Deuteronômio 18.9-22
Sabedoria na batalha espiritual é um requisito vital em nossa época por muitas razões, sendo uma delas o surgimento da atividade ocultista.
Quando o ocultismo e o demoníaco crescem infiltrando-se numa sociedade, como tem acontecido na nossa, a vida humana inquestionavelmente se obscurece e se degrada. O próprio mal que habita em todos os homens é uma forte expressão dessa realidade.
Os praticantes do MME (Ministério do Método Ecbalístico) dizem que esse envolvimento com o ocultismo torna as pessoas abertas para os espíritos, que se infiltram e controlam a personalidade precisando ser expulsos.
Arrependimento, renúncia, fé e mudança para um novo estilo de vida não são considerados suficientes para limpar o reduto demoníaco, é preciso haver um confronto de poder com o demônio que ali reside. Mas, essa interpretação é bíblica?
1 - Uma existência degradada
O período da história no Antigo Testamento era uma época em que as nações viviam sem esperança e sem Deus (Ef 2.12). Crenças e práticas do ocultismo eram tão dominantes e difundidas que sociedades inteiras viviam nas trevas sob o poder de Satanás.
Eles adoravam ídolos, aceitavam mentiras e viviam em cativeiro.
Deus plantou Israel no meio de três culturas: cananeia, egípcia e babilônica. Todas proliferavam com atividades demoníacas, com a crença em demônios, com fenômenos de possessão, exorcismo, espiritismo и outras práticas.
Israel foi criado para ser luz nessa escuridão, mas a nação interagia e se misturava com essas culturas, sendo corrompido pela fraqueza espiritual. Às vezes, até mesmo o rei deliciava-se nas piores práticas (2Cr 33.2-7).
Existem três características importantes dessa visão de mundo ocultista e sua existência degradada.
Primeiro, explicações demonológicas para todos os eventos e ações predominavam. As pessoas tinham que conquistar favor com os deuses, espíritos e demônios locais, satisfazendo-os, ou sujeitando-se a eles para receber seus favores.
Creditavam aos demônios insatisfeitos a causa de tudo, desde um pote quebrado a uma doença, de uma desilusão amorosa a uma derrota na guerra.
Em segundo lugar, práticas e idolatria ocultistas eram a norma. Astrólogos, sacerdotes pagãos, médiuns, adivinhadores, magos e feiticeiros abundavam. Brutalidades impiedosas ocorriam, como o sacrifício de crianças para adoração a Moloque.
A sexualidade era grotescamente pervertida por meio de prostituição. Crianças eram ensinadas a adorarem demônios por seus pais e por culturas que praticavam abominações.
Em terceiro lugar, as nações que praticavam o ocultismo também adotavam outros vícios humanos: gula, bebedeira, formas variadas de imoralidade, inveja, desejo de vingança e poder.
Até mesmo Israel frequentemente sucumbia a essa degradação moral. O mundo inteiro também passava por aflições: doenças infecciosas, gafanhotos, seca, fome, animais carnívoros e as devastações de guerra, consequências do domínio das trevas.
As nações do mundo, frequentemente incluindo Israel, eram repletas de espíritos, deuses, ídolos, demônios, pecado e morte.
Curiosamente, esses pecados e traumas variados são o que os defensores atuais do MME identificam como as "brechas" por meio das quais os demônios do pecado entram em nossas vidas: prática do ocultismo, hábito do pecado, iniquidade ancestral, etc.
Algumas causas de endemoninhamento podem ser discutidas neste ponto.
Embora algumas experiências sejam descritas no Antigo Testamento, elas nunca se referem aos espíritos incorporados como o problema e nem à sua expulsão como sendo a solução. Não havia solução, apenas a pena de morte, ao mesmo tempo em que há ocultistas que se arrependem, creem e mudam de vida.
O Antigo Testamento, como uma expressão dentro dessas culturas repletas de demônios, minimiza Satanás. Ele se acomoda a explicações demonológicas para o pecado ou para a maior parte dos sofrimentos humanos — em vez disso, dá uma visão diferente do mal, de espíritos malignos, de Deus e da natureza de nossa batalha.
Além disso, maximiza a responsabilidade humana. Mesmo as condições de degradação mais profundas estão enraizadas no coração humano, não em demônios (Gn 6.5; Jz 21.25; Ec 9.3; Jr 17.9).
2 - Levantado o véu
O Antigo Testamento apresenta o Senhor e seu povo no centro do palco. Mas, com muita frequência, Deus ergue o pano para mostrar as verdades do espírito atuando por trás das cenas.
a) Gênesis 3.1-15
A narrativa da queda do homem nos ensina: quem é Satanás; qual é a natureza da nossa luta; e quais são as consequências da derrota espiritual.
O ensino da Bíblia sobre Satanás começa em Gênesis 3. Satanás surge como uma serpente (v. 1). Ele é comparado a animais selvagens, criados por Deus. Está evidente uma grande diferença do que afirma o paganismo, isto é, não há dualismo, não há duas forças equivalentes, o bem e o mal.
Deus é o criador e Satanás é a criatura. Essa ideia é reforçada quando Deus profere a maldição sobre Satanás (v. 14-15).
A serpente é subordinada a Deus e será derrotada por um homem que descenderia da mulher. O poder e a autoridade de Deus sobre Satanás são indiscutíveis. Isso nos leva a entender que ele ainda existe pela clemência de Deus, mesmo cometendo maldade sobre maldade na Terra.
Na visão de mundo ocultista, os demônios têm uma existência independente. Mas, desde o início, a Bíblia descreve que todos os espíritos maus estão irremediavelmente submetidos ao poder de Deus.
Segue-se a natureza da nossa batalha. Satanás é malicioso, mentiroso e assassino. Ele tenta e engana a Eva e a essência da vida humana é definida como uma questão moral. Quem dominará o nosso coração?
Em quem acreditaremos e de quem obteremos bênçãos? A vontade de quem os nossos ouvidos se inclinam?
Em terceiro lugar, o sofrimento, a aflição, o tormento, a acusação e a morte são consequências de nosso dilema moral e não são injustos. O problema do pecado é a causa fundamental de todas as nossas inúmeras misérias e aqueles que derem ouvidos à serpente, sentirão suas presas.
b) 1 Samuel 16.13-23
Davi é ungido rei de Israel e o Espírito do Senhor se retira de Saul apossando-se de Davi com poder. Ao mesmo tempo, um espírito maligno começa a atormentar Saul. Davi é levado para confortar Saul com música e fazer com que o espírito se retire dele.
Por quatro vezes (ISm 16.14-16,23) o espírito maligno é especificamente chamado de um espírito da parte do Senhor ou da parte de Deus.
Deus usou o espírito maligno para realizar seu duplo propósito: primeiro, ele condenou a rebeldia de Saul enviando um atormentador; segundo, exaltou a Davi, permitindo que Davi abençoasse a Saul com a sua paz.
Nos capítulos seguintes, Davi é revelado como o rei ungido, um homem segundo o coração de Deus, contra quem Saul se enfurece. Novamente, como em Gênesis 3, as forças do mal estão totalmente subordinadas ao Senhor.
Os defensores do MME frequentemente usam essa passagem para discutir se crentes podem estar endemoninhados. Mas isso leva a uma importante questão: Saul era crente?
Os defensores do MME gostam de pensar que sim, porque isso favorece seus argumentos de que o crente pode ser endemoninhado e somente o sistema de exorcismo deles é que pode libertá-los. Por isso, alguns pontos merecem maior consideração.
Segundo o texto, o demônio está ligado à punição de Deus pelo pecado, não ao poder do pecado. O demônio não faz Saul pecar. Mas Saul já estava envolvido com pecados do ocultismo (ISm 15.23).
O espírito que atormenta Saul é consequência do seu próprio pecado. Embora ele vivesse acorrentado ao domínio moral de Satanás e, portanto, tivesse experimentado a penúria, ele não estava endemoninhado no modo de ver do MME.
Essa passagem em particular não oferece prova textual para o MME ser considerado como um modo de ministério a ser empregado com os endemoninhados.
Ao contrário, Davi usa a terapia da música para trazer alívio a Saul. Conforme Davi tocava a sua harpa, Saul era restaurado e o espírito maligno ausentava-se dele. A passagem mostra a relação fundamental entre Deus e os demônios e talvez sugira o modo clássico da batalha espiritual.
c) 1 Samuel 28.3-25
Essa passagem descreve o sórdido mundo da prática do ocultismo e não dos espíritos malignos em si. Quando Saul se apavorou porque os filisteus se reuniram para a batalha, ele visitou secretamente uma médium.
Ele mesmo havia banido de seu reino todos os médiuns e adivinhos. Mas ele foi a En-Dor e pediu à médium que fizesse Samuel subir novamente, estando este já morto.
A partir do v.12 é dada a impressão de que a mulher realmente havia visto Samuel, no entanto o seu susto pareceu ter sido porque naquele instante ela reconheceu que estava diante do próprio Saul.
Em momento algum a narrativa diz que Saul tenha visto ou identificado a Samuel, mas, a todo instante, a médium é quem "intermedia" entre os dois, o que torna ainda mais fácil de falsificar a tentativa da médium em defender seus atos. E um texto, portanto, absolutamente inadequado para ser usado pelo MME.
d) Jó 1.16-2.10
Conforme a história dessa passagem se desenvolve, Satanás procura provar que Jó, por fim, amaldiçoará a Deus se a vida se tornar muito difícil para ele.
Então, Deus permite que Satanás destrua os filhos e os bens de Jó e depois a sua saúde. Nesta ocasião a sua mulher também o tenta para que amaldiçoe a Deus.
Os seguidores do MME frequentemente citam Jó para provar que Satanás pode afligir diretamente e tentar os crentes. Eles vão mais adiante, concluindo que o MME precisa fazer parte da solução dos nossos problemas.
Os textos de Jó 1—2 certamente provam que Satanás pode nos prejudicar. Mas também se opõem à visão de mundo e à metodologia do MME.
Note, primeiramente, que é Deus quem está no controle. Ele interroga Satanás e o prepara com perguntas direcionadas. Satanás deve prestar contas de si mesmo.
Ele só age com a permissão de Deus e sempre a sua malícia é canalizada para a glória de Deus.
A intenção maligna de Satanás é inquestionável, isto é, ele quer difamar Deus e embrutecer Jó levando-o a blasfemar contra Deus. Mesmo assim, ele está estritamente limitado à vontade de Deus. Deus será glorificado por meio do conflito e da integridade da vida de Jó.
Em segundo lugar, repare que numa batalha espiritual a tragédia humana é uma tragédia moral, e não uma tragédia demonológica: Irá Jó amaldiçoar a Deus?
O desenvolvimento da fidelidade de Jó a Deus é demonstrado diante do principado que tinha zombado do poder da integridade e da retidão.
A Bíblia nunca atribui aos pecados o "endemoninhamento", fazendo com que as pessoas se transformem em marionetes. Jó não é possuído por uma legião de demônios chamados hipocrisia, orgulho, desespero, raiva, autopiedade e sarcasmo. Antes, porém, ele era um homem reto e íntegro que foi dolorosamente tentado.
E, por fim, observe o modo como Jó trava a batalha espiritual. Na verdade, Jó nunca menciona Satanás, a causa secundária de suas aflições.
Em vez disso, Jó contende com Deus, a causa primária, porque Deus é soberano. Ele provou ser um guerreiro espiritual sábio reprovando, com honestidade, a loucura de seus amigos e de sua mulher, se arrependendo e tendo fé. Ao proceder dessa forma, Jó glorificou a Deus e humilhou Satanás.
Certamente Satanás influencia o povo de Deus de muitas maneiras, tanto por meio de tentações como também aflições. Mas nós não precisamos escolher entre um isolamento imune ao mal e possessão demoníaca moral em potencial.
Nós não precisamos escolher entre uma fé cristã formal e monótona e o MME. A tragédia humana moral — a questão de ser fiel ou infiel a Deus, em meio a quaisquer que sejam as tentações e os sofrimentos — sempre será uma tragédia moral humana.
e) Zacarias 3
Zacarias vê o sumo sacerdote Josué diante do anjo do Senhor e Satanás à sua direita para acusá-lo. Josué estava impuro. Mas, é interessante notar que Satanás não é sequer autorizado a falar.
O Senhor tirou as vestes sujas de josué e o vestiu com trajes finos e puros. Satanás age como um acusador malicioso de um homem que é pecador e passível de ser acusado, "um tição tirado do fogo".
Mas Deus, o libertador, silencia Satanás com suas surpreendentes promessas de perdão dos pecados por meio do Messias que haveria de vir. Os temas comuns estão presentes: a maldade de Satanás é aprisionada, o pecado é o grande problema, a vinda de Cristo nos livrará da culpa e do poder de nossa iniquidade.
3 - A soberania de Deus em um mundo mau
A lição extraordinária que tiramos dos textos avaliados acima, e de outros tantos da Bíblia, é que Deus usa a maldade do homem e o próprio Satanás para cumprir seus propósitos santos. Aquilo que o iníquo usa para o mal, Deus o transforma em bem.
Embora os defensores do MME declarem que não precisamos temer ao diabo, a sua visão da soberania de Deus é limitada e frágil.
Com frequência, o "nome de Jesus" é usado como um amuleto num mundo repleto de demônios que agem independentemente do poder providencial de Deus. Nessa visão, a igreja vive nessa luta constante num mundo mais precário e assombrado do que o mundo descrito na Bíblia, um mundo dominado pelos demônios.
A Bíblia, por outro lado, dá uma explicação mais teocêntrica. Não é o exorcismo dos crentes que dá o golpe final na batalha espiritual, mas o amor de Deus revelado em Cristo Jesus.
Em Deus nos refugiamos. As pessoas necessitam de arrependimento dos seus pecados e fé em Jesus Cristo para serem vitoriosas na batalha espiritual.
A Bíblia não ignora o mal, Satanás ou os demônios, mas sempre nos recorda que Deus é o rei e o juiz de todos, além de ser o redentor e libertador do seu povo. Praticantes do ocultismo do Antigo Testamento foram levados ao conhecimento de Deus por intermédio dos seus servos, como Naamã e os ninivitas.
Conclusão
Conforme vimos, em um panorama do Antigo Testamento, Deus está absolutamente no centro de todas as coisas. Mesmo quando narra sobre magias e ocultismos, mesmo entre os israelitas, Deus está no centro de todas as ações, dominando, controlando, disciplinando e restaurando.
Além disso, o homem é sempre retratado como um ser moral, responsável por seus atos e escolhas. Já os demônios são reprimidos pelo poder de Deus. E, por fim, é a soberania de Deus que define o método da batalha espiritual, em uma busca intensa de santidade e obediência ao Senhor.
Aplicação
Medite na Palavra de Deus para se armar contra as forças do mal e contra as falsas interpretações provenientes de "ventos de doutrinas" estranhas. Ore incessantemente a Deus, pedindo sabedoria para distinguir os falsos mestres.
Autor: Mauro Filgueiras
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