Hebreus 12.24
De todos os temas divinos, não há nenhum mais precioso para o cristão do que a maravilhosa doutrina da redenção de Cristo. A meditação sobre este assunto frequentemente eleva nossa alma ao céu. Nenhum cântico é tão doce quanto aquele que louva o Cordeiro que foi morto.
No entanto, a cruz por si só não seria uma âncora suficiente para nossa alma se não fosse unida ao glorioso fato de que Cristo vive agora para interceder por nós diante do trono. Ele apareceu uma vez para morrer; mas agora ele vive para interceder.
Temos, portanto, neste texto, uma das maiores alegrias do cristão: Cristo falando em seu favor. O sangue de Cristo tem uma voz poderosa e prevalecente. Como diz o poeta, “ele clama desde o monte da propiciação” e fala “melhor do que o de Abel”.
Não tenho palavras para expressar a doçura desta doutrina. O fato de que Jesus está intercedendo por mim, neste exato momento, é um pensamento tão avassalador que minha alma se perde em maravilha.
Ele intercede por mim hoje, enquanto trabalho; intercede por mim esta noite, antes que eu durma; intercederá por mim amanhã, quando a batalha recomeçar. Ele está sempre intercedendo por mim.
Hoje, vamos contrastar a voz do sangue de Cristo com a do sangue de Abel. Há quatro pontos de contraste.
O sangue de Abel clama por vingança; o de Cristo, por misericórdia. O sangue de Abel exige punição; o de Cristo, um perdão comprado com sangue.
O de Abel clama: “culpado!”; o de Cristo, “justiça!”. O sangue de Abel fala de um amaldiçoado; o de Cristo, de uma bênção.
1. Vingança contra misericórdia
O primeiro contraste está na natureza do clamor. O sangue de Abel clamava em alta voz por vingança. Quando Deus o viu caído no chão, clamou por fogo do céu sobre a cabeça de Caim, exigindo que o assassino fosse punido.
Vocês conseguem imaginar essa cena? Abel, um homem justo, foi morto por seu próprio irmão, e seu sangue quente e fumegante encharcou a terra. Cada gota parecia ter uma língua e um poder para alcançar os ouvidos do Altíssimo. “Vingança! Vingança!”, clamava.
Agora, vamos para o Calvário. Ali vemos outro homem, o Justo, sendo assassinado. Mas que clamor ouvimos? “Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem”. O contraste é total.
Quando penso em meus pecados, sei que eles clamam contra mim. Meus pecados da juventude, minhas transgressões do dia a dia, minhas falhas no serviço a Deus — todos eles formam um coro de vozes exigindo minha condenação. O inferno parece se unir a esse clamor, com Satanás liderando o coro acusador.
Mas, então, eu me volto para a cruz e vejo um sangue que fala mais alto. Enquanto meus pecados clamam por vingança, o sangue de Cristo clama por misericórdia.
E a voz do sangue de Jesus é tão poderosa que abafa todas as outras. Deus não ouve mais minhas acusações, apenas a voz do seu Filho amado dizendo: “Pai, perdoe-o, perdoe-o!”.
Crente, quando a consciência o acusa, lembre-se de que o sangue de Cristo fala por você. Quando as lembranças do passado o assombram, não tente silenciá-las com suas boas obras ou promessas de melhora. Isso seria inútil. Em vez disso, vá direto à fonte e ouça o que o sangue de Jesus diz.
Você pode sentir que não tem o direito de orar, que suas falhas o desqualificam de se aproximar de Deus. É exatamente nesse momento que você deve lembrar que o sangue de Jesus está falando por você, mesmo quando você não consegue falar por si mesmo.
Aplicação Prática
- Silencie o acusador com o sangue: Na próxima vez que sua consciência o acusar de falhas passadas, não entre em um debate com ela. Em vez disso, declare em voz alta: "Meus pecados clamam por condenação, mas o sangue de Cristo clama por misericórdia, e a voz dele é mais alta".
- Ore mesmo quando se sentir indigno: Não espere se sentir "bom o suficiente" para orar. A base da sua oração não é a sua dignidade, mas a intercessão contínua do sangue de Cristo. Ore por causa do que ele fez, não por causa do que você fez.
- Transforme a culpa em gratidão: Toda vez que um sentimento de culpa surgir, use-o como um gatilho para agradecer a Jesus pelo seu sangue que fala melhor do que seus pecados.
2. Punição contra perdão
O segundo contraste é este: o sangue de Abel exige uma punição justa, enquanto o sangue de Cristo clama por um perdão totalmente pago.
Quando o sangue de Abel clamou, Deus respondeu: “O que fizeste? A voz do sangue do teu irmão clama a mim desde a terra”. A punição veio imediatamente. Caim se tornou um fugitivo, amaldiçoado e marcado.
A lei de Deus, como o sangue de Abel, exige punição. Para cada pecado, há uma consequência. A lei não conhece misericórdia; ela é justa, reta e implacável. Ela nos diz que “a alma que pecar, essa morrerá”.
Mas o sangue de Cristo não fala a mesma língua. Ele não pede punição, pois a punição já foi executada nele. Em vez disso, ele clama: “Perdão! Perdão!”.
Imagine um homem em um tribunal. As evidências contra ele são esmagadoras. A lei, como um promotor implacável, apresenta cada prova de sua culpa e exige a sentença máxima. Não há defesa possível. O juiz está prestes a proferir a sentença.
Mas então, um advogado se levanta. Ele não contesta as acusações, mas apresenta um documento: a certidão de óbito de Alguém que pagou a pena no lugar do réu.
A lei exigia morte, e a morte ocorreu. Agora, o clamor não é mais por punição, mas pela libertação daquele cuja dívida foi paga. Esse advogado é Cristo, e seu sangue é a prova do pagamento.
Crente, o sangue de Cristo não apenas pede por misericórdia, ele a exige com base na justiça. Porque Cristo morreu em seu lugar, Deus seria injusto se não o perdoasse. Seu perdão não é um talvez; é uma certeza garantida pelo sacrifício de Jesus.
Aplicação Prática
- Entenda a base do seu perdão: Seu perdão não é baseado na bondade de Deus em "ignorar" seus pecados. É baseado na justiça de Deus, que reconhece que a pena por seus pecados já foi totalmente paga por Cristo. Descanse nessa segurança.
- Lute contra a falsa culpa: Depois de confessar um pecado, Satanás pode tentar fazê-lo sentir que ainda precisa "pagar" por ele através de tristeza ou autopunição. Rejeite essa mentira. O sangue de Cristo já pagou tudo. Aceite o perdão e siga em frente.
- Compartilhe o evangelho com clareza: Ao falar de Cristo a outros, explique que o evangelho não é sobre Deus ser "bonzinho" e relevar o pecado. É sobre Deus ser justo e, ao mesmo tempo, justificador daquele que tem fé em Jesus, porque a punição foi totalmente cumprida.
3. Culpado contra justo
O sangue de Abel clama: “Caim é culpado! Culpado!”. E essa é a voz que todo o universo teria clamado contra nós. O céu teria dito: “culpado!”. O inferno teria ecoado: “culpado!”. Nossas próprias consciências teriam confirmado: “culpado!”.
Mas o sangue de Cristo nos olha nos olhos e, em vez de dizer “culpado”, ele diz: “Justiça!”. E aqui está o mistério da fé. O sangue de Jesus não apenas nos livra da punição; ele muda nosso status legal diante de Deus.
Por um lado, o sangue clama por justiça para com Cristo. Se Deus é justo, ele deve honrar o sacrifício de seu Filho e salvar aqueles por quem ele morreu. Deus seria infiel à sua própria promessa se deixasse um crente perecer.
Mas, por outro lado, e isso é ainda mais maravilhoso, o sangue clama por justiça para nós. Porque Cristo tomou sobre si a nossa culpa, nós recebemos a sua justiça.
Deus não apenas nos perdoa; ele nos declara justos aos seus olhos. Ele não nos vê mais em nossos trapos de imundície, mas vestidos com as vestes imaculadas da justiça de seu Filho.
Quando o diabo me acusa, ele pode listar uma longa e verdadeira lista de meus pecados. E eu não nego nenhum deles. Mas então eu aponto para a cruz e digo: “Sim, mas aquele sangue me limpou. Ele tomou minha culpa e me deu sua justiça. Portanto, diante do trono de Deus, sou justo”.
Aplicação Prática
- Vista-se com a justiça de Cristo todos os dias: Comece seu dia lembrando a si mesmo: "Hoje, não enfrento o mundo com minha própria força ou bondade, mas vestido com a justiça perfeita de Cristo". Isso muda sua perspectiva sobre seus desafios e falhas.
- Responda às acusações com sua nova identidade: Quando a acusação de "culpado" surgir em sua mente, responda com a verdade de que em Cristo você foi "declarado justo". Sua identidade não é mais "pecador condenado", mas "santo justificado".
- Abandone a autoconfiança: Pare de tentar ser "bom o suficiente" para Deus. A alegria do evangelho é que você não precisa ser. Descanse na justiça que lhe foi dada como um presente gratuito, não algo a ser conquistado.
4. Maldição contra bênção
Por fim, o sangue de Abel trouxe uma maldição. “Agora, pois, maldito és tu desde a terra”, disse Deus a Caim. E essa é a maldição que a lei pronuncia sobre cada um de nós: “Maldito todo aquele que não permanecer em todas as coisas que estão escritas no livro da lei, para fazê-las”.
Qualquer um que já tenha tentado viver uma vida perfeita sabe o peso dessa maldição. Cada falha, cada pensamento impuro, cada palavra dura, nos coloca sob a sentença da lei.
Mas o sangue de Cristo fala uma palavra totalmente diferente: bênção. Cristo se tornou maldição por nós, para que a bênção de Abraão pudesse vir sobre nós. Ele foi pendurado em uma árvore, levando sobre si a maldição da lei, para que pudéssemos ser libertos dela para sempre.
O sangue de Cristo não apenas remove a maldição, mas a substitui por uma bênção infinita. Somos adotados na família de Deus, feitos herdeiros de todas as coisas, selados com o Espírito Santo e temos a promessa de vida eterna. Todas as bênçãos da aliança da graça são nossas por causa do sangue aspergido.
Conclusão
Pecador, você está ouvindo isso? Você sente o peso de seus pecados? Sente a maldição da lei sobre sua cabeça? Olhe para o Calvário. Aquele sangue não foi derramado por anjos ou por santos, mas por pecadores, como você e eu.
Não há nada que você possa fazer para se salvar. Suas lágrimas não podem lavar seus pecados. Suas boas obras não podem satisfazer a justiça de Deus. A única coisa que pode salvá-lo é o sangue de Jesus Cristo.
Confie nele. Lance-se sobre ele. Creia que ele morreu por você, e você será salvo. Não espere mais um momento. O sangue de Cristo fala por você agora mesmo, clamando por misericórdia. Aceite o que ele oferece e viva.
Adaptado do sermão "The Blood of Sprinkling", pregado por C. H. Spurgeon em 28 de janeiro de 1855, na New Park Street Chapel, Southwark.