas que a forma ou método de recebê-la era através da fé somente. Por isso surgiu mais um lema na Reforma, o sola fide, ou Somente a Fé.

A igreja medieval não negava que a fé era necessária para a salvação, mas uma era fé no poder da Igreja, dizendo respeito muito mais a uma questão de conhecimento e consentimento.

A Reforma, entretanto, apregoou que a fé era uma questão de confiança, e não confiança na eficácia ou no ensino da Igreja, mas no poder de Deus que pode salvar plenamente os que se aproximam dele confiando nos méritos de Cristo.

Uma grande distinção que a Reforma fez e que é muito importante para nós hoje é que quem salva é Cristo e não a fé. A fé não pode ser considerada uma pequena obra que em última instância tem poder de nos salvar.

A fé é apenas o instrumento pelo qual nos apropriamos da salvação conquistada plenamente por Cristo. Porém, ainda assim poderia ficar a impressão de que a fé é uma pequena obra necessária para a salvação, não fosse o ensino inequívoco da Escritura de que mesmo a fé é um dom de Deus (cf. Ef 2.8,9; Rm 12.3; Jd 3).

Pregar sobre salvação pela fé dentro dos moldes bíblicos pode ser muito impopular nos dias atuais. Dizer que o homem não tem poder algum para se salvar pode ser considerada uma frase praticamente extinta. E o motivo não é difícil de se identificar.

As pessoas argumentam, mas ser salvo do que e por quê? O fato é que elas não se sentem perdidas. Foi o tempo quando a pregação da Lei desesperava as pessoas de modo que elas se refugiavam em Cristo. O problema não é que a Lei não tem mais esse poder e, sim, o fato de que a Lei não está mais sendo ouvida.

As pessoas não querem ouvir sobre seus pecados, querem apenas mensagens de autoajuda, de “soluções”. Não se preocupam com a ira de Deus, não veem a maldade e a ofensa de seus pecados, por isso, ainda confiam em si mesmas.

Elas precisam ouvir a respeito do fogo do inferno e da depravação humana, pois somente assim deixarão de confiar em si mesmas e se entregarão a Cristo pela fé, somente.

4. Simultaneamente justos e pecadores

Uma pergunta que normalmente surge quando tratamos desse assunto é: se somos e seremos pecadores por toda a nossa vida, e se de qualquer forma continuaremos justificados, qual é a vantagem de termos uma vida piedosa?

Paulo bem previa que essa pergunta poderia surgir após ter explicado como funcionava a justificação. Ele disse:

Romanos 6.1-2
Que diremos, pois? Permaneceremos no pecado, para que seja a graça mais abundante? De modo nenhum! Como viveremos ainda no pecado, nós os que para ele morremos?

A explicação lógica do Apóstolo para esta questão decorre do entendimento de nossa união com Cristo. Ele diz que nós fomos unidos com Cristo, tanto em sua morte como em sua ressurreição (Rm 6.3).

Pela fé nós somos batizados em sua vida de obediência, morte sacrifical e ressurreição vitoriosa, e isso de tal maneira que, embora ainda sejamos pecadores, possuímos uma nova e completa identidade no céu.

Unidos com Cristo, somos uma “nova criatura, nossos pecados que forma "tolerados" por Deus (Rm 3-25), foram cancelados em Cristo, e sua justiça foi, de fato, manifestada em nossas vidas “no tempo presente”, assim Deus é “justo e justificador daquele que tem fé em Jesus (Rm 3.26).

E essa mesma justiça que por um lado credita em nossas vidas a justiça de Cristo, também derrama sobre nossas vidas o fruto daquela justiça. A fé que justifica — que é a fé some Cristo como Salvador — inevitavelmente produz obras.

Conclusão

A graça de Deus nos justifica instantaneamente, agora, no tempo presente. A justificação ocorre no início da salvação e não no fim dela. Por isso, não precisa ser relegada apenas às pessoas moribundas, mas a todos quantos se aproximam de Cristo.

Deus vê em seus eleitos a presença de Cristo. Eles, por causa disso, não possuem qualquer dívida e, ainda por cima, possuem uma inesgotável linha de credito diante de Deus.

Mas, é verdade que continuam pecando, pois a natureza pecaminosa ainda não foi erradicada, entretanto, já podem realizar boas obras, pois em Cristo possuem uma nova natureza. 

São, de fato, simultaneamente justos e pecadores. Isso não permite que abusem desta graça e vivam no pecado, pois se fizessem isso, estariam demonstrando que claramente que jamais conheceram verdadeiramente a graça de Deus.

Autor: Leandro Antonio de Lima

Semeando Vida

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