“Quão absurdo seria que as criaturas, a quem ele (Deus) formou e sustenta, possuíssem outro propósito que não fosse a manifestação da glória de seu Criador”.
Essa frase é parte do comentário do reformador João Calvino sobre nosso texto básico e demonstra que o fim principal do homem só pode ser o de glorificar a Deus, como diz a resposta à primeira pergunta do Breve Catecismo.
No entanto, essa lógica parece não fazer parte da vida da maioria dos cristãos e, infelizmente, de muitos de seus líderes. A glória que deve ser dada a Deus tem sido usurpada, roubada, tomada e desviada para o homem. Homens têm sido glorificados e louvados ao invés da pessoa de Deus.
Absurdos dos mais diversos têm surgido no meio evangélico, levando o nome de louvor e de culto a Deus. John MacArthur Jr., pastor americano, em seu livro Com Vergonha do Evangelho, falando sobre o problema da centralização do culto no homem e não em Deus, constata:
"Nos últimos cinco anos, algumas das maiores igrejas dos Estados Unidos têm se utilizado de recursos mundanos, tais como comédia 'pastelão', peças cômicas entremeadas de música, exibições de luta livre e até mesmo imitações de strip-tease, para tornar um pouco mais atrativas suas reuniões dominicais. Nem um tipo de grosseria, ao que tudo indica, é ultrajante o suficiente para não ser trazida para dentro do santuário. O entretenimento está rapidamente se tornando a liturgia da igreja pragmática."
É preciso que voltemos a proclamar a verdade bíblica de que tudo o que fazemos deve ser para a glória de Deus.
Romanos 11.36
Porque dele, e por meio dele, e para ele são todas as coisas; glória, pois, a ele eternamente. Amém.
Analisemos este versículo para entendermos melhor esta verdade.
1. Dele
Todas as coisas foram criadas por ele e “sem ele, nada do que foi feito se fez” (Jo 1.3). Deus é a fonte de todas as coisas. Todas as coisas se originaram de seu decreto eterno.
Deus é a causa eficiente de todas as coisas. O apóstolo Paulo, em sua carta aos coríntios, diz: “para nós há um só Deus, o Pai, de quem são todas as coisas e para quem existimos” (ICo 8.6). As coisas são dele, pois ele as fez. Deus criou tudo o que existe, inclusive nós. Por isso, somos dele, existimos para ele.
A Bíblia nos ensina que: “Ele (Deus) fez a terra pelo seu poder; estabeleceu o mundo por sua sabedoria e com a sua inteligência estendeu os céus” (Jr 51.15). Tornou-se comum em nossos dias contrariar essa afirmação e, consequentemente, rejeitar que todas as coisas são dele usurpando-lhe a glória de ser o Criador. Para a sociedade atual Deus não é o Criador.
O universo é resultado de uma série de coincidências que evoluíram e nos fizeram chegar ao mundo como o temos hoje. Afirmam que a natureza fez-se por si só. Portanto, não há um Criador, não há um Deus Todo-Poderoso.
Como cristãos, e conhecedores de que há um Criador e de que devemos servir a ele, devemos proclamar que toda a glória deve ser dada a Deus, pois todas as coisas são dele.
2. Por meio dele
Além de ter criado todas as coisas, Deus as sustenta. Paulo, em sua carta aos colossenses, falando sobre Cristo, diz:
"Este é a imagem do Deus invisível, o primogênito de toda a criação; pois, nele, foram criadas todas as coisas, nos céus e sobre a terra, as visíveis e as invisíveis, sejam tronos, sejam soberanias, quer principados, quer potestades. Tudo foi criado por meio dele e para ele. Ele é antes de todas as coisas. Nele, tudo subsiste" (CI 1.15-17).
Subsistir significa manter-se, conservar a força e o vigor. Tudo subsiste em Cristo.
A maravilhosa providencia de Deus cuida para que tudo no universo se mantenha. O Salmo 104, verso 14, demonstra a atuação de Deus em suster todas as coisas para o fim que ele deseja: “Fazes crescer a relva para os animais e as plantas, para o serviço do homem, de sorte que da terra tire o seu pão”.
Ainda no Salmo 104, é dito: “Todos esperam de ti que lhes dês de comer a seu tempo. Se lhes dás, eles o recolhem; se abres a mão, eles se fartam de bens. Se ocultas o rosto, eles se perturbam; se lhes cortas a respiração, morrem e voltam ao seu pó” (SI 104.27-29).
Vemos o reconhecimento de que o homem depende de Deus, de sua misericórdia e bondade e devemos reconhecer que ele é o doador de todas as coisas.
Um dos amigos de Jó, após falar de Deus como o governador do planeta e de todo o universo, afirma o seguinte: “Se Deus pensasse apenas em si mesmo e para si recolhesse o seu espírito e o seu sopro, toda a carne juntamente expiraria, e o homem voltaria para o pó” (Jó 34.14,15).
Não podemos subsistir sem a ação graciosa de Deus.
O homem deseja ser independente em todos os sentidos, mas sempre se depara com suas limitações. Esquece-se de que é pó e de que depende do sustento diário de Deus. Deseja mais uma vez roubar-lhe glória e declarar-se autossuficiente. Mal sabem esses que são pobres, cegos e nus (Ap 3.17).
3. Para ele
Tudo é para Deus. Tudo o que ele criou, tudo o que é mantido por ele, é para ele, para sua glória. Os filhos de Deus, conscientes disso, são exortados a fazer tudo para a glória de Deus:
1 Coríntios 10.31
Portanto, quer comais, quer bebais ou façais outra coisa qualquer, fazei tudo para a glória de Deus.
É importante observar que Paulo está falando das coisas mais corriqueiras possíveis, comer e beber, e que mesmo esses atos cotidianos devem ser feitos de modo a glorificar a Deus.
Quão mais importante, então, é estarmos conscientes de agirmos de modo a glorificar o Deus Todo-Poderoso quando nos reunimos para cultuá-lo? No entanto, como já citamos na introdução, a glória de Deus tem sido usurpada no momento em que mais deveria estar presente, no culto a ele.
A adoração é algo central na vida da Igreja e dos cristãos. Como realizá-la substituindo aquele a quem cabe a adoração, pelo adorador?
A pregação da Palavra de Deus tem sido desprezada. Nos cultos atuais a preferência é gastar bastante tempo com os chamados "momentos de louvor”, quando alguém dirige a congregação a louvar a Deus por meio de cânticos.
O problema é que muitos desses “dirigentes de louvor” acabam por tornar-se verdadeiros animadores de auditório, conduzindo a congregação a momentos de desabafo emocional e não de louvor genuíno a Deus. Via de regra, a preocupação é agradar as pessoas e não a Deus.
A Bíblia nos convoca a adorar a Deus: “Tributai ao SENHOR, filhos de Deus, tributai ao SENHOR glória e força. Tributai ao SENHOR a glória devida ao seu nome, adorai o SENHOR na beleza da santidade” (SI 29.1,2).
E ainda: “Tributai glória a Deus; a sua majestade está sobre Israel, e a sua fortaleza, nos espaços siderais. Ó Deus, tu és tremendo nos teus santuários; o Deus de Israel, ele dá força e poder ao povo. Bendito seja Deus!” (SI 68.34,35).
Façamos isso por meio de nossa vida. Demos glória a Deus, pois ela pertence somente a ele. E por isso que Paulo conclui nosso texto básico dizendo: “A ele, pois, a glória eternamente. Amém!”.
Conclusão
O mundo sempre tem procurado ignorar, ou usurpar a glória que pertence a Deus. Desse modo desejam colocar-se acima dele e sofrerão as consequências de não reconhecê-lo como Criador, Sustentador e, principalmente, como Salvador.
Infelizmente a usurpação da glória de Deus tem estado presente também entre aqueles que professam servir a Deus e buscam adorá-lo. A glória de Deus tem sido substituída por uma ênfase no bem-estar do homem.
Devemos anunciar a glória de Deus aos que não a conhecem. Devemos exortar aos que afirmam crer em Deus e servi-lo, mas que não o glorificam como deveriam.
Devemos, na verdade, olhar para nós mesmos e avaliar se não temos, de um modo ou de outro, usurpado a glória que pertence a Deus. Proclamemos com os reformadores: Soli Deo Glória (Glória Somente a Deus, em latim).
Aplicação
Prontifique-se a fazer todas as coisas de sua vida, desde as mais corriqueiras, para a glória de Deus. Vigie-se e procure se perguntar, antes de fazer algo, se aquilo glorificará ao nome de Deus. Isso permitirá que você cresça espiritualmente e cumpra o seu papel como cristão — glorificar a Deus.
Autor: Marcelo Smeets