Texto básico: Hebreus 11.6
A Escritura não procura provar a existência de Deus. Ela toma como pressuposto o fato de que ele existe (Gn 1.1). Isso acontece já no primeiro versículo do livro de Gênesis:
Gênesis 1.1
No princípio, criou Deus os céus e a terra.
A Bíblia inicia sua narrativa afirmando que Deus criou os céus e a terra, sem se preocupar em provar a existência de Deus.
Em toda a Escritura é possível encontrar afirmações sobre Deus, embora em nenhum lugar da mesma se encontre preocupação em provar sua existência. Isso quer dizer que a fé cristã seja cega e sem fundamento?
Que o principal fundamento da religião cristã seja a imaginação humana? Ou a existência de Deus não é provada na Escritura porque o próprio Deus não achou necessário fazê-lo? Isso é o que veremos neste estudo.
1. A existência de Deus na escritura
Não há na Escritura sequer um versículo que procure provar a existência de Deus. Ela não se preocupa em apresentar argumentos lógicos e racionais em favor de sua existência.
No entanto, nada é mais evidente na Bíblia do que o fato de Deus existir. Desde a primeira à última página da Escritura, ele é apresentado como um ser real, vivo, verdadeiro, infinito e perfeito.
Por isso, não é preciso apresentar argumentos racionais que provem sua existência. Além disso, a própria criação, a existência do universo e do homem, são testemunhos da existência de Deus, pois...
Salmos 19.1
os céus proclamam a glória de Deus e o firmamento anuncia as obras das suas mãos.
Não devemos nos esquecer, também, de que a Bíblia nos ensina que a grande prova da existência de Deus não é fruto da razão lógica, mas do relacionamento com ele através da fé.
Sem fé é impossível agradar a Deus, porquanto é necessário que aquele que se aproxima de Deus creia que ele existe e se torna galardoador do que o buscam (Hb 11.6).
Deus se revela ao seu povo por meio de um relacionamento pessoal com ele que é desfrutado por meio da fé. Desta forma, aqueles que se relacionam com ele no contexto da aliança da graça, não têm qualquer dúvida de sua existência, nem mesmo de sua ação graciosa em seu favor.
Mesmo Cristo, cuja missão era revelar o Pai de forma clara e plena, não se preocupou em apresentar provas racionais da existência de Deus, apenas procurou apresentar as suas perfeições infinitas.
Sendo assim, não há forma mais segura de termos plena certeza de que Deus existe do que pertencermos à sua família. O próprio Espírito testifica com o nosso espírito que somos filhos de Deus (Romanos 8.16).
Àqueles que já se renderam a Cristo em arrependimento e fé o Espírito Santo testemunha e confirma, não apenas que Deus existe, mas também que mantém com ele um relacionamento paternal.
2. A existência de Deus e a constituição humana
Todos os seres humanos, em todas as épocas e lugares, têm alguma ideia da existência de Deus. Mais adiante veremos que isso se aplica até mesmo àqueles que se dizem ateus, e procuram provar que Deus não existe.
Ora, se não tivessem alguma noção da existência de Deus, por que e para que se esforçariam para negá-la?
Ainda que não saibam formular um conceito claro a respeito de Deus, mesmo os povos mais primitivos têm ideia da existência de um ser. A Bíblia nos apresenta razões que justificam esse fenômeno.
Salomão diz que Deus pôs a eternidade no coração do homem (Ec 3.11) e Paulo diz que os gentios mostram a norma da lei gravada no seu coração (Rm 2.14, 15).
O simples fato de termos sido criados à imagem e semelhança de Deus, isto é, termos sido feitos para nos relacionarmos com Deus, faz com que, desde o princípio da vida humana, ainda no ventre materno, o homem esteja estruturalmente preparado para isso.
Calvino utiliza-se de dois conceitos para explicar essa ideia da Divindade que todas as pessoas possuem: “semente da religião” e “noção ou senso da divindade".
A. Semente da religião
Calvino diz que todos os seres humanos nascem com a semente da religião plantada em seu coração. Isso é resultado do fato de termos sido criados à imagem e semelhança de Deus. Como resultado dessa semente da religião, surge a religião natural.
Essa religião é suficiente para revelar ao homem o poder, a divindade e a justiça de Deus (Romanos 1.18-34), mas não é suficiente para revelar a misericórdia e a graça de Deus, que dependem do exercício de sua vontade (Rm 9.14-18).
Isso explica a existência de algum tipo de religião em todos os povos, ainda que primitivos, e, sobretudo, a prática de sacrifícios (de animais e de seres humanos) nestes, para aplacar a ira dos deuses.
A religião natural é suficiente para provocar no homem o medo da justiça e da punição pelas usas imperfeições, mas pouco diz sobre graça e a misericórdia de Deus que providenciou justiça para o pecador.
B. Noção ou senso da divindade
Ainda que, por causa do pecado que contamina a natureza humana, o homem não consiga se relacionar de forma harmoniosa com Deus, a ideia da existência de Deus e sua superioridade sobre tudo o que podemos ver e sentir está fortemente plantada na alma humana.
O texto de Atos 17.22-31 mostra que, embora os gregos ainda não tivessem a revelação especial de Deus, dada na Escritura, eles tinham a noção ou senso da divindade, que se expressava através de sua religião politeísta.
Embora a noção da existência de Deus esteja manchada pelo pecado, e dirija o homem à idolatria, ao invés de dirigi-lo ao Deus verdadeiro, ela ainda encontra-se fortemente arraigada no coração humano.
Sendo assim, embora não possa ser provada por meio de argumentos lógicos e racionais, a existência de Deus é sempre pressuposta e admitida.
A ideia que as pessoas têm acerca da natureza de Deus não é a mesma em todos os lugares, e se diverge mesmo entre duas pessoas; mas a ideia da existência de Deus é universal.
Além da semente da religião e da noção da divindade, que são conceitos criados para explicar o ensino bíblico a respeito da crença universal na existência de Deus, há argumentos filosóficos que procuram explicar a existência de Deus sem fazer uso das informações bíblicas.
Esses argumentos não serão estudados aqui por dois motivos:
1) nosso interesse não é estudar filosofia, mas aprender o que a Bíblia nos revela a respeito de Deus, de forma que sejamos edificados em nossa fé e fortalecidos em nossa comunhão com ele;
2) esses argumentos filosóficos nada têm a acrescentar a tudo o que foi dito até aqui.
Eles não foram elaborados para provar a existência do Deus revelado na Escritura, mas apenas para provar que existe um “ser superior”. Como aprendemos, a Bíblia nos ensina muito mais do que isso.
3. A negação da existência de Deus
A tentativa de negar a existência de Deus tem se tornado cada vez mais comum. No entanto, a negação da existência de Deus não é algo novo. Davi, em sua época, já dizia: Diz o insensato em seu coração: Não há Deus (Sl 14.1).
O ateísmo existe por causa do pecado, que separa os seres humanos de Deus e influencia sua mente e seu coração (Rm 1.18-32). Não existem ateus de nascença. Os homens se tornam ateus por causa do desejo de viver de forma independente de Deus.
Aqueles que se dizem ateus estão, de fato, buscando justificativas para a sua vida de pecado e estão envolvidos numa grande batalha interior contra a semente da religião e a noção de divindade, ambas implantadas em seu coração pelo próprio Deus. Podemos classificar os ateus em duas categorias distintas: ateus teóricos e ateus práticos.
A. Ateus teóricos
Os ateus teóricos são aqueles que afirmam claramente que Deus não existe, e vivem tentando provar para si mesmos o contrário daquilo que está impresso em sua alma: a consciência da existência de Deus.
Apesar de toda a sua argumentação teórica, eles não podem fugir da realidade da existência de Deus, pois estão afrontando ao Senhor, vivendo no meio de sua própria criação, sendo eles mesmos parte dela. Todo ateu teórico, será um ateu prático.
B. Ateus práticos
O ateísmo prático é o tipo mais comum. Os ateus práticos não negam a existência de Deus com palavras, mas com suas obras.
No tocante a Deus, professam conhecê-lo; entretanto, o negam por suas obras; é por isso que são abomináveis, desobedientes e reprovados (Tt 1.16). São aqueles que, embora não duvidem da existência de Deus, e até mesmo afirmem sua existência, vivem como se Deus não existisse.
A negação da existência de Deus, seja teórica ou prática, provoca alguns resultados contra os quais a igreja deve se manter sempre alerta. Os principais são os seguintes:
C. Ausência de padrões éticos confiáveis
Se a existência de Deus é negada, tudo passa a depender somente da vontade humana, que não tem que se preocupar com o pecado, pois, se Deus não existe, inexiste também o pecado.
Isso faz com que o padrão moral não seja o que é bom e mau, certo e errado, mas o desejo do indivíduo, de acordo com sua própria compreensão de mundo, ou a conveniência da sociedade. Daí surge o pensamento de que “o que é certo para você pode não ser certo para mim".
Se não existe um padrão moral que sirva para todos, cada um faz aquilo que achar mais conveniente, exatamente como acontecia no tempo dos juízes (Jz 17.6; 21.25). Davi, depois de dizer que o insensato diz no seu coração que Deus não existe, continua: Corrompem-se e praticam abominação; já não há quem faça o bem (Sl 14.1).
D. O culto ao homem
A semente da religião e a noção de divindade estão presentes no coração de todo homem, até mesmo daqueles que se dizem ateus. Por isso, os que negam a existência do Deus verdadeiro, necessariamente buscam outro deus a quem adorar.
Na maioria das vezes, eles se tornam deuses de si mesmos, criam suas próprias regras e leis e se curvam diante de sua própria autoridade, não enxergando nada maior ou mais importante do que si mesmos.
Conclusão
A Escritura não procura provar a existência de Deus, contudo, o testemunho que Deus dá acerca de si em toda a Bíblia e diretamente ao nosso espírito é mais do que suficiente para que não apenas reconheçamos sua existência, mas também o conheçamos como nosso Senhor e Salvador.
A fé cristã não é cega. Ela não é desprovida de um fundamento sólido sobre o qual possa apoiar sua crença na existência de Deus.
Esse fundamento se encontra na revelação divina, a Escritura Sagrada, que parte do pressuposto de que Deus existe. Encontra-se também na ação do Espírito, que testemunha e confirma ao nosso espírito o fato de que somos filhos de Deus.
Além disso, a constituição humana formada por Deus de tal forma que possuímos em nosso próprio coração a semente da religião e a noção de divindade que apontam para a existência de Deus, completa esse fundamento. Por tudo isso, negar a existência de Deus, seja de forma teórica ou de forma prática, é uma grande insensatez e um grande pecado.
Aplicação
Deus existe. Como essa afirmação gloriosa tem influenciado sua vida? Você tem vivido como alguém que realmente sabe que Deus existe? Como você pode fazer isso?
A auto-existência de Deus
As crianças às vezes perguntam: Quem fez Deus? A resposta mais clara é que Deus nunca precisou de ser feito, porque sempre existiu. Ele existe de um modo diferente do nosso: nós existimos de uma forma derivada, finita e frágil, mas nosso Criador existe como eterno, autossustentado e necessário. Sua existência é necessária no sentido de que não há possibilidade de ele cessar de existir.
A auto existência de Deus é uma verdade básica. Na apresentação que faz do "Deus desconhecido" aos atenienses, Paulo explica que o Criador do mundo não “é servido por mãos humanas, como se de alguma coisa precisasse; pois ele mesmo é quem a todos dá vida, respiração e tudo mais” (At 17.23-25).
O Criador tem vida em si mesmo e tira de si mesmo a energia infindável e de nada necessita. A independente auto existência de Deus é uma verdade claramente afirmada na Bíblia (Sl 90.1-4; 102.25-27; Is 40.28-31; Jo 5.26; Ap 4.10).
Na teologia, muitos erros são resultado da suposição de que as condições e limites de nossa própria existência finita se aplicam a Deus.
Na vida da fé podemos também facilmente empobrecer-nos, se alimentarmos uma ideia limitada e pequena a respeito de Deus. A doutrina da auto existência de Deus é um anteparo e defesa contra esses erros.
O princípio de que só Deus existe por si mesmo o distingue de toda criatura e é o fundamento daquilo que pensamos a respeito dele. Saber que a existência de Deus é independente, protege nossa compreensão a respeito da grandeza dele e portanto tem claro valor prático para a nossa saúde espiritual.
Autor: Vagner Barbosa
Lista de estudos da série
1. O Ponto de Partida de Tudo: Como a singularidade de Deus transforma seu relacionamento com Ele – Estudo Bíblico sobre o Ser de Deus2. A Evidência Definitiva: Onde encontrar a certeza inabalável da Sua existência – Estudo Bíblico sobre a Existência de Deus
3. O Mistério Revelado: Como conhecer um Deus infinito sendo uma pessoa finita – Estudo Bíblico sobre a Revelação de Deus
4. O DNA Divino: As 2 chaves para entender o caráter de Deus – Estudo Bíblico sobre os Atributos de Deus
5. Alívio para os Aflitos: O segredo para receber o favor de Deus na sua dor – Estudo Bíblico sobre a Misericórdia de Deus
6. O Presente que Você Não Merece: Como a graça divina reescreve sua história – Estudo Bíblico sobre a Graça de Deus
7. A Força Mais Poderosa do Universo: Descubra as 3 verdades sobre o amor que age – Estudo Bíblico sobre o Amor de Deus
8. O Padrão Inegociável: Por que a santidade de Deus é a sua maior segurança – Estudo Bíblico sobre a Santidade de Deus
9. A Balança Perfeita: Como a justiça divina garante a ordem do universo e a sua paz – Estudo Bíblico sobre a Justiça de Deus
10. Fogo Santo: O que ninguém te contou sobre a ira de Deus e por que ela é boa notícia – Estudo Bíblico sobre a Ira de Deus
11. O Poder Sem Limites: O que a onipotência de Deus significa para suas impossibilidades – Estudo Bíblico sobre Onipotência e Vontade de Deus
12. A Mente Que Sabe Tudo: Como a onisciência de Deus traz conforto e direção para sua vida – Estudo Bíblico sobre a Onisciência de Deus
13. A Rocha Inabalável: Encontre segurança eterna na principal característica de Deus – Estudo Bíblico sobre a Imutabilidade de Deus