Ver a bênção e não receber: por que a incredulidade é o pecado que condena — Sermão sobre 2 Reis 7.19

2 Reis 7.19

Dizem que um único homem sábio pode salvar uma cidade inteira. A história de Samaria, cercada e faminta, prova que isso é verdade. No meio daquela crise terrível, havia um homem de Deus, Eliseu, e por causa dele, o Senhor enviou uma promessa de livramento.

Imagine a alegria da multidão quando o profeta declarou que, no dia seguinte, a comida seria abundante e barata. Eles o conheciam; sabiam que suas palavras vinham de Deus e sempre se cumpriam.

No entanto, no meio da esperança, surgiu uma voz de ceticismo. Não veio do povo comum, mas de um nobre, o oficial em quem o rei confiava. Sua reação foi de desprezo: "Ainda que o SENHOR fizesse janelas no céu, poderia acontecer tal coisa?".

O pecado dele não foi apenas duvidar, mas duvidar depois de ter visto tantas provas do poder de Deus através de Eliseu. Ele conhecia os milagres. Ele sabia da cura de Naamã e de como os segredos do inimigo foram revelados. Mesmo com todas as evidências, ele duvidou.

A resposta de Deus foi imediata e assustadora: "Você verá com os seus próprios olhos, mas não comerá". E foi exatamente o que aconteceu. A promessa se cumpriu, a comida chegou, mas aquele homem foi pisoteado e morto no portão, vendo a abundância sem poder prová-la.

Hoje, vamos analisar duas coisas: o pecado desse homem e o seu castigo. Vamos falar sobre o terrível pecado da incredulidade e a consequência inevitável que ele traz.

1. O pecado da incredulidade

O pecado daquele nobre foi a incredulidade. Ele duvidou da promessa de Deus. Sua dúvida se manifestou de duas formas: ou ele não acreditou que Deus realmente faria o que disse, ou não acreditou que Deus tinha poder para fazê-lo.

A incredulidade tem mais fases que a lua. Às vezes, ela se veste de anjo de luz e se chama de "humildade". Ela sussurra: "Eu não ousaria crer que Deus pode me perdoar; sou um pecador grande demais". Isso não é humildade, é o diabo disfarçado. É incredulidade.

Outras vezes, ela duvida da fidelidade de Deus: "Ele me amou ontem, mas talvez me abandone amanhã". Ou duvida do seu poder: "Estou num beco sem saída; com certeza nem Deus pode me tirar daqui".

A forma mais assustadora de incredulidade é aquela que leva uma pessoa a duvidar da capacidade de Cristo para salvar. É a dúvida que mantém o pecador longe da cruz, desconfiando do convite de Jesus.

Mas a pior de todas é quando a incredulidade tira a máscara e grita: "Deus não existe!". O ateísmo é o fruto maduro dessa árvore venenosa. E a menor das dúvidas tem a mesma natureza da maior negação.

É chocante, mas há quem diga que a incredulidade não é pecado. Eu lhes pergunto: vocês são cristãos? A Bíblia não diz que o Espírito convence o mundo "do pecado, porque não creem em mim"?

Não é o maior dos insultos uma criatura duvidar do seu Criador? Não é o cúmulo da arrogância um grão de poeira dizer ao Deus eterno: "Eu duvido do seu poder, do seu amor, da sua palavra"?

Acreditem, se você pudesse juntar todos os outros pecados — assassinato, blasfêmia, adultério, mentira — em uma única bola de maldade, eles não se igualariam ao pecado da incredulidade. Este é o pecado-mestre, a obra-prima de Satanás.

A incredulidade é a mãe de todos os outros pecados

Não há crime que a incredulidade não possa gerar. Foi assim que a humanidade caiu. O diabo tentou Eva insinuando uma dúvida: "É assim que Deus disse...?". A dúvida foi a fresta pela qual entraram a curiosidade e a desobediência, e a destruição veio ao mundo.

Desde então, a incredulidade tem sido a mãe de toda culpa. Foi a incredulidade que endureceu o coração do Faraó. Foi a incredulidade que se tornou um "deicídio" e assassinou Jesus.

A incredulidade afiou a faca do suicida e misturou a taça de veneno. Milhares foram levados a tirar a própria vida porque duvidaram da graça de Deus.

E no cristão, a incredulidade tem a mesma natureza. Embora seja perdoada, ela é a raiz de outros pecados. Quando minha fé está fraca, eu peco. Se estou em dificuldades e duvido de Deus, posso ser tentado a usar meios desonestos para me livrar do problema.

Quando a fé se vai, as rédeas se quebram. Sem fé, somos como um carro desgovernado em alta velocidade. A incredulidade é a mãe do vício e a origem de todo mal.

A incredulidade alimenta o pecado

Como é que as pessoas conseguem ouvir sermões poderosos sobre o juízo de Deus e continuar endurecidas em seus pecados? A resposta é a incredulidade. Ela funciona como um escudo ou um "firewall" de computador, que bloqueia uma mensagem vital de chegar ao seu coração.

Se as pessoas realmente acreditassem no que a Palavra de Deus diz sobre o pecado e suas consequências, ninguém dormiria tranquilo na igreja ou sairia indiferente. A Palavra os abalaria até o fundo da alma.

Da mesma forma, como é que tantos ouvem sobre o amor demonstrado na cruz e não correm para Cristo? A história do Calvário é suficiente para quebrar um coração de pedra. Mas as pessoas permanecem indiferentes, como se a morte de Jesus não lhes dissesse respeito.

O motivo é a incredulidade, que age como um véu espesso entre a alma e o Salvador. Somente quando o Espírito Santo rasga esse véu é que a verdade do evangelho pode, finalmente, derreter o coração.

A incredulidade nos impede de fazer o bem

A Bíblia diz que "o que não provém de fé é pecado" e "sem fé é impossível agradar a Deus". Isso não significa que honestidade e sobriedade não sejam boas. Pelo contrário, são coisas admiráveis.

Mas essas virtudes, sozinhas, são como ter um excelente histórico de crédito, mas não ter dinheiro na conta. Pode impressionar as pessoas ao seu redor, mas é inútil para a transação final e mais importante: a salvação.

Sem fé, nossas melhores obras são como pecados caiados. Nossa obediência é uma desobediência disfarçada. A incredulidade é o veneno na panela; ela anula todo o resto. Sem fé, toda a filantropia, a genialidade, a bondade e o patriotismo do mundo não podem agradar a Deus.

A incredulidade paralisa até mesmo o cristão. Lembre-se dos discípulos que não conseguiram expulsar um demônio porque lhes faltou fé. Lembre-se de Pedro, que andou sobre as águas enquanto teve fé, mas começou a afundar no momento em que duvidou.

A vida cristã é um andar sobre as águas. Cada onda de dificuldade ameaça nos engolir, mas a fé nos mantém de pé. No momento em que você deixa de crer, o desespero entra e você afunda. Milhares de orações foram estranguladas pela incredulidade antes mesmo de nascerem.

A incredulidade sempre foi punida severamente

Olhe para as Escrituras! O que trouxe o dilúvio sobre a terra? A incredulidade. Pela fé, Noé foi salvo. Pela incredulidade, o resto da humanidade se afogou.

Por que Moisés e Arão não entraram na Terra Prometida? Por causa da incredulidade. Eles não honraram a Deus na frente do povo e, por isso, foram impedidos de desfrutar daquilo pelo qual trabalharam por quarenta anos.

Pense nos ossos espalhados pelo deserto. Aqueles são os esqueletos da geração de Israel que saiu do Egito. Não foram os gigantes da terra que os destruíram, nem o deserto escaldante. Foi a incredulidade que os impediu de entrar em Canaã.

Por que Zacarias ficou mudo? Porque duvidou da palavra do anjo. E o pior exemplo de todos: a destruição de Jerusalém. Até hoje, o povo judeu anda errante pela terra. Por quê? Por causa da incredulabilidade no Messias que eles crucificaram.

A incredulidade é o pecado que condena

Há um pecado para o qual Cristo nunca morreu: o pecado contra o Espírito Santo. Mas há outro pecado que, se um homem morrer nele, não há expiação: a incredulidade final.

Você pode listar qualquer crime, e eu lhe mostrarei pessoas que foram perdoadas. Mas a incredulidade com a qual um homem morre nunca foi expiada. Este é o pecado que sela a condenação de uma pessoa. A frase mais terrível das Escrituras é: "Quem não crer será condenado".

Aplicação prática

  • Identifique a incredulidade disfarçada: Sua "cautela" é, na verdade, medo de confiar em Deus? Sua "humildade" é uma desculpa para não aceitar o perdão total de Cristo?
  • Conecte fé e ação: Em qual área da sua vida você está "afundando" como Pedro? Finanças? Relacionamentos? Ansiedade sobre o futuro? A raiz do problema pode ser uma falha em confiar nas promessas de Deus para essa área específica.
  • Use a história como um alerta: Lembre-se das consequências da incredulidade na Bíblia. Deixe que essas histórias sirvam como um aviso poderoso contra a tentação de duvidar da Palavra, do poder e da bondade de Deus.

2. O castigo da incredulidade

Agora, ouçam o castigo: "Você verá com os seus próprios olhos, mas não comerá".

Isso acontece até mesmo com os santos de Deus. Quando somos incrédulos, vemos a misericórdia com nossos olhos, mas não a desfrutamos. O banquete do evangelho é servido, mas alguns cristãos vêm e dizem: "Não sei se vou receber algo hoje".

Eles saem e reclamam: "Não havia nada para mim". Claro que não. Você viu a comida, mas não comeu, porque não tinha fé. Se tivesse vindo com fé, até a menor migalha teria alimentado sua alma. O que nos nutre não é o quanto ouvimos, mas o quanto cremos.

Mas essa sentença se aplica principalmente aos não convertidos. Eles frequentemente veem as grandes obras de Deus, mas não participam delas. Muitas pessoas vêm à igreja apenas para ver. Elas ouvem sobre vidas transformadas, veem pecadores chorando arrependidos, sentem a presença de Deus no ambiente, mas nada acontece em seus corações.

Elas veem, e veem, e veem, mas nunca comem. A incredulidade as mantém sentadas, imóveis, não salvas, mesmo em meio a um avivamento.

Contudo, o pior cumprimento desta sentença ainda está por vir. Não é a ira de agora que você deve temer, mas "a ira vindoura". Chegará um dia em que você "verá, mas não comerá".

Eu imagino o último grande dia. O tempo acabou. A eternidade começa. Sobre uma nuvem, vejo um trono, e nele está sentado alguém semelhante ao Filho do Homem. Em sua mão, uma balança; diante dele, os livros. Eu me alegro com seu esplendor, mas ali está uma multidão de miseráveis, tentando se esconder, mas forçados a olhar para aquele a quem transpassaram.

A procissão triunfal de Jesus começa, com um exército de santos vestidos de branco seguindo-o. Eles cantam: "Aleluia! O Senhor Deus Onipotente reina!". Você pode vê-los, mas não está entre eles.

O banquete do casamento do Cordeiro é servido. Eles se assentam para a festa, mas você está do lado de fora, faminto e miserável, vendo tudo com seus olhos, sem poder provar. Oh, que agonia poder ver o céu, mas estar excluído para sempre!

O pior de tudo será ver aqueles que você amou no céu, enquanto você está perdido. Ver sua mãe, seu irmão, seu filho ou sua esposa na glória, enquanto você está no tormento, será o inferno do inferno.

Conclusão

Eu lhe suplico, pela morte de Cristo, por sua agonia e suor de sangue, por tudo o que é sagrado no céu e terrível no inferno: leve essas coisas a sério.

Lembre-se de que, se você for condenado, será a incredulidade que o condenará. Se você se perder, será porque não creu em Cristo. E a gota mais amarga de fel em seu sofrimento eterno será a lembrança de que você se recusou a confiar no Salvador.


Adaptado do sermão "The Sin of Unbelief", pregado por C. H. Spurgeon em 14 de janeiro de 1855, na New Park Street Chapel, Southwark.

Semeando Vida

Postar um comentário

O autor reserva o direito de publicar apenas os comentários que julgar relevantes e respeitosos.

Postagem Anterior Próxima Postagem
Ajuste a fonte: