Mãos


Há certas cenas que ficam gravadas de modo indelével em nossa mente. De vez em quando, em meio a agitação do dia-a-dia ressurgem, provocando dores, lagrimas, reflexão e crônicas. Uma dessas cenas que volta e meia me vêm é a do meu filho, no Jardim de Infância, em Porto Feliz.

Ainda pequeno, cinco anos e meio, estava matriculado numa escolinha, segundo o desejo da sua mãe. Inúmeras vezes fui buscá-lo, algumas de carro, outras a pé.

Os seus cinco anos eram momentos felizes e mágicos! Ele, certamente cheio de curiosidade e interrogações e eu, de descobertas e aprendizagem.

A vida ensina alguns a serem filhos e ao mesmo tempo outros a serem pais. Nunca achei a responsabilidade de buscar meu filho na escola difícil ou cansativa. A graça das suas descobertas me dava um imenso prazer.

No entanto, houve um dia em que, sinceramente desejei não precisar fazer a caminhada até sua escolinha. Os meus passos, naquele dia se fizeram pesados demais, e o curto trajeto, uma enorme distância. Eu teria, naquele dia, que dar ao meu filho, a pior de todas as notícias...

No sábado anterior, dia 10 de Abril de 1992, Márcia, minha esposa, sua mãe, tinha sido internada com fortes dores renais. A princípio suspeitou-se de pedra nos rins, mas tal diagnóstico não se confirmou. Transferida para Sorocaba as pressas, esteve no Hospital Evangélico de segunda a quarta feira....

Meu filho correu ao meu encontro. O abracei e carreguei-o no colo. A sua primeira pergunta foi: “Onde está a minha mãe?” Não consegui responder. Ele, pela segunda vez me perguntou: “Onde está a minha mãe?”.

Andei alguns quarteirões com ele em meus braços... E, nessa caminhada expliquei que o estado de saúde de sua mãe havia se agravado, que ela tinha ficado cheia de aparelhos e que, na manhã daquele dia o papai do céu a havia chamado para morar com Ele.

Ele me olhou atentamente e perguntou: “A minha mãe morreu?”. Tornou a perguntar: “A minha mãe morreu?” Eu, que havia assentido com a cabeça da primeira vez, respondi entre lágrimas: “Sim, ela morreu”. 



Perguntei se queria vê-la, pois estava sendo velada na Igreja. Ele, ainda sem entender direito o que havia acontecido, respondeu que sim. Caminhamos juntos, subindo as escadarias da Igreja Presbiteriana. 

As suas mãos, tão pequeninas, estavam segurando fortemente as minhas. As senti geladas, quando caminhamos pelo corredor e procurei segurar mais fortemente as suas mãozinhas. Quanta fragilidade....quanta dor.....quantas indagações....

Imagino que as minhas mãos naquele momento eram a única segurança para o meu pequenino filho. Que as suas frágeis mãozinhas precisavam das minhas, naquele momento e doravante. Sinceramente, não sei como consegui ser pai nessa circunstância....estava igualmente inseguro, frágil, vergastado pela dor, repleto de indagações.

Entendi, contudo, que não éramos apenas os dois a caminhar pelo corredor daquele templo. Um Pai, todo poderoso, sábio e soberano caminhava conosco. E, as minhas mãos, geladas e trêmulas, estavam entrelaçadas nas dEle.

Autoria - Rev. Gérson Trevisan (fonte)

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