Quando Deus parece distante: como seu desejo por ele na escuridão é a prova da sua fé — Sermão sobre Isaías 26.9

Baseado em Isaías 26.9

Introdução

A noite tem um poder especial. Quando o barulho do dia se acalma e o mundo silencia, nossa mente parece finalmente ter espaço para pensar no que realmente importa. Olhar para o céu escuro, salpicado de estrelas, quase nos força a pensar em Deus e em nosso lugar neste universo imenso.

Quem nunca, em uma noite de insônia, sentiu a alma mais inquieta, mais aberta para as grandes questões da vida? A escuridão parece nos convidar à adoração ou ao desespero. É um tempo de profunda honestidade.

Mas não vamos falar da noite literal, e sim daquela escuridão que às vezes toma conta da nossa alma. O profeta Isaías expressa um sentimento que todo crente, em algum momento, já sentiu: "Com minha alma te desejei de noite". Essa frase descreve um coração que, mesmo no meio da escuridão espiritual, ainda anseia por Deus.

Vamos explorar essa verdade em duas partes: primeiro, falando para o cristão maduro que talvez esteja passando por essa "noite"; e depois, para a alma que está apenas despertando para a fé, mas se sente perdida no escuro.

1. Mensagem para o cristão maduro

Para você que já caminha com Deus há algum tempo, esta passagem oferece um grande consolo e verdades profundas sobre a nossa jornada.

1. O cristão também enfrenta a escuridão

É uma grande verdade que os caminhos do Senhor "são caminhos de delícias, e todas as suas veredas são paz". A fé em Cristo foi feita para nos dar alegria e paz. No entanto, a experiência nos mostra que a vida cristã não é um dia de sol perpétuo.

O caminho do justo pode ser como a luz da aurora, que vai brilhando mais e mais até ser dia perfeito, mas, às vezes, nuvens densas cobrem esse sol. Há períodos em que andamos em trevas e não vemos luz alguma.

Talvez você tenha começado sua jornada com muita alegria. Deus te deu um tempo de sol e céu azul, como um tempo de adaptação. 

Mas, de repente, tudo mudou. Os "pastos verdejantes" se tornaram um deserto, e as "águas tranquilas" se tornaram amargas. Você começa a pensar: "Se eu fosse mesmo um filho de Deus, isso não estaria acontecendo".

Não diga isso. Os maiores santos de Deus tiveram suas noites. Os filhos mais amados passaram por desertos. 

Precisamos dessas nuvens para exercitar nossa fé, para nos ensinar a confiar menos em nossos sentimentos e mais em Cristo. Deus não prepara seus soldados de elite com férias em resorts; ele os forja no campo de treinamento mais rigoroso.

Essa escuridão pode vir de problemas da vida. Uma crise financeira, uma traição, a perda de alguém que amamos, um diagnóstico médico assustador. As coisas parecem dar mais certo para aquele vizinho que não teme a Deus, enquanto sua vida parece ir de mal a pior. É nessas horas que precisamos lembrar: é melhor viver as provações de um cristão do que aproveitar os prazeres passageiros de um ímpio.

Ou, talvez, a escuridão seja interna. Você olha para dentro e não encontra nenhuma evidência de que é salvo. As promessas da Bíblia parecem distantes, e seu coração está cheio de pensamentos dos quais você se envergonha. 

A voz do acusador sussurra que você é uma fraude, um hipócrita. É exatamente por sentir essa luta que você prova que pertence a ele. Deus permite essas noites para nos manter humildes e dependentes.

2. A fé verdadeira brilha mais no escuro

Existe muito "cristianismo de tempo bom" por aí. Pessoas que seguem Jesus enquanto a multidão grita "Hosana!", enquanto ser crente é socialmente aceitável. Elas amam a Cristo sob a luz do sol, mas desaparecem na primeira tempestade.

O melhor teste para a autenticidade da nossa fé é a noite. As estrelas são invisíveis durante o dia, mas seu brilho se revela na escuridão. Da mesma forma, a fé de muitos cristãos, que talvez não parecesse tão impressionante na prosperidade, torna-se radiante na adversidade.

É na dificuldade que a nossa fé se prova genuína. É quando cantamos em meio à dor, quando confiamos sem ver, quando nos agarramos a Deus em meio ao desespero, que nossa fé mostra sua verdadeira cor. Moa um pouco o diamante, e você verá o seu brilho. Coloque o cristão sob pressão, e sua perseverança provará que ele é uma semente verdadeira.

3. Na noite, tudo que queremos é Deus

Durante o dia, quando tudo vai bem, desejamos muitas coisas além de Deus. Queremos mais conforto, mais reconhecimento, mais segurança, mais um bem material. Nosso coração parece um poço sem fundo de desejos.

Mas coloque um cristão na escuridão da provação, e você verá que ele não quer mais nada além do seu Deus. É como o marinheiro: em tempo bom, ele se distrai com muitas coisas no convés. Mas quando a tempestade ruge, ele só quer uma coisa: o porto seguro. Ele não se importa se a comida é simples ou a água não é fresca. Ele só quer chegar em casa.

É assim conosco. Quando as trevas da dúvida ou da dor nos cercam, todas as outras coisas perdem o valor. O único clamor da alma é: "Meu Deus, meu Deus, por que me desamparaste?". Nesses momentos, tudo que importa é a presença dele.

4. Às vezes, o desejo é a única evidência

Existem momentos em que um cristão não consegue encontrar nenhuma prova de sua salvação. Ele olha para suas boas obras, mas elas parecem manchadas e insuficientes. Ele tenta se lembrar de experiências passadas com Deus, mas a memória falha e Satanás sussurra que tudo foi imaginação.

Nessas horas de escuridão total, quando todas as outras evidências desaparecem, resta uma que o diabo não pode arrancar de nós: o desejo.

"Senhor, eu posso não sentir que sou teu, mas eu desejo ser. Posso não ter certeza da minha fé, mas uma coisa eu sei: com toda a minha alma, eu te desejei nesta noite escura". Esse anseio, essa sede por Deus no meio do deserto, é em si uma poderosa evidência de que a graça dele está operando em você.


Aplicação prática

  • Normalize a escuridão: Entenda que as noites espirituais fazem parte da jornada cristã. Não entre em pânico nem duvide da sua salvação. Em vez disso, veja-as como um treinamento avançado para a sua fé.

  • Simplifique seu foco: Quando a noite chegar, pare de buscar soluções em todos os lugares. Simplifique. Volte-se para a única coisa que importa e ore: "Senhor, eu só preciso de ti".

  • Valorize o desejo: Se você está em uma fase de sequidão e dúvida, agarre-se ao seu desejo por Deus como um náufrago se agarra a um pedaço de madeira. Esse desejo é a prova de que o Espírito Santo ainda está trabalhando em você.


2. Mensagem para a alma despertada

Agora, quero falar com você que está começando sua busca por Deus. Você sente um desejo por ele, mas ao mesmo tempo se sente perdido na escuridão do pecado e da dúvida. Quero responder a três perguntas que talvez estejam em seu coração.

1. Como saber se meu desejo vem de Deus?

Você pode testar a origem do seu desejo de três formas:

Pela sua constância: Muitos sentem um desejo por Deus durante um culto emocionante, mas esse sentimento desaparece na segunda-feira de manhã. Se o seu desejo é apenas uma emoção passageira, ele não vem de Deus. Mas se ele persiste, se você pensa em Deus no trabalho, se anseia por ele durante a noite, se essa fome espiritual te acompanha há dias ou semanas, isso é um bom sinal.

Pela sua ação: Desejos que não geram ação são apenas ilusões. O inferno está cheio de boas intenções. Se você deseja a salvação, mas não está disposto a abandonar o pecado que te aprisiona, seu desejo é falso. Mas se esse anseio por Deus te levou a orar, a ler a Bíblia, a abandonar velhos hábitos e a buscar a comunidade da igreja, então ele é genuíno. Esperar em Deus não é passividade, é preparação ativa.

Pela sua urgência: Um desejo verdadeiro por salvação é para agora. Quem sente o perigo do seu pecado não diz "vou me converter no ano que vem". Ele clama por socorro hoje! Se o seu navio está afundando, você não agenda o resgate para a próxima semana. O "amanhã" é uma miragem que o diabo usa para nos levar à destruição. Um desejo real clama: "Agora ou nunca!".

2. Por que Deus ainda não respondeu?

Talvez você esteja buscando a Deus há um tempo e se sinta frustrado. Por que ele não respondeu ainda?

Primeiro, ele pode estar te fazendo esperar para o seu próprio bem. Ele quer te mostrar a profundidade do seu pecado, para que você nunca mais confie em si mesmo. Ele te deixa sentir a sede para que, quando a água da vida chegar, você a valorize como nunca.

Segundo, a espera intensifica o desejo e te torna mais grato quando a resposta chega. Cristãos que lutaram muito para encontrar a paz com Deus geralmente o amam com mais profundidade e são mais úteis para ajudar outros que estão sofrendo.

Mas há outra possibilidade: talvez ele já tenha respondido, e você não percebeu. Muitos esperam uma experiência milagrosa, uma voz do céu ou um choque elétrico. Mas a salvação não depende disso. A resposta de Deus não é uma sensação, é uma promessa: "Cristo Jesus veio ao mundo para salvar os pecadores". Se você se reconhece como pecador, essa promessa é para você.

3. Será que Deus vai atender meu desejo no final?

Sim. Com toda a certeza, sim. É impossível que uma alma que deseja a Deus sinceramente, como descrevemos, seja perdida. Imagine se você chegasse ao inferno. O que você diria? "Eu busquei a Deus com todo meu coração, mas ele me rejeitou".

Sabe o que aconteceria? O inferno inteiro celebraria. Satanás gritaria de alegria, pois teria provado que Deus é um mentiroso. A promessa "todo aquele que invocar o nome do Senhor será salvo" teria falhado.

Mas isso nunca vai acontecer. Por que você seria o primeiro caso em que a misericórdia de Deus falha? Por que Deus daria seu único Filho para morrer por pecadores, e depois se recusaria a salvar um pecador que o busca?

Pense nisso: o evangelho diz "Quem crer e for batizado será salvo". Dos céus, um eco glorioso responde: "Salvo!". Os anjos e os santos que já partiram cantam em coro: "Salvo!".

Mas a frase continua: "quem não crer será condenado". E das profundezas, sobe um eco terrível e sombrio: "Condenado!".

Que Deus te dê a graça de ouvir o primeiro eco e de crer em Jesus agora mesmo. Porque hoje é o dia de ouvir a sua voz e encontrar a salvação.


Adaptado do sermão "The Desire of the Soul in Spiritual Darkness", pregado por C. H. Spurgeon em 24 de junho de 1855, em New Park Street Chapel, Southwark.

Semeando Vida

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