O arquiteto da fé: O cérebro que organizou a teologia reformada – Estudo Bíblico sobre a Reforma Protestante

Texto Básico: Neemias 2.11-20

Introdução

Quem visita Genebra pode contemplar o imponente Muro dos Reformadores, no Parque dos Bastiões. É um monumento de celebração à Reforma. 

Com 100 metros de comprimento e cinco de altura, foi inaugurado em 1909 como marco dos 400 anos de aniversário do nascimento de Calvino e dos 350 anos de aniversário da fundação da Academia de Genebra (atual Universidade de Genebra).

Na parte principal dessa obra temos uma base sobre a qual estão postas as estátuas de Guilherme Farel, João Calvino, Teodoro Beza e João Knox.

O Muro dos Reformadores é um emblema do principal capítulo da Reforma Protestante: o ministério de Calvino em Genebra. Sua obra reformadora naquela cidade deixou suas marcas ali e na história subsequente do povo de Deus, como fizera Neemias dois milênios antes.

I. Neemias e a reconstrução de Jerusalém

Neemias é sempre associado à reconstrução dos muros de Jerusalém. Sua obra maior, porém, não foi essa, mas a reforma espiritual que ele e Esdras lideraram. Viveu na Pérsia no período posterior ao exílio na Babilônia (5º século a.C.) e era copeiro do rei Artaxerxes.

Era, portanto, homem íntegro, de confiança e capacitado, uma vez que o copeiro era uma espécie de confidente do rei. Estando em Susã (Ne 1.1), no ano 445 a.C., tomou conhecimento da deplorável condição de Jerusalém e dos seus moradores (1.2-3). Sensibilizado (v. 4), buscou orientação de Deus.

O Senhor então o conduziu à obra de reconstrução dos muros e à restauração espiritual do povo da aliança.

Convicto, ele motivou seus patrícios, enfrentou inimigos inescrupulosos e adotou uma série de medidas administrativas. Tudo isso visava a reorganizar a comunidade israelita segundo os termos do pacto com o Senhor.

Da atuação de Neemias, destacamos:

1. A busca da direção divina (1.4-11; 2.4);

2. A convicção de aprovação e direção divina (cf. 2.8b, 12 e 18);

3. A capacidade de motivação (2.17-18), de delegar tarefas (cap. 3), de supervisionar (4.16-23) e de organizar o repovoamento de Jerusalém (cf. o cap. 7, especialmente os versos 4 e 5);

4. A firmeza contra os adversários (2.19-20 e 6.1-14);

5. A dependência de Deus aliada à vigilância (4.9);

6. O conhecimento da Lei de Deus na refutação do inimigo (6.10-11);

7. As medidas para eliminar problema econômico e social (cap. 5), alimentado pela impiedade (15). Por temor a Deus (cf. v. 15) e misericórdia (cf. v. 18), Neemias abriu mão do seu direito de governador (v. 14). Como ele, outros assim procederam.

8. Com auxílio de Esdras, reconduziu o povo à Aliança (Ne 9.38). Isso começou com a leitura (8.3) e explicação da lei de Deus (8.7). A compreensão dela foi seguida de celebração (8.12), Festa dos Tabernáculos (13-18), jejum coletivo (9.1) e confissão de pecados (9.2). Repovoada a cidade, houve a "dedicação dos muros”, acompanhada de grandes sacrifícios “pois Deus os alegrara com grande alegria”. De longe, se ouviu o júbilo de Jerusalém (12.43). O ministério de Neemias em Jerusalém durou mais de doze anos. Verdadeiramente ele foi usado por Deus para empreender uma reforma física e, principalmente, espiritual.

II. João Calvino em Genebra

Martinho Lutero (1483-1546) desponta como principal nome da primeira geração de reformadores. João Calvino, 25 anos mais jovem (1509-1564), pertence à geração seguinte, que, mas organizou e consolidou o movimento.

Calvino é considerado o mais influente dos reformadores. Estudar o seu ministério nos remete ao palco de sua atuação, uma vez que “falar de Calvino é falar de Genebra".

Genebra optou pelo protestantismo em 1536, quando, devido à ação de Guilherme Farel (1489-1565), em uma assembleia pública, os cidadãos se posicionaram a favor do movimento.

Farel vinha pregando lá desde 1532, mas não seria ele o maior responsável pela reforma religiosa. Ela aconteceria pela instrumentalidade do francês João Calvino, que teria de moldar a cidade segundo os princípios bíblicos.

A situação de Genebra antes de abraçar a Reforma não era boa, devido aos esforços empreendidos na independência do jugo político e militar do Ducado de Savoia, que exercia seu governo desde o século 13.

Por esse tempo, a população era de aproximadamente 10 mil pessoas e o governo era exercido por quatro concílios (menor, dos 200, dos 400 e geral).

Na parte educacional a situação era extremamente precária, havendo apenas um colégio, que precisava ser remodelado. Questões político-econômicas envolvendo autoridades de Berna e Genebra fomentavam uma complexa teia de interesses, que interferia nas demais esferas. 

A tensão entre Calvino e Farel, de um lado, e o Conselho municipal, de outro, culminou na expulsão dos dois em 1538. Na ausência deles, constatou-se a dificuldade de se implementar uma nova ordem dissociada da reforma religiosa, o que fez com que as autoridades convidassem ambos a regressar.

Farel, que tinha compromissos em Neuchâtel, não pôde, mas conseguiu convencer Calvino — que estava em Estrasburgo — a reassumir o posto de pastor e líder da reforma. Assim, em setembro de 1541, ele estava de volta. A partir de então, a história de Genebra e a dele estariam ligadas de uma vez por todas.

À frente do movimento, do púlpito da igreja, de 1541 até sua morte, em 1564, Calvino realizou um ministério cuja influência se estendeu aos rincões mais distantes do continente europeu. Para isso vários fatores contribuíram: seu brilhante intelecto, sua rica produção escrita, a correspondência com pessoas de muitos lugares, a posição geográfica de Genebra, auxiliares de confiança, etc.

Ele não ficou sem inimigos, mas grande parte da oposição política às suas reformas desapareceu em meados da década de 1550, e os últimos dez anos da sua vida foram pacíficos e produtivos.

Além de pregar e ensinar, Calvino continuou a oferecer conselhos políticos aos órgãos dirigentes de Genebra, embora nunca tenha ocupado nenhum cargo público e não tenha se tornado um cidadão oficial de Genebra até 1559. Ele também persuadiu as autoridades políticas a construírem uma academia teológica em Genebra, que logo se tornou o seminário reformado mais importante da Europa.

Nos últimos anos de sua vida, ele concluiu a quinta e última edição das Institutas da Religião Cristã, um sumário de teologia que havia atingido 1500 páginas.

A academia de Calvino, seus escritos teológicos e suas milhares de cartas a igrejas e indivíduos fora de Genebra ampliaram a sua influência em toda a Europa, e por ocasião da sua morte em 1564 ele já era conhecido como um reformador internacional.

Na área social, podemos mencionar as seguintes medidas:

1. Assistência aos necessitados sem discriminação de nacionalidade;

2. Ajuda e cuidado com a saúde popular, programa de visita médica domiciliar;

3. Esforços do governo na capacitação profissional;

4. Combate ao desemprego com oferta de trabalho pelo governo;

5. Ênfase no amparo aos pobres, idosos e desamparados;

6. Luta contra a insolência do luxo em relação aos pobres;

7. Exemplo de simplicidade por parte dos reformadores;

8. Limitação dos juros nos empréstimos;

9. Forte combate à especulação;

10. Ataque frontal à escravidão;

11. Combate à bebedeira e à proliferação das tavernas;

12. Grande esforço na educação de todos.

Genebra passou por uma profunda transformação. Os historiadores ainda notam que, ao mesmo tempo em que recebia muitos refugiados de outros países, a cidade se tornou um centro irradiador da fé reformada, enviando centenas de pastores para outras partes do continente, especialmente para França.

Até o Brasil recebeu apoio de Genebra. Durante o ministério de Calvino, a cidade foi, segundo João Knox, “a mais perfeita escola de Cristo desde os dias apostólicos”.

Conclusão

O legado da reforma calvinista na cidade é reconhecido ainda hoje. No famoso Muro dos Reformadores está gravada a frase Post Tenebras Lux (Após trevas, a luz). Calvino foi usado por Deus em Genebra e, a partir dela, sua influência se espalhou pelo mundo inteiro. 

McGrath observa que “ao final de três quartos do século 16, o calvinismo estava consolidado como uma religião internacional, segura de sua capacidade e do direito de dar uma nova forma à sociedade”.

De fato, a História comprova a internacionalização do movimento calvinista e sua influência além das igrejas reformadas ou presbiterianas (existem grupos batistas, congregacionais, anglicanos e metodistas adeptos da teologia de Calvino, havendo também o caso dos valdenses, cuja origem antecede à Reforma).

O pensamento do reformador genebrino “influenciou as artes, a política, a economia, a literatura e outros setores da cultura".

Como nos lembra o historiador Émile-G. Léonard, o maior êxito de Calvino consiste em ter forjado um novo tipo de homem, o “reformado”, que manifesta “uma atitude confiante e destemida diante da vida, baseada no senso de chamado e capacitação divinas" (A. McGrath).

Aplicação

Sob a liderança de Calvino, a Igreja de Genebra transformou a sociedade local. Reflita sobre como você pode impactar a sociedade, vivendo como crente, sendo sal da terra e luz do mundo nos ambientes que frequenta.

Autor: Marcone Bezerra Carvalho

Semeando Vida

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