Texto da lição: Atos 16.11-15
Introdução
Quando estudamos a história da implantação da igreja evangélica no Brasil, aprendemos a ler nas entrelinhas a respeito da atuação de Deus em todo o processo.
Ao utilizar homens como Ashbel Green Simonton (presbiteriano) e William Bagby (batista), ficamos felizes por que Deus não foge ao seu plano. E assim com todo o movimento evangelístico promovido pelo povo de Deus sensível à sua direção.
Cada convertido é fruto da atuação pessoal de Deus. Um exemplo muito claro dessa preocupação de Deus é expresso no texto que trata da conversão de Lídia. Sua conversão nos apresenta a ação de Deus em todos os momentos no sentido de cumprir seu plano.
I. Contexto de Atos 16.11-15
A atuação de Paulo em Filipos se dá em sua segunda viagem missionária. Paulo desejava fazer uma nova visita às igrejas já estabelecidas (At 15.36), mas orientado pelo Espírito Santo (At 16.6-7) inicia sua atividade em solo europeu (At 16.10).
Outro elemento do plano original do apóstolo era fazer essa revisitação ao lado de Barnabé (At 15.37), mas quem segue com ele é Silas (At 15.40) e mais adiante Timóteo aumenta o grupo (At 16.1-3). Barnabé, juntamente com Marcos, seguiriam para Chipre (At 15.39).
Lucas enfatiza que a mudança dos planos foi provocada pela ação do Espírito Santo (At 16.6). A visão que Paulo tem do macedônio rogando ajuda acrescenta mais à certeza da ação divina (At 16.9).
II. Deus abre a porta
O plano de Paulo não se concretiza. Sua intenção era pregar a palavra na Ásia (At 16.6), mas Deus o leva para a Europa. Vários lugares são listados nesse percurso: Trôade, Samotrácia, Neápolis e finalmente Filipos (At 16.11-12).
Paulo encontra em Filipos um "lugar de oração". "Lugar de oração" era a terminologia usada quando não havia efetivamente uma sinagoga numa determinada localidade. Para se formar uma sinagoga eram necessários dez homens, não importando o número de mulheres.
Chegando ao lugar de oração, Paulo encontra somente mulheres (At 13.13). A primeira convertida do continente europeu vem da região que traz o seu nome: Lídia. Natural de Tiatira (Ap 2.18-29), lugar conhecido por sua produção de tintura púrpura, Lídia teria vindo a Filipos como uma mercadora desse produto. Já em Tiatira haveria algumas famílias judias e, por meio delas, poderia ter sido atraída para o povo de Israel. Lídia era, assim, uma temente a Deus.
De uma maneira inusitada, num grupo de certo modo insignificante à cultura da época, sob o céu de Filipos, uma mulher ouve a pregação de Paulo. O Senhor já estava preparando Lídia para aceitar o evangelho. Toda conversão tem esse aspecto da ação divina. Deus prepara o pregador, o lugar, a situação.
O pregador, no caso Paulo, possuía seus próprios planos e entendimento de como e onde fazer a obra de Deus. Mas Paulo era suficientemente flexível e sensível para mudar seus planos adaptando-se aos planos de Deus.
Ele sabia que a vontade de Deus era melhor que a sua, mais tarde escreveria aos romanos: "...transformai-vos pela renovação da vossa mente, para que experimenteis qual seja a boa, agradável e perfeita vontade de Deus" (Rm 12.2).
O lugar era a cidade de Filipos. Ali haveria de se formar uma comunidade cristã extremamente amorosa com a qual Paulo manteria correspondência e uma profunda afeição (Fp 1.8-11).
Da comunidade de Filipos Paulo receberia ajuda financeira (Fp 4.10-13), algo extraordinário nas campanhas missionárias do apóstolo (1 Co 9.1-18). A situação se daria perto do rio, num momento de oração de um grupo de mulheres em dia de sábado (At 16.13).
Paulo tem estrategicamente uma maneira de proceder. Procura sempre lugares propícios à sua pregação. O lugar procurado é lugar de oração. Lugar onde as Escrituras são lidas e respeitadas. Lugar onde se encontra gente séria que teme a Deus.
Precisamos aprender com Paulo, pois determinados lugares são apenas frequentados por destruidores de pérolas (Mt 7.6). As pessoas são representadas por Lídia. Como já foi dito, uma temente a Deus. Alguém que estava sendo preparada por Deus através da leitura e meditação nas Escrituras. Deus abre as portas.
III. Deus abre o coração
Parece que tudo está preparado: o pregador, o lugar, a situação. Mas será que isso basta? O texto mostra Paulo pregando àquela audiência. Pelo que sabemos através dos escritos de Paulo, sua pregação era cheia de sabedoria. Mas mesmo assim tudo seria em vão se Deus não estivesse efetivando a sua pregação: "Deus lhe abriu [de Lídia] o coração para atender às coisas que Paulo dizia" (At 16.14).
Lídia só pode receber o evangelho porque Deus lhe abriu o coração. Isso mostra que toda conversão é produzida por Deus. Na verdade somos convertidos pelo próprio Senhor (Ver Jo 15.16).
Essa verdade deve fortalecer nossa fé. Se cremos em Jesus Cristo foi justamente porque Deus abriu nosso coração para tanto. Lutero escreveria: "Creio que por minha própria razão ou força não posso crer em Jesus Cristo, nem vir a ele. Mas o Espírito Santo me chamou pelo evangelho, iluminou com seus dons, santificou e conservou na verdadeira fé".
Outro dado importante se refere à prática do evangelismo. Como igreja de Cristo somos chamados a proclamar seu evangelho de salvação. Mas muitas vezes nos sentimos frustrados porque muitos a quem evangelizamos não recebem o Senhor Jesus.
Nessas horas devemos nos lembrar de que quem abre o coração dos ouvintes é Deus. O próprio Paulo por vezes não viu seus ouvintes aceitarem seu evangelho (At 26.28) e outras vezes poucos atenderam à sua pregação (At 17.32-34). Nem por isso deixou de ser um veículo da mensagem do evangelho (Rm 10.13-15).
Não somos nós que abrimos o coração das pessoas, mas o próprio Deus.
IV. Deus abre a mente
Lídia entendeu que recebendo o Senhor Jesus Cristo em sua vida estava submetendo-se ao seu senhorio. E como sinal de que pertencia ao Senhor aceitou o batismo (At 16.15).
Seu batismo formalizava publicamente o que já tinha ocorrido em seu coração. Sem hesitar, ela e sua casa foram integradas à nova fé. Werner Brunken escreve: "Enquanto hoje muitos colocam obstáculos para levar alguém ao batismo, Lídia e os seus aceitaram como parte do seu pertencer a Deus".
Se ainda não confirmamos nossa fé em Cristo através da profissão de fé e batismo, devemos vencer nossas dúvidas a respeito. Nesse ato confirmamos nossa fé e união com Jesus Cristo. Aqueles que receberam o evangelho de Cristo Jesus anseiam pelo batismo. Trata-se de uma demonstração visível de quem é Senhor e de quem é servo.
V. Lídia abre a sua casa
Quem tiver o mínimo de curiosidade verá que um grande número de igrejas no Brasil teve seu início nos lares. São pessoas que abrem suas casas para que se possam nelas realizar pregações evangelísticas, reuniões de oração, escolas bíblicas, etc... Esse ato é natural àqueles que experimentaram a maravilhosa graça de Jesus.
Lídia é um bom exemplo disso. Ela abriu as portas de sua casa aos missionários (At 16.15). Todo aquele que se encontra verdadeiramente com Jesus Cristo é tomado por um espírito de serviço. Lucas relata vários casos que ilustram bem isso (Ver Lc 4.38-39; 5.27-32; 8.1-3; 22.24-27).
A transformação operada por Deus fez com que Lídia abrisse as portas de sua casa. Esse ato de Lídia, em última análise, era ato do próprio Deus.
Aplicação
- O nosso texto de hoje nos ensina que toda conversão é efetuada porque Deus abriu as portas, preparando pregadores, lugares, situações e pessoas. Aprendemos também que em cada conversão existe uma moldura que vai preparando o evento. São viagens que não se realizam, desencontros e dissolução do que é convencional. Parece que Paulo nem imaginava pregar o evangelho em Filipos, à beira de um rio e somente para mulheres. Mas Deus tinha projetado tudo isto e do modo de Deus o resultado só poderia ser melhor. Paulo escreveria mais tarde à então igreja de Filipos: "...porque Deus é quem efetua em vós tanto o querer como o realizar, segundo a sua boa vontade" (Fp 2.13).
- Será que somos sensíveis à ação do Espírito Santo no que concerne ao evangelismo? Estamos prontos para mudar nossos planos para seguir os do Senhor? Perguntamos a Deus se o nosso plano é o dele ou forçamos a situação? Quando planejamos baseados somente no que achamos os frutos não brotam.
- Deus abre o nosso coração para atender às palavras do evangelho. Isso é maravilhoso. E o coração, uma vez aberto, sempre deverá estar aberto para ouvir as outras palavras do Senhor. A nossa conversão é o início de um aprendizado constante efetuado na igreja do Senhor. A cada dia mais fortalecemos nossas convicções pela leitura, explicação e aplicação da Palavra de Deus.
- Aquele que realmente recebeu o evangelho deseja publicar sua transformação. Quando desejamos o batismo estamos confirmando a transformação interior efetivada pelo Espírito Santo. Professar a fé é uma declaração de amor ao Deus que nos ama.
- Quem ama quer servir. Jesus Cristo veio ao mundo para servir com a salvação e bênçãos dela decorrentes. Se realmente queremos servir a Jesus Cristo abrimos as portas de nosso coração, de nossa casa e de nossa vida.
- O que temos colocado à disposição do Senhor em termos de serviço? Somos pontuais? Quantas igrejas penam porque seus membros não chegam no horário. Quantos líderes chegam atrasados (quando chegam) aos eventos da igreja. Mas eles devem ser pontuais e presentes. Somos diligentes ou relaxados no cumprimento de nossos compromissos eclesiásticos? Somos hospitaleiros como Lídia? Algumas igrejas têm projetado "quartos de hóspedes" para acolher os pregadores visitantes. Mas até que ponto isso na verdade é um artifício para se desvencilhar do dever da hospitalidade? Estaremos nos esquecendo de Hebreus 13.2 que diz: "Não negligencieis a hospitalidade, pois alguns, praticando-a, sem o saber acolheram anjos"?
Autor: Rev. José Roberto Corrêa Cardoso
Lista de estudos da série
1. Arrependei-vos e Crede: Entendendo o Chamado Original de Jesus – Estudo Bíblico sobre a Conversão
11. De Escravo a Irmão: Como o Evangelho Derruba Barreiras Sociais – Estudo Bíblico na Carta a Filemom
