Texto da lição: Marcos 4.1-20
Introdução
Ao rejeitar o Evangelho de Jesus Cristo, o ser humano deixa bem claro o péssimo estado em que se encontra. Como se pode rejeitar uma dádiva de amor que salva e dignifica o homem? A parábola do semeador revela alguns motivos para essa rejeição. E mais ainda. Ela nos conta como é que se sabe qual é o bom solo. É isso mesmo. Daí a pergunta: como você tem evidenciado a sua conversão?
I. A razão do ensino por parábolas (Mc 4.10-12)
O que é uma parábola? No que concerne à parábola do semeador, quantos níveis de ensino estão presentes nela? A parábola do semeador expressa ao auditório original visava a conversão? A partir de agora trataremos de responder a essas perguntas.
A. O que é uma parábola?
A palavra parábola significa "comparação". Significa a comparação de duas coisas com a finalidade de fazer evidente e compreensível uma delas. No caso, a que se quer evidenciar é pertencente ao domínio religioso comparada por meio de outra, tomada da vida cotidiana ou da natureza.
Essa é a definição clássica do termo. Contudo, no Antigo Testamento, a palavra traduzida por parábola tem um significado mais amplo. Pode ser entendido como provérbio, como uma comparação, uma fábula, uma símile, um enigma, uma alegoria ou um exemplo (Pv 1.5-7).
No que se refere à parábola do semeador, poderíamos dizer que se trata de uma parábola com aspectos enigmáticos e interpretação alegórica. É uma parábola porque se faz uma comparação com uma atividade da vida cotidiana. E enigma porque os de fora não entendem e é necessário interpretá-la.
Por fim, trata-se de interpretação alegórica, visto que semente, pássaros, solo rochoso, espinhos e solo bom tem cada um sua significação. Significação essa somente esclarecida por Jesus que nos dá a explicação.
B. Dois níveis de ensino
Jesus está em companhia de seus discípulos (Mc 4.10). Estes pedem melhores esclarecimentos sobre o ensino parabólico de Jesus. Antes de dar a explicação da parábola do semeador, Jesus classifica dois tipos de ensino.
Aos de dentro (discípulos) é dado conhecer o mistério do reino de Deus. Aos de fora tudo é enigma. Temos, portanto, dois níveis de ensino que correspondem a dois tipos de pessoas: os de dentro e os de fora. Quem são os de dentro?
Os de dentro são os que seguem a Jesus. A estes tudo se revela. Têm olhos para ver e perceber. Também têm ouvidos para ouvir e entender acerca da soberania de Deus. Em outras palavras, podemos dizer que os de dentro são aqueles que atenderam à pregação de Jesus (Mc 1.15).
Os outros formam a grande massa do povo judeu de seu tempo. O mistério do reino de Deus diz respeito à messianidade de Jesus. Mistério que não devia ser revelado ao povo judeu da época com sua ideia falsa, materialista, terrena e política do reino de Deus e do Messias. O próprio Pedro inicialmente acalentava essas concepções errôneas acerca do Messias e é por Jesus repreendido (Mc 8.31-33).
C. Pregação que não leva à conversão
O aspecto mais enigmático deste texto é o fato do ensino de Jesus ser um entrave à conversão dos ouvintes. Jesus se coloca na mesma senda do profeta Isaías, homem que pregou a palavra de Deus sem visar conversões (Is 6.9-10).
Citando a frase do livro de Isaías, Jesus dá a entender que este encobrimento que traz como consequência ser excluído da salvação é vontade divina.
A pregação de Jesus como a de Isaías se torna proclamação de juízo sobre o povo judeu de seu próprio tempo. Os evangelhos nos ensinam que Jesus veio para anunciar a boa nova aos pobres (Mt 11.4), para buscar e salvar o perdido (Lc 19.10), e que também sentia compaixão pelo povo (Mc 6.34).
Porém, tinha consciência de que devia obedecer ao decreto de seu Pai para a execução deste juízo divino por meio da instrução do povo através de parábolas (Jo 5.19,30).
A expressão "para que" (Mc 4.12) identifica a vontade de Deus como fator orientador da exposição de Jesus. A conclusão que se chega a partir do texto em questão é a de que converter-se não é mérito humano, mas graça divina.
II. Quatro tipos de solo (Mc 4.3-8,13-20)
Mc 4.4a
"E ao semear, uma parte caiu à beira do caminho..."
O caminho aqui é aquele formado ao se passar cotidianamente pelo mesmo lugar. O semeador palestinense dos tempos de Jesus semeava primeiro para depois arar.
O que era caminho iria desaparecer sob as lâminas do arado. Após a semeadura os pássaros vieram e comeram as sementes. Jesus explica que a semente é a palavra, os pássaros representam Satanás que tira a palavra semeada. O solo à beira do caminho representa aquele que ouve mas não compreende a palavra.
A experiência de ouvir a palavra e a retirada desta é tão rápida que não causa efeito. Este tipo de solo é o do ouvinte desatento. Do que ouve, ouve mas não percebe nunca. Pode frequentar uma igreja por anos seguidos e nunca experimentar a salvação.
Para este tipo de ouvinte as coisas cristãs são interessantes mas não fazem muito sentido. E isso não importa muito. É ouvinte negligente. Satanás rouba a porção da palavra que lhe cai no coração.
Mc 4.5a
"Outra caiu em solo rochoso..."
O solo rochoso era encoberto por húmus. A semente logo brota mas não se enraíza. O sol da Palestina causticante desde manhã queima a planta e a faz secar. Jesus explica que este entende o conteúdo da palavra. Recebe a palavra com alegria, com emoção.
Pode fazer muito barulho e contar a todos ao seu redor o que lhe aconteceu. Mas tem pouca duração porque sua conversão foi apenas superficial. Não suporta a aflição e a provação. Ser cristão é estar preparado para "negar-se e levar a cruz" após Jesus. Essa parte ele não entendeu. Quem sabe nem lhe foi contada.
Mc 4.7a
"Outra parte caiu entre os espinhos..."
Esses espinhos são os cardos que não foram extirpados totalmente. Sobraram suas raízes que os fazem brotar novamente. A semente caindo em seu meio é sufocada, pois os espinhos têm mais força que o cereal semeado.
A planta pode crescer mas não dá fruto. Jesus explica que este é o que recebeu a palavra mas os "cuidados do mundo, a fascinação da riqueza e as demais ambições concorrendo, sufocam a palavra, ficando ela infrutífera" (Mc 4.19).
Talvez seja o pior tipo. Este ouve e entende a palavra. Toma uma decisão. Começa a crescer, mas o mundo é tão tentador... Quer as duas coisas ao mesmo tempo. Tenta viver vida dupla. Vive dividido. Não consegue demonstrar vida cristã e nem consegue deixar a igreja. Não é uma coisa nem outra. Não produz. É estéril.
Mc 4.8a
"Outra caiu em boa terra e deu fruto..."
A semente caiu em boa terra. E como consequência deu fruto. E como frutificou: "a trinta, sessenta e a cem por um". A diferença deste solo em relação aos outros é gritante.
No primeiro a semente não fica por muito tempo sobre ele. No segundo fica por pouco tempo. Chega a germinar, mas não tem tempo de produzir. No terceiro a semente brota, mas a planta é sufocada. Nenhum dos três primeiros solos produzem frutos. Mas o último produz muito fruto.
Pode-se caracterizar este coração como o que ouve e entende a palavra. Satanás não consegue retirar de seu coração a palavra. Trata-se de um ouvinte atento. Tem ouvidos para ouvir e perceber. Tem olhos para ver e receber. Converte-se e há perdão para ele.
Ao receber a palavra seu coração se enche de alegria. Proclama aos outros o que Deus lhe fez. Suporta com paciência as provações. Não é sufocado pelo mundo. Prefere perder o mundo inteiro do que perder sua alma (Mc 8.36-37). E produz fruto. Segue a Jesus produzindo muito fruto.
III. A finalidade da parábola do semeador (Mc 4.1-20)
Como dissemos no início, o texto pressupõe três auditórios. O primeiro é formado pela multidão mencionada no texto. Esta não tem acesso à explicação da parábola. Portanto, não se converte. O segundo auditório é formado pelos discípulos. A estes Jesus compartilha o mistério do reino de Deus.
O terceiro auditório é formado pelos leitores do texto como este se encontra em nossa Bíblia. Nós temos acesso à parábola enunciada para a multidão. Compartilhamos do mistério que Jesus revelou aos discípulos. E temos a explicação da parábola. Somos assim muito privilegiados.
Mas como isso nos afeta? O texto completo (Mc 4.1-20) estende mais misericórdia a nós leitores. Enquanto que o primeiro auditório (multidão) ficou sem descortinar por completo o sentido do ensino parabólico de Jesus, nós temos a graça de confrontar-nos com os vários tipos de solos e identificarmos em qual nos encaixamos. Qualquer tipo de solo/ouvinte evidencia um tipo de conversão (ou suposta conversão).
O texto nos apela que sejamos como o quarto tipo de solo/ouvinte. Apela para que produzamos frutos verdadeiros provenientes de uma verdadeira conversão. Somos motivados a produzir "a trinta, sessenta e a cem por um".
Em outros termos, podemos dizer que se não produzirmos frutos, se não nos esforçarmos para isso, não podemos ter o direito de dizer que somos convertidos de verdade. A palavra de Jesus deve continuar ecoando, provocando uma decisão: "Quem tem ouvidos para ouvir, ouça."
Aplicação
- O texto que acabamos de estudar deve nos motivar a ouvir com muito mais atenção a palavra de Deus anunciada. Quantas vezes as pessoas vão até a igreja buscando somente cumprir a obrigação religiosa? Fazem isso porque são de "berço evangélico", mas nunca tomaram uma decisão verdadeira diante do "evangelho"? Ainda dentro desse tópico, devemos questionar se vamos à igreja somente para ouvir grandes oradores ou para aprender e apreender a mensagem proclamada.
- O evangelho anunciado possui implicações sérias para aquele que o recebe. Muitos vão à igreja apenas atrás de emoções. A emoção faz parte da vida humana e deve fazer parte da existência cristã, mas ela não deve ser um fim em si mesma. A Escritura é suficientemente transparente ao afirmar que devemos nos alegrar no Senhor e ao mesmo tempo expressa que a vida cristã pode acarretar aflições e provações. Tornar-se cristão não é obter de Deus um atestado contra qualquer tipo de adversidade ou privação. Tornar-se cristão é ser considerado como "ovelha para o matadouro" (Rm 8.36).
- Quem anuncia o evangelho deve ser fiel a essa atividade. Nenhum pregador tem o direito de prometer um mar de rosas proclamando um evangelho adocicado somente para alcançar o maior número de convertidos. Muitos "convertidos" se sentem com tivessem caído numa arapuca quando se decidiram pelo evangelho, pois os pregadores não lhes contaram que seguir a Jesus Cristo é também estar preparado para a tribulação. O pregador fiel deve ser tão honesto na proclamação da Palavra como o foi Jesus.
- Dizer sim a Jesus Cristo como Senhor e Salvador é relativizar o mundo com sua fascinação. Aquele que se converteu de fato, luta e vence as propostas prazerosas deste século. Mas não devemos confundir desapego nesse sentido com alienação. O cristão é aquele que deve influenciar esse mundo para que se instale uma ordem de justiça e respeito. Para isso ele é sal da terra. Mas não deve limitar sua existência a essa era somente. Na verdade, ele é cidadão de um reino muito mais alto e por esse reino deve frutificar.
- A parábola do semeador apresenta um ideal para igreja. Somos chamados, como verdadeiros convertidos, a fazer desse ideal um ato real. Devemos buscar com todo o empenho frutificar para o reino de Deus. Para isso devemos cada vez mais aprofundar o entendimento sobre o que é reino e o que é dar fruto. Aquele que faz de sua vida uma busca por dar fruto pode de fato ter certeza de sua conversão.
Autor: Rev. José Roberto Corrêa Cardoso
Lista de estudos da série
1. Arrependei-vos e Crede: Entendendo o Chamado Original de Jesus – Estudo Bíblico sobre a Conversão
11. De Escravo a Irmão: Como o Evangelho Derruba Barreiras Sociais – Estudo Bíblico na Carta a Filemom
