Meu avô Francisco era muito religioso. Como disse, rezador de terços, era constantemente procurado para rezar nos bairros, e porque era catequista.
E mais: ele, como a avó Ana, se dava ao uso de benzimentos. Benziam crianças que sofriam dor de dente, como também os adultos.
Numa época de pouco, ou de nenhum, tratamento odontológico, estavam no seu tempo. Serviam como podiam.
Também benziam as nuvens e "evitavam tempestades" com a invocação dos santos, em suas variadas especialidades.
Meu avô, certa vez, benzeu um algodoal corroído de pragas de insetos. Era o famoso curuguerê, uma lagarta em evolução para borboleta ou mariposa. Nesta fase, ou na fase das larvas, o inseto é um devorador insaciável.
A desova era feita na folha do algodão que, em pouco tempo, em milhares de ovos, aparecia com uma população imensa de bichinhos destruidores.
Atingiam os algodoeiros em fase de floração e frutificação, reduzindo-os a frangalhos.
Meu avô rodeava a área da plantação com os gestos usuais, a murmurar orações, excomungando a peste.
Chegou o dia de benzer a lavoura de meu pai, e ele o fez inutilmente.
Autor: Lázaro Arruda
(Extraído do livro “Os meus dias” – Rev. Lázaro Lopes de Arruda, 1997.)
[Nota do blog - O texto é uma memória detalhada sobre um avô religioso e suas práticas de benzimento. A narrativa constrói a imagem de um homem de fé sincera, mas culmina em um episódio onde sua prática se mostra ineficaz contra uma praga. Esta história é uma excelente ilustração para explorar temas como os limites do zelo humano, a diferença entre fé e superstição, e a soberania de Deus sobre a criação.]