Os 5 inimigos da unidade na igreja: a oração de Paulo pela paz que transforma uma comunidade — Sermão sobre Romanos 15.33

Romanos 15.33

“Ora, o Deus de paz seja com todos vós. Amém.”

Introdução

Pode parecer estranho, mas pouco antes de orar por paz, o apóstolo Paulo aconselha os romanos a “lutarem”. Ele diz: “E rogo-vos, irmãos, por nosso Senhor Jesus Cristo e pelo amor do Espírito, que combatais comigo nas vossas orações por mim a Deus”.

Essa é uma luta santa. Uma luta em oração, um cerco ao trono da graça, um clamor a Deus. Há também outra luta permitida na igreja: a de buscar com fervor os melhores dons, uma doce competição para ver quem se destaca mais no amor, no serviço e na fé.

Que Deus envie mais desse tipo de luta para as nossas igrejas! Uma luta em oração e uma luta em serviço. E quando falamos dessas lutas, percebemos que elas são, na verdade, muito pacíficas. Por isso, podemos voltar à bênção do nosso texto: “Ora, o Deus de paz seja com todos vós”.

Vamos explorar essa verdade em duas partes. Primeiro, o título: “O Deus de paz”. Em segundo lugar, a bênção: “O Deus de paz seja com todos vós”.

1. O Deus da paz

Entre os pagãos, Marte era o deus da guerra. Mas o nosso Deus, Jeová, não se intitula o Deus da guerra, mas o Deus de paz. Embora ele permita a guerra neste mundo e se chame de “Senhor, poderoso na batalha”, seu coração santo abomina o derramamento de sangue e o conflito.

A paz é o seu deleite. A paz na terra foi o cântico dos anjos em Belém. A paz no céu foi o motivo pelo qual ele expulsou os anjos rebeldes. Se considerarmos a Trindade, veremos como esse título se aplica perfeitamente a cada pessoa.

O Pai é o Deus de paz, pois desde a eternidade planejou a grande aliança de paz para trazer os rebeldes para perto de si. O Filho, Jesus Cristo, é o Deus de paz, pois “ele é a nossa paz”. 

Seu sangue fez as pazes entre Deus e o homem, e é ele quem traz paz à nossa consciência. E o Espírito Santo é o Deus de paz, pois ele traz ordem ao caos da nossa alma, acalma as tempestades do nosso coração e nos dá um doce repouso.

Mas como Deus é o Deus de paz? Ele o é porque criou a paz, restaura a paz, preserva a paz e, finalmente, consumará a paz.

1. Deus é quem criou a paz

Volte em sua imaginação ao momento da criação. Quando o Pai majestoso iniciou sua obra, tudo era paz. Ao espalhar as estrelas, ao formar os mundos, ao criar os anjos, não havia um único sinal de discórdia. Não havia armas, nem exércitos, nem materiais para destruir.

Quando ele fez os anjos, ele os fez para serem espíritos de amor e alegria, não de batalha. A rebelião de Satanás não foi obra de Deus. Ele pode tê-la previsto e até permitido para manifestar sua justiça e misericórdia, mas ele não foi o autor dela. Deus detesta a guerra.

Olhe para a criação deste mundo. No jardim do Éden, havia paz. Adão e Eva viviam em perfeita harmonia com Deus, que caminhava com eles na viração do dia. Não havia nada em seus corações que pudesse perturbá-los. Deus não criou este mundo para o conflito. A paz era a ordem universal.

2. Deus é quem restaura a paz

A maior prova de que alguém ama a paz é quando ele se esforça para fazer as pazes. Deus é o grande pacificador.

Quando o homem pecou, quem foi atrás de quem? Adão não clamou: “Deus, onde estás?”. Foi Deus quem o procurou: “Adão, onde estás?”. Era a voz de um Pai amoroso buscando seu filho rebelde. Deus viu Adão fugindo e se escondendo, e mesmo assim foi até ele para iniciar o processo de reconciliação.

Ali mesmo, no jardim, ele prometeu um Salvador que esmagaria a cabeça da serpente. Ali ele começou a fazer a paz através do sangue da cruz.

Mas essa paz foi planejada muito antes. Na aliança eterna, feita antes da fundação do mundo, Jesus se comprometeu a pagar a dívida do seu povo, e o Pai, em troca, perdoou os pecados deles. Já havia paz entre Deus e os seus eleitos desde a eternidade.

Lembro-me da história de um pedreiro que, em seu leito de morte, foi aconselhado por um pastor: “Meu amigo, tente fazer as pazes com Deus”. Com lágrimas nos olhos, o homem respondeu: “Fazer as pazes com Deus? Graças a Deus, essa paz foi feita para mim por Jesus Cristo, na aliança eterna, muito antes de eu nascer”.

Que verdade gloriosa! Se sabemos que estamos nessa aliança, podemos nos alegrar, pois Deus restaurou a paz que havíamos perdido.

3. Deus é quem preserva a paz

Quando vejo paz no mundo, eu a atribuo a Deus. Os materiais de que este mundo é feito são tão inflamáveis que me surpreende que não estejamos todos em guerra o tempo todo. As guerras vêm de nossas paixões, e há paixões de sobra. Quando a paz é preservada entre as nações, é pela intervenção direta de Deus.

Mas há uma paz interior que só Deus pode guardar. Você já sentiu aquela paz que excede todo entendimento, mas depois a perdeu? Ninguém pode manter a paz no coração, a não ser Deus. Muitos acham normal viver em um ciclo de dúvidas e medos. 

Mas viver pela fé é dizer: “Eu não sei onde estou, mas sei que o Capitão está no leme e confiarei nele em qualquer lugar”. Você só consegue manter essa paz se Deus estiver no barco com você, ajudando-o a sorrir para a tempestade.

4. Deus é quem consumará a paz

Hoje, há guerra no mundo. Mas está chegando o tempo em que haverá paz em todos os domínios de Deus. Em breve, talvez amanhã, Jesus Cristo voltará. Ele não virá como um homem humilde, mas como um Rei glorioso. E ele fará cessar as guerras para sempre. O leão se deitará com o cordeiro, e a criança brincará com a serpente.

Após esse tempo, virá a consumação final. Os inimigos de Deus serão lançados no abismo, esmagados e sem poder para se rebelar. Satanás, o grande autor da guerra, terá sua cabeça esmagada. No céu, os anjos e os redimidos estarão seguros para sempre. Não haverá mais possibilidade de queda.

A paz universal terá chegado. A oliveira terá superado o louro. A espada será guardada, e as manchas de sangue, lavadas do universo. Haverá apenas um cântico: paz, pois o Deus que fez tudo é o Deus de paz.

Aplicação Prática

  • Identifique a fonte da sua paz. Sua paz interior depende de suas circunstâncias (saúde, finanças, relacionamentos) ou está ancorada no caráter imutável do Deus de paz?
  • Seja um agente de paz. Se Deus é o restaurador da paz, como você pode ser um instrumento dele em seus relacionamentos? Onde você pode promover reconciliação em vez de discórdia?
  • Ore pela paz. Reconhecendo que só Deus pode preservar a paz, ore pela paz em sua família, em sua igreja e em sua nação. A oração é a nossa arma para lutar contra o caos.

2. A bênção da paz

“O Deus de paz seja com todos vós.”

Quero aplicar essa bênção à nossa vida como igreja e exortá-los a buscar a paz. Para isso, precisamos conhecer os inimigos da paz.

1. O erro. O erro doutrinário é uma das maiores causas de conflito. Uma doutrina desequilibrada, seja para o lado do legalismo ou da libertinagem, gera amargura. Muitos dizem: “Olhe para os seus irmãos! Nunca vi gente que briga tanto!”. Infelizmente, há um pouco de verdade nisso. 

Mas prefiro uma igreja que briga por causa da verdade a uma igreja que dorme na indiferença. Ainda assim, precisamos buscar a verdade em amor. Sã doutrina, sã prática e são governo de igreja são o solo onde a paz floresce.

2. A ambição. Aquele desejo de ter a preeminência, como Diótrefes, já destruiu muitas igrejas. Alguém não quer ser o mais importante, mas tem medo que outro seja e tenta derrubá-lo. 

Afinal, o que é essa preeminência? É a superioridade de um micróbio sobre outro em uma gota d’água. Somos tão pequenos. A melhor ambição é competir para ver quem será o servo de todos.

3. A ira. Alguns explodem rapidamente. Outros, mais lentos para se irritar, são terríveis quando finalmente o fazem. E há os piores: os que não falam, mas guardam a raiva, “alimentando-a para mantê-la aquecida”. Eles se tornam amargos e reclamões. Que coisa horrível é a ira! Se ela entrar na igreja, vai dividi-la em pedaços. Aprenda a dominar seu temperamento.

4. A inveja. Um pastor tem inveja porque a igreja do outro está mais cheia. Um membro da igreja acha que o outro recebe mais atenção do que merece. Queridos, o que importa não é o que os homens pensam de você, mas o que Deus pensa. E ele ama tanto o “Pequena-Fé” quanto o “Grande-Coração”. Expulse esse monstro de olhos verdes.

5. O orgulho. Exigimos que cada detalhe de respeito nos seja dado, como se fôssemos senhores. Isso não pode existir em uma igreja pacífica. Em vez disso, devemos ser amáveis e nos humilhar, servindo uns aos outros.

Um apelo final à unidade

Lembrem-se do que José disse a seus irmãos: “Não briguem pelo caminho”. Que bela exortação! Vocês têm o mesmo Pai, a mesma família, o mesmo destino. 

O caminho já é difícil o suficiente, com inimigos por toda parte. Precisamos nos unir. Defendam o caráter uns dos outros. Vocês foram todos perdoados, justificados e adotados. Deus encheu seus sacos com provisões. Se ele colocou um pouco mais no saco de Benjamim, não brigue com ele; alegre-se porque o seu também está cheio.

O diabo quer que vocês briguem. Nada o agradaria mais. A causa de Cristo já foi tão prejudicada por nossas contendas internas. Os nossos ataques uns aos outros feriram mais a Cristo do que todas as flechas de Satanás.

Eu os suplico, amem-se uns aos outros. Suporto a zombaria do mundo, mas não suportaria ver vocês divididos. Enquanto eu sentir o amor de vocês e souber que estão unidos, não temo nem os demônios no inferno nem os homens na terra.

Mesmo que eu não tenha pregado diretamente aos não-crentes hoje, pedi a vocês que pregassem a eles. Porque, quando vocês se amam, isso é o mais belo sermão que o mundo pode ver. Não há sermão como aquele que se vê com os próprios olhos.

Visitei o orfanato de George Müller. Vi aquele milagre da fé. Conversei com aquele homem de mente celestial. Nunca ouvi um sermão tão poderoso quanto o que vi ali. Trezentas crianças alimentadas e vestidas, dia após dia, apenas pela oração de fé. 

Fiquei como a rainha de Sabá: sem fôlego. Pensei: “Meu Pai celestial alimenta todas essas crianças e não alimentaria a mim?”. Eles me pregaram sem dizer uma palavra. Eles me fizeram sentir um tolo por não confiar mais em Deus.

Assim é a nossa união. É um sermão vivo que mostra ao mundo um Deus de paz que pode unir corações diferentes em um só corpo. Que o Deus de paz seja com todos vocês.


Adaptado do sermão "The God of Peace" (Nº 49), pregado por C. H. Spurgeon em 4 de novembro de 1855, no New Park Street Chapel, Southwark, Londres.

Semeando Vida

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